Tudo nesse novo SUV é chamativo e procura fugir dos padrões, como dita a identidade de estilo da marca
Texto: Danillo Almeida – Fotos: divulgação
Os pequenos utilitários esporte são adorados por muitos e criticados por outros, mas não se pode negar que essa concepção de carro, projetada para agradar a vários perfis de cliente ao mesmo tempo, só faz crescer. No Brasil, seus representantes mais vendidos vêm de Ford, Honda, Hyundai, Jeep e Nissan, mas o mercado oferece modelos de muitas outras marcas. Como se pode imaginar, essas outras não vão ficar quietas enquanto veem essa oligarquia se formando.
O Ecosport, por exemplo, dominou a categoria desde seu nascimento até a vinda do Renault Duster, o qual voltou a desbancar com a reforma de 2012. HR-V e Renegade têm propostas bem diferentes e, justamente por isso, travam uma briga interessante no pódio de vendas desde que foram lançados, em 2015. Creta e Kicks se apoiaram nas qualidades típicas dos respectivos fabricantes com mais êxito que o Peugeot 2008 e o Renault Captur.
Como apontado na Análise de Estilo dos Peugeots 3008 e 5008, o grupo PSA vem fazendo um grande esforço para melhorar a imagem de suas marcas perante o público brasileiro. O 2008 já nasceu abalado por esse problema, somado ao fato de não oferecer qualidades que o destacassem — até pela infeliz escolha de não ter transmissão automática com o motor turbo. Em um segmento tão agitado, isso explica por que ele ainda não trouxe o retorno esperado. E explica por que a PSA resolveu trazer reforços.
O novato da PSA tem mais chances de fazer sucesso, não apenas pelo entorno favorável: qualidades próprias não lhe faltam, a começar pelo desenho
O C4 Cactus chega em um momento em que a Citroën está com a linha defasada — veja-se o C3, seu carro-chefe, inalterado em estilo há seis anos. Sua única alternativa aos SUVs compactos até então, a C3 Aircross, é uma derivação da minivan C3 Picasso de 2009. O grupo, porém, começa a colher os frutos de sua renovação por meio da Peugeot: os “primos” 3008 e 5008 estão caindo nas graças do público.
Acreditar que o novato tem mais chances de fazer sucesso apenas porque o entorno está mais favorável seria subestimá-lo: qualidades próprias não lhe faltam, a começar pelo desenho. Tudo nele é chamativo e procura fugir dos padrões, como dita a identidade de estilo da marca. Uns podem achá-lo bonito e outros feio, mas é quase impossível que ele passe despercebido. E isto é, justamente, o que a PSA quer — e precisa.
Fazer do logotipo parte do contorno da entrada de ar é um recurso antigo na Citroën. Aqui, ele foi prolongado aos extremos da carroceria para circundar também as luzes diurnas. Além de ser incomum, essa solução é muito boa para o modelo porque torna a dianteira visualmente larga e elevada ao mesmo tempo, características que são muito cultuadas pelo público-alvo. Outros que a usam são Fiat Toro e o Jeep Cherokee de 2013, cada um a sua maneira — picape e SUV médio são categorias que inspiram o estilo dos pequenos SUVs.
Por causa do recurso visto no item 1, é comum que as pessoas confundam o C4 Cactus com a dupla mencionada ali. Solução simples para isso é observar os faróis, sem conexão visual forte com a entrada de ar ou com o para-choque. Seu formato e sua posição parecem aleatórios precisamente por se tratar de um Citroën recente: a nova identidade da marca busca questionar as diretrizes do estilo atual, dando-lhes novas interpretações. A carroceria é praticamente lisa ao redor dos faróis justamente para destacá-los.
Seguindo o que se viu até aqui, a entrada de ar principal também distingue o Cactus daqueles por estar isolada de tudo. Ela não destoa do conjunto pela ausência de cromado ou cor contrastante, o contorno discreto e a forma geral parecida às demais. Sem dúvida, é uma grande oposição ao estilo da maior parte dos carros, em que todos os elementos estão conectados por vincos e muitos procuram chamar atenção de forma individual. O Cactus passa uma sensação de subversão semelhante à que o Fiat Uno consegue passar até hoje.
As entradas de ar falsas, esculpidas na carroceria, servem mais para quebrar a região vazia do que para sugerir esportividade. A entrada real, no centro, precisava ser grande por motivos funcionais, portanto a Citroën optou por uma aparência bastante discreta. Os suportes dos faróis de neblina têm forma e posição corretos, mas a escolha de luzes circulares destoa da proposta inovadora do carro. Além disso, a alternância entre a cor preta e a cor contrastante evita que as luzes pareçam pequenas em seu suporte, mas causa poluição visual.
Capô alto e pouco inclinado é fundamental para conferir aparência robusta, mas deixa a dianteira muito grande se vista de lado. A Citroën disfarçou esse problema com as luzes, que invadem bastante a lateral, e com os para-lamas, que recebem o revestimento em plástico preto que circunda o carro por baixo. Como ambos os componentes causam impacto, não foi preciso adicionar outros, como vincos ou plaquetas. Alcançar equilíbrio visual assim, com poucos componentes, é mais difícil do que parece — basta ver a mesma porção da carroceria nos rivais diretos.
Aqui há duas das maiores diferenças de estilo entre o C4 Cactus e o padrão de sua categoria. Uma é a ausência de vincos fortes na carroceria: o jogo de luz e sombra é suave, mas não chega a tornar a área vazia excessiva porque os itens de estilo adjacentes têm formas chamativas, que desviam a atenção dos olhares da parte metálica. Outra diferença está na porção inferior: seu desenho alude aos Airbumps do Cactus anterior.
A área envidraçada usa o esquema mais simples possível, sem qualquer peça além das janelas. A razão não chega a ser redução de custos, mas sim estilo: as colunas dianteiras ficaram finas, para não chamarem atenção, e as traseiras são espessas para sugerir robustez. Somente estas mantêm a cor da carroceria para o efeito de teto flutuante. As janelas traseiras ganharam uma moldura posterior mais espessa no Cactus brasileiro para ficarem um pouco menores, o que lhes permite a abertura para baixo.
Esta é a parte da lateral em que a carroceria por si só ganha mais destaque: além da coluna espessa, observa-se uma dobra suave na linha de cintura. Esse “ombro” ajuda no jogo de luz e sombra e forma uma leve saliência na parte traseira, para evitar o caimento típico de hatchback. Todos esses efeitos foram usados com leveza, de modo que a sensação geral é de um carro imponente e encorpado, sem recorrer à poluição visual. Fugir de excessos é uma das melhores qualidades da identidade de estilo atual da Citroën.