Evoluções no motor de 1,0 litro somam-se a um pacote
voltado à eficiência: como ele se comporta durante 30 dias?
Texto e fotos: Roberto Agresti
Atualização de 4/9/12
Carregado até a boca, o porta-malas do Gol BlueMotion provou o que todos os quatro ocupantes do carro para a viagem do fim de semana já sabiam: a bagagem a levar rumo ao litoral norte paulista deveria ser pouca. Assim, os pouco mais de 200 quilômetros foram percorridos sem inconvenientes em cerca de três horas.
Para os carros avaliados em nosso Um Mês ao Volante esse é um trecho rotineiro, que serve de “pista de teste” importante e bem conhecida pela maioria dos integrantes da equipe e mescla diversos tipos de estrada: as rápidas e (agora) bem asfaltadas Ayrton Senna e Carvalho Pinto, a tortuosa (e eterno canteiro de obras) rodovia dos Tamoios e seu exigente trecho de serra e, por fim, a Manuel Hipólito do Rego, mais conhecida como Rio-Santos. Esta última, ao menos no trecho entre Caraguatatuba e Ubatuba, é um estupendo exemplo de como “não se faz” pela sinalização ruim ou ausente, má conservação, ausência de acostamento, lombadas em excesso e mal posicionadas e, mais recentemente, uma infestação de rotatórias e criminosos obstáculos de cimento no meio da pista.
Ao motorista, porém, interessava muito saber como o carro mais vendido do Brasil se comportaria com essa carga de gente e bagagem no tão conhecido trajeto. Habituado há décadas a fazer essa viagem, o autor não se lembrava de ter jamais percorrido o trecho com um “mil” — a não ser em imemorial passado remoto, nos anos 70, onde o mil na verdade era um 1050, o primeiro Fiat 147.
A partida noturna deu chance a driblar o chato congestionamento da saída de São Paulo às sextas-feiras, e os 20 km até a boca da estrada foram superados sem sufoco. Temperatura amena, ar-condicionado desligado, um dos pontos positivos do Gol — já enunciado aqui no relato anterior, mas que vale ser rememorado — diz respeito ao razoável isolamento de ruídos, que a 120 km/h deixa as pessoas conversarem sem ser aos berros ou ouvir o som do rádio sem incômodo. A qualidade do sistema de áudio, como se pode imaginar, não é a mesma encontrada em um Audi, mas permite conectar um Ipod e “rolar” as músicas usando o prático comando situado no lado esquerdo do volante.
A viagem do Gol ao litoral mostrou que é viável esse uso para um carro de motor
1,0-litro, desde que se tenha atenção para manter as rotações em alta nas subidas
Sem ar ligado, o Gol provou que oito pulmões respirando ali dentro de vidros fechados não sofrem, mérito de um bom sistema de areação, onde o ventilador na posição 2 (de 4 possíveis) supria as necessidades sem ruído excessivo. Caso algum dos ocupantes decida abrir a tal “frestinha” no vidro, o painel avisa que isso não ajuda a economia de combustível, um acessório do pacote BlueMotion desse “sustentável” Gol.
No trecho rápido da viagem, os cerca de 90 km até a entrada da Tamoios, o Gol manteve os 120 km/h com competência, sem dar a sensação de que sofria para cumprir o ritmo imposto. Com o conta-giros marcando 4.000 rpm, o motorista ainda tem boa parcela de acelerador à disposição, mas quando se aperta o pedal em quinta marcha nessa situação a efetividade é praticamente nula. Há que se trabalhar com o câmbio para fazer o Gol ganhar velocidade, e disso já sabíamos. E o excelente ajuste dos engates — curtos, precisos, nítidos — faz do ato de trocar de marcha um prazer, coadjuvado pela muito macia embreagem.
Descer rumo ao litoral seria fácil. Mas, e subir? Por melhores e bem treinados que sejam os 76 cv do motor do Gol, a relação peso-potência na viagem era de 17 kg/cv
Se a qualidade da transmissão é destaque, rodando aos 120 km/h regulamentares surgiu uma característica do Gol de que o motorista não gostou: a excessiva leveza da direção, que não passa a quem dirige uma sensação de segurança. De fato, há um conjunto de fatores que contribui para que esse Volkswagen em velocidade não ofereça uma boa impressão de estabilidade. Entre eles certamente está o ajuste de suspensão, com amortecedores macios, que em rápidas mudanças de direção favorece uma rolagem importante da carroceria.
Os pneus altos, de medida 175/70 R 14 e composto voltado ao menor atrito de rolamento (uma das diferenças do pacote BlueMotion), não favorecem um rodar mais firme mesmo se inflados com a recomendação para carga total, 38 lb/pol² na dianteira, 42 lb/pol² na traseira, pressão que com carga normal desce a 36 lb/pol² nos quatro pneus. Parece muito? Sim, mas — ao contrário do que se poderia prever — não deixam o rodar do Gol áspero em excesso, mérito em parte dos pneus Goodyear Duraplus, em parte do bom acerto de suspensão.
Contudo, ao passar por defeitos da pista cada ocupante do Gol sabe exatamente como eram tais defeitos, pois aí — por mais que possa se ter empenhado a engenharia da Volkswagen — esse empenho sempre estará amarrado a custos baixos. A mesma limitação aplica-se à impossibilidade de adotar um padrão melhor de carpete, de forração dos bancos e do teto ou de materiais de revestimento dos painéis de porta, o que resulta em ressonâncias indesejáveis e não atenua vibrações desconfortáveis. É o preço do carro barato.
Limitações: a posição de dirigir sem ajuste do volante, a capacidade de bagagem
típica de um hatch pequeno e pneus que não contribuem para a estabilidade
Barato? Não exatamente: o Gol parte de R$ 28 mil, mas com os muitos opcionais presentes nesse que está conosco o valor sobe quase R$ 8 mil (veja a composição do preço no primeiro relato). Sinceramente, é preciso gostar muito de Volkswagen e de Gol para não olhar em volta procurando o que há no mercado por esse valor e o que tais opções oferecem. E a descoberta será farta em termos de alternativas, até com motorizações e grau tecnológico acima desse valente líder de vendas.
Valente? Sim, sem dúvida. Descer rumo ao litoral, já sabíamos, seria fácil. Mas, e subir? Por melhores e bem treinados que sejam os 76 cv do motor do Gol quando alimentado com álcool, a relação peso-potência é cruel: cada cavalo deve carregar 12,5 kg levando em conta o peso do carro em ordem de marcha e, com os quatro passageiros e suas bagagens, transformamos a crueldade em 17 kg/cv.
Embalar é preciso
Teve dias melhores o motorista em termos de poder mecânico para subir a Serra do Mar, habituado a meios de locomoção que exibem menos de 10 kg/cv, mas… surpresa: o Gol se mostrou bem acima do esperado na capacidade de superar os 700 metros de desnível entre a baixada e o planalto. Usando sem preguiça o bom câmbio, adotando o velho e simples método “pé no fundo” do acelerador e cuidando para que a rotação jamais caísse abaixo de 4.500 rpm, o pequeno Volkswagen veio bem serra acima — em que pese os protestos dos passageiros, não muito felizes com o senso de aproveitamento de trajetórias em curvas e o decorrente “joga para cá, joga para lá”. Embalar é preciso: esse seria o bom mote para o Gol 1,0-litro subindo serra.
A conclusão do passeio ao litoral foi positiva, com a citada surpresa da disposição do motor em girar alto e oferecer vivacidade. Mas é claro que o consumo se resentiu, pois a boa média vista na chegada a Ubatuba, 11,6 km/l de álcool, declinou para 9,6 km/l na chegada a São Paulo, incluindo nesse tanque (um só para ida e volta) pequenos passeios litorâneos. Mesmo assim, foi positivo esse rendimento e, associado à boa capacidade do tanque, obtivemos mais de 500 km de autonomia usando o derivado da cana de açúcar.
O saldo da viagem foi um consumo médio de 9,6 km/l de álcool, boa marca se
considerados o peso que estava a bordo e o ritmo acelerado da subida da serra
Se na serra o Gol divertiu seu motorista, no planalto a dura realidade do carro subpotenciado veio à tona. Ao contrário da ida, quando o trecho do planalto foi realizado quase de madrugada e sem movimento, na volta o tráfego de um fim de semana normal fez o motorista várias vezes abdicar de ultrapassagens pela simples constatação de que o Gol não cumpriria a manobra no tempo e espaço ideal. E sendo assim… fila indiana.
Na chegada, quem estava atrás julgou a acomodação “no limite” para as tais três horas de viagem. Já quem ocupou os assentos dianteiros não teve muito do que reclamar, em que pese o motorista não achar a posição de dirigir ideal — sobretudo por conta do volante fixo e da ausência de um real apoio para o pé esquerdo. Outro desconforto anotado foi a falta da faixa degradê no para-brisa. No âmbito da utilidade, uma tecla para abrir o porta-malas no painel ou mesmo uma alavanca no assoalho seria bem-vinda, pois nem sempre se está com a chave (que tem controle remoto da tampa) por perto.
De volta à capital, na noite de segunda-feira realizamos nosso percurso-padrão de consumo, atividade iniciada com o Honda Civic LXL que antecedeu o Gol e que agora compõe Um Mês ao Volante. Nos 43,2 km, abastecido com álcool e respeitando o padrão que estabelecemos (só motorista, limite de velocidade das vias, vidros fechados, ar desligado, tanque cheio), o Gol obteve a marca de 14,6 km/l de álcool. Por ora o Civic, que fez 12,1 km/l com o mesmo combustível, é nossa única referência, mas o número do Gol servirá para comparação a outros modelos do segmento e, claro, ao próprio VW quando estiver abastecido com gasolina, na segunda fase da avaliação.
Para a semana, uma visita à oficina Suspentécnica para a costumeira análise do especialista Alberto Trivellato. Na quinta-feira você confere o relato antecipado pelo feriado, que terá mais estrada para o Gol antes da troca de combustível.
Atualização anterior |
Último período
4 dias |
479 km |
Distância em cidade | 57 km |
Distância em estrada | 422 km |
Tempo ao volante | 10h 37min |
Velocidade média | 45 km/h |
Consumo médio (álcool) | 9,6 km/l |
Indicações do computador de bordo |
Desde o início
12 dias |
1.461 km |
Distância em cidade | 478 km |
Distância em estrada | 983 km |
Tempo ao volante | 41h 27min |
Velocidade média | 35 km/h |
Consumo médio (álcool) | 10,3 km/l |
Melhor marca média (álcool) | 12,9 km/l |
Pior marca média (álcool) | 7,9 km/l |
Consumo em percurso-padrão (43,2 km) | |
Álcool | 14,6 km/l |
Indicações do computador de bordo |
Preço
Sem opcionais | R$ 27.990 |
Como avaliado | R$ 35.855 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 2 |
Diâmetro e curso | 67,1 x 70,6 mm |
Cilindrada | 999 cm³ |
Taxa de compressão | 12,7:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima (gas./álc.) | 72/76 cv a 5.250 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 9,7/10,6 m.kgf a 3.850 rpm |
Transmissão | |
Tipo de câmbio e marchas | manual / 5 |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | hidráulica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson |
Traseira | eixo de torção |
Rodas | |
Dimensões | 5 x 14 pol |
Pneus | 175/70 R 14 |
Dimensões | |
Comprimento | 3,895 m |
Largura | 1,656 m |
Altura | 1,464 m |
Entre-eixos | 2,465 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 55 l |
Compartimento de bagagem | 285 l |
Peso em ordem de marcha | 947 kg |
Desempenho | |
Velocidade máxima (gas./álc.) | 163/165 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h (gas./álc.) | 13,4/12,9 s |
Dados do fabricante; consumo não disponível |