Além da quebra de paradigmas na VW, o Passat trazia uma série de inovações ao mercado
Moderno e eficiente, o motor de 1,5 litro de cilindrada desenvolvia potência líquida de 65 cv e torque de 10,3 m.kgf. Com peso de 860 kg, o Passat alcançava velocidade máxima de 150 km/h e acelerava de 0 a 100 km/h em 17 segundos, bom desempenho para a categoria, que incluía Ford Corcel (ainda da primeira geração e de 1,4 litro) e Dodge 1800; o Chevette de 1,4 litro ficava um pouco abaixo em porte. O câmbio de quatro marchas era um padrão nacional da época, quando apenas o Alfa Romeo 2300 oferecia cinco, mas não agradava: tinha problemas sérios de seleção de marcha, como o motorista pensar ter engatado a primeira e na realidade ser a marcha à ré. Não raro, isso ocasionava pequenas colisões,
A tração dianteira empregava, também pela primeira vez no Brasil, juntas homocinéticas para estabelecer novo padrão em comportamento de direção. A coluna de direção deformável, em caso de colisão frontal, amenizava o impacto do motorista contra o volante. Os freios usavam discos na frente, mas de início não eram assistidos, o que requeria grande esforço para acionamento — o servofreio seria incorporado de série no ano seguinte. Nessa área o Passat trazia outra novidade na produção nacional: duplo circuito hidráulico atuando em diagonal.
Se um dos circuitos falhasse, os freios de duas rodas diagonalmente opostas (dianteira esquerda e traseira direita, por exemplo) permaneceriam atuando, assegurando 50% da capacidade de frenagem. Nos sistemas de um circuito em cada eixo, usados até então, a perda dos freios dianteiros era muito perigosa, pois o carro frearia mal e poderia travar facilmente as rodas traseiras, com risco de dar “cavalo de pau”. Nessa situação o Passat não tenderia a alterar sua trajetória, graças a outra primazia no País: a suspensão dianteira do tipo McPherson adotava raio de rolagem negativo, com seu efeito de autoestabilização em condições críticas. Essa característica explicava as rodas com aspecto diferente do que se estava acostumado, com o disco protuberante em relação ao aro. Os pneus eram radiais 155/80 R 13.
Na publicidade, menção a avanços técnicos como o duplo circuito de freios em diagonal
Na suspensão traseira, outra novidade: em vez do sistema independente por semieixos oscilantes, então usado por toda a linha VW, ou de um eixo rígido, como nos oponentes Corcel e 1800, vinha o primeiro uso de eixo de torção em um carro brasileiro, embora não parecesse um (a viga transversal ainda não era montada mais à frente do carro, como se veria no Gol em 1980 e em grande parte dos carros nacionais depois dele).
A versão de quatro portas trazia uma conveniência então pouco apreciada: carros que surgiram com elas passaram a vender mais com duas
Foi uma revolução na linha de produção, nas concessionárias e, claro, para o público. Existia agora um Volkswagen com arrefecimento líquido e tração dianteira: tudo era diferente, da carroceria à mecânica. Estranhava-se o logotipo VW à frente de uma grade preta que admitia ar para o radiador, com o motor ali atrás. No lançamento para os concessionários, realizado no Rio de Janeiro, RJ, conta-se que a maioria só teceu críticas ao novo carro, chamando-o de anti-Volkswagen. Mecânicos de concessionárias e oficinas também não gostaram, pois todo o conjunto mecânico diferente — motor, transmissão, suspensão — exigiria treinamento.
De fato, o Passat ia na direção oposta a tudo o que a fábrica havia pregado aos brasileiros durante décadas. As campanhas publicitárias sempre destacaram a fácil manutenção da mecânica “a ar”, a vantagem de não poder ferver mesmo em condições críticas como subidas de serra em baixa velocidade, a aderência em terrenos difíceis propiciada pelo motor e a tração na traseira. Se tudo isso consistia no “bom senso em automóvel” — mote da Volkswagen durante longo tempo —, como poderia algo tão diferente ser melhor?
Versões de três e quatro portas logo ampliaram a linha; no interior, painel simples e rádio à direita
No primeiro teste da revista Quatro Rodas, as boas impressões predominaram: “De maneira geral o Passat é um carro muito bem construído. Suas linhas são modernas e o acabamento interno é muito bom. O motor sobe de giros facilmente e não emite ruídos incômodos. As respostas são razoavelmente rápidas, mas de um motor de nova concepção esperávamos números um pouco melhores. Há um aspecto importante a se destacar: a preocupação do fabricante com a segurança”. Por outro lado, ficaram críticas à suspensão: “Faz um pouco de barulho em terreno mais acidentado e dá a impressão de certa fragilidade. É um carro que talvez precise ser mais adequado às condições brasileiras”.
Em seguida a publicação comparou o Passat L ao “irmão mais velho” TL, ao Corcel e ao Dodge 1800, em que o novo carro sobressaiu em desempenho, nível de ruídos e acabamento, com notas baixas para instrumentos e suspensão. Embora superado pelo 1800 em aceleração e pelo TL em consumo a 100 km/h, ele obteve o menor espaço de frenagem à mesma velocidade e demonstrou qualidade de fabricação. “Conforto e posição do motorista mostraram uma ligeira vantagem do Passat e do Corcel”, observou.
A versão de quatro portas era lançada em 1975 com uma conveniência então pouco apreciada pelos brasileiros — carros que surgiram com elas, como o Corcel e o Opala, passaram a ter nas opções de duas portas as mais vendidas. Outra ampliação da linha vinha no ano seguinte: o Passat de três portas, que mantinha o formato da carroceria, mas levava o vidro traseiro junto da tampa. A opção, interessante por permitir ampla entrada de bagagens maiores, era beneficiada pelo rebatimento do banco traseiro, mas alguns olhavam a ampla porta como nova fonte de ruído.
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Os especiais
Variações muito interessantes do Passat foram feitas pela Dacon, concessionária Volkswagen em São Paulo, SP, com grande experiência em modificação mecânica e personalização de veículos. O sedã, denominado 180D, trazia uma traseira reta e baixa com vidro amplo que atendia aos padrões de estilo da época. Vinha com quatro faróis circulares (em vez dos dois retangulares usados na época), lanternas traseiras da Variant II, ponteiras sanfonadas nos para-choques, rodas de alumínio, pintura perolizada e teto solar. Vendeu bem, apesar do preço bem mais elevado que os dos modelos de série.
Outras variações pela Dacon eram o 180S, com um grande e envolvente vidro traseiro em forma de bolha, e o 180 Targa, no qual a seção traseira da cabine vinha com capota para deixar os passageiros com a sensação de um conversível — os da frente dispunham apenas de teto solar. No anos 80 o sedã era renomeado 821, e o Targa, 822. A empresa fez também o Passat limusine, em 1978, com aumento da distância entre eixos em 25 centímetros e bancos de couro. O acréscimo era feito às portas traseiras, que assim facilitavam em muito o acesso em relação a um LSE de série.
Inspirada na Variant alemã, a Dacon desenvolveu também peruas Passat, em 1978, nas versões de três e cinco portas — esta, espécie de precursora da Quantum —, no que foi seguida em 1981 pela Sorana, outra concessionária da marca. Enquanto a perua de três portas usava um único vidro lateral traseiro (como na Parati que a própria VW lançaria em 1982), a de cinco portas adotava um teto mais elevado a partir da coluna central, com direito a faixas de janelas à frente e nos lados para ampliar a iluminação do interior. Bancos revestidos em couro, ar-condicionado, para-brisa degradê e até os faróis retangulares do Dodge Polara estavam disponíveis. Na foto à direita, a linha de transformação do Passat em 180D.
A Dankar, empresa carioca de carros fora de série (fabricante do esportivo Squalo), também elaborou seu sedã, com o nome Júlia, no começo da década de 1980. O projeto foi vendido mais tarde para o estaleiro MacLaren, de Niterói, RJ. Toda a carroceria era remodelada em plástico reforçado com fibra de vidro, deixando as formas mais arredondadas. A transformação usava o para-brisa do Fiat 147 como vidro traseiro, lanternas do Opala da época e as maçanetas embutidas do Alfa Romeo 2300.
A Sulam, também de São Paulo, fez uma curiosa versão nacional do Audi Quattro alemão, usando como base o Passat duas-portas, em 1984. A semelhança com o famoso carro de rali, que fez sucesso na Europa também na versão de rua, era na parte traseira e na dianteira de plástico reforçado com fibra de vidro. Usava lanternas traseiras do Fiat Uno, vidros dianteiros sem quebra-vento e rodas e pneus especiais. Na parte mecânica podia receber motor de 2,0 litros e 122 cv, freios mais potentes e amortecedores pressurizados. Era caro, mas chamava bastante atenção.
Transformações visuais à parte, a Enpro — preparadora famosa nos anos 70 — apresentou um Passat com turbocompressor em 1980. Aceleração de 0 a 100 km/h em 9,5 segundos e máxima de quase 200 km/h seriam números respeitáveis para um carro nacional médio mesmo hoje. A empresa modificou a frente, dando-lhe certa semelhança ao Scirocco alemão, com quatro faróis circulares reposicionados.
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