Mesmo que ainda não mostrasse o luxo que ganharia nas décadas seguintes, o
interior do Range Rover dos anos 70 já trazia conforto inesperado para um utilitário
Essa viabilidade vinha de um interior confortável e de uma mecânica distante da aspereza dos jipes tradicionais: “Inesperadamente bom é o padrão de conforto de rodagem, uma lição do que pode ser obtido com eixos rígidos à frente e atrás. As molas helicoidais de longo curso absorvem as irregularidades de forma extraordinária, sem quaisquer dos trancos de um Land Rover comum com molas semielípticas. Igualmente impressiona a aceleração, que faz dele em geral o carro mais rápido nos semáforos. Não há vibrações e o nível de ruído é sempre muito baixo”. Nos Estados Unidos, a revista Popular Science também se surpreendeu: “Ficamos maravilhados com o conforto, desempenho, comportamento e capacidade de ir a qualquer lugar do Range Rover”.
A aceitação da proposta do Range Rover foi expressiva: durante a maior parte da década, formaram-se listas de espera e quem conseguia um podia vendê-lo com lucro
A Car britânica comparou em 1978 o utilitário inglês aos norte-americanos Chevrolet Blazer e Jeep Cherokee, ambos em gerações mais antigas que as que conhecemos no Brasil. O modelo local mostrou bons atributos: “Ele torna realmente fácil operar em terrenos difíceis, com sua suspensão de longo curso deixando cair as rodas nos buracos para uma tração apreciável, bem como um rodar muito confortável. Uma vez mais, ficamos impressionados com seu desempenho fora de estrada e sua robustez. Ele pode ter rivais em algum lugar do mundo, mas o Cherokee e o Blazer não são. Nada há de errado com eles, mas são veículos para o mercado de lazer acima de tudo”.
A carroceria de cinco portas vinha em 1981 e logo ganhava a preferência dos
compradores; câmbio automático e motor com injeção eram outras novidades
Evolução e mais opções
A aceitação da proposta do Range Rover foi expressiva: durante a maior parte da década, listas de espera formaram-se nas concessionárias da marca e quem conseguia comprar o seu podia vendê-lo com lucro no mercado paralelo. A Mercedes-Benz aparentemente seguiu a mesma fórmula para criar seu Classe G, em 1979. Mas as pesquisas de opinião apontavam que esse sucesso podia ser ainda maior se fossem atendidas algumas reivindicações.
A direção assistida vinha já em 1973. Uma versão de cinco portas chegava em julho de 1981 e se tornava tão importante que acabaria descartando a de três na maioria dos mercados, seis anos depois. Na Alemanha era introduzida a série especial Trophy, alusiva à participação do Range no reide Camel Trophy (leia boxe na próxima página), com pintura em bege e preto, guincho dianteiro, proteção frontal para grade e faróis, bagageiro e bússola, entre outros acessórios. Os para-choques haviam substituído em 1980 o acabamento cromado pelo preto.
Um câmbio automático Chrysler de três marchas vinha em 1982, seguido um ano depois pelo manual de cinco. A primeira versão de alto luxo — a Vogue — aparecia em 1984 e, após outro ano, o motor adotava injeção eletrônica para menores consumo e emissões poluentes, passando a 165 cv e 29,3 m.kgf, além de oferecer uma caixa automática ZF de quatro marchas. Ao lado das novas opções, um aprimoramento na qualidade de fabricação e o uso de suspensão mais macia o tornavam ainda mais bem-sucedido.
Na publicidade, alusão à versatilidade de uso, com quatro tipos de carro em um
(nos dois primeiros anúncios), e à confiabilidade sob qualquer condição climática:
“Ele não só diz que você chegou: também diz que você voltará para casa”
Depois de fracassadas tentativas de adaptar o motor V8 ao uso de diesel no chamado projeto Iceberg, a Rover adotava em 1986 um motor turbodiesel de 2,4 litros, 106 cv e 24 m.kgf da italiana VM. A recepção pela imprensa foi fria, com críticas ao desempenho bastante inferior ao do V8 a gasolina, o que levou a empresa a colocar o Range em um teste de longa duração no circuito da MIRA (Associação de Pesquisas da Indústria de Automotores), em Warwickshire. O utilitário bateu 27 recordes para veículos a diesel, um deles com velocidade média acima de 161 km/h por 24 horas. No mesmo ano a grade passava a usar barras horizontais em vez de verticais.
O Range Rover enfim chegava em 1987 ao mercado dos Estados Unidos, onde era vendido antes só por importação não oficial. No ano seguinte o grupo Rover era adquirido pela British Aerospace, indústria aeroespacial britânica. Em comparativo ao Jeep Grand Wagoneer, a Car and Driver norte-americana descrevia o Range Rover: “Ao lado de paz de espírito, o preço do RR lhe compra tanto conforto, luxo e apelo quanto sedãs de preço similar oferecem. Seus únicos deméritos são o desempenho limitado e o interior adequado a não mais que quatro adultos. Se você é do tipo de pessoa que quer todo o prestígio e luxo que pode ter, não importa a que custo, você ficará mais feliz em um Range Rover”.
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Os especiais
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Seja para o lazer ou para aplicações de serviço, o utilitário inglês passou por transformações variadas durante seus mais de 40 anos. A empresa Spencer Abbott adaptou o Range Rover da primeira geração, de três portas, para uso como ambulância. Pode parecer estranho, mas tinha suas razões: aderência em pisos com neve ou gelo, conforto de rodagem, motor potente.
Na Suíça, em 1980, o cinco-portas recebeu um acabamento luxuoso pelas mãos da Monteverdi, incluindo bancos revestidos de couro. A inglesa Schuler oferecia um interessante pacote mecânico: caixa de câmbio automática Chrysler Turboflite, tração integral permanente Ferguson e freios com sistema antitravamento (ABS), isso em 1980. Rodas especiais e quatro faróis circulares estavam disponíveis.
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Para a visita do papa João Paulo II à Inglaterra, em 1982, dois modelos de três portas foram adaptados com estilo elaborado pela Ogle Design. Uma alta cabine foi acoplada à parte traseira, com ampla área envidraçada, para que o ilustre passageiro pudesse trafegar em pé.
Mais ousadas foram as transformações para três eixos, realizadas por várias empresas, como a Chameleon e a Glenfrome. Esta última adicionou um eixo e 90 centímetros, com opção entre tração em quatro ou nas seis rodas.
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Algo semelhante foi feito na mesma época pela Townley. O Range passava a três eixos, tinha a frente modificada e podia ganhar um teto bem mais alto, com amplos vidros laterais, além de enorme teto solar. O motor podia dar lugar a um Chevrolet V8.
A Carmichael International fez veículos com chassi alongado e três eixos para uso dos bombeiros em aeroportos, por exemplo. A bomba de água montada na frente era acionada pelo próprio virabrequim do motor. Mais tarde foram desenvolvidas versões com tração também no último eixo, ou seja, 6×6.
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E não faltaram versões conversíveis: além da Lahav e das já citadas Glenfrome e Townley, a Schulz Tuning alemã fez a sua, com um teto rígido que restabelecia o formato original do utilitário quando desejado.
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Bem mais tarde, a Jankel aplicou o terceiro eixo ao modelo de segunda geração. Oferecia opções como seis portas, teto mais alto na parte traseira, blindagem e uma versão com a seção posterior aberta e um banco elevado, preparada para caçadas. Também dessa época foi feita na Inglaterra uma versão de duas portas e entre-eixos curto, com a seção traseira aberta, para que a rainha pudesse passear e ser vista pelos súditos. E a Overfinch, que já nos anos 80 instalava motores Chevrolet V8 no Range Rover, fez da segunda geração a versão Holland & Holland, com pintura e interior personalizados.
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Já na terceira geração, a alemã Arden desenvolveu o AR7 Highlander, com motor V8 aumentado para 4,5 litros e compressor para fornecer 520 cv e 71,5 m.kgf. A preparadora anunciava 0-100 km/h em 6,5 segundos. O requinte habitual do Range vinha associado a rodas de 22 ou 23 pol, conjunto aerodinâmico, acabamento com amplas opções ao gosto do cliente e freios mais potentes. Finalmente, a Project Kahn anunciou em 2011 o pacote RS 600, com novos para-choques, anexos aerodinâmicos e rodas de 22 pol.