
Sem sobressair aos 1,0-litro, novo motor Puretech de três cilindros deixa-o bom de dirigir, mas preço incomoda
Texto e fotos: Fabrício Samahá
Pode um carro melhorar com menos cilindros, cilindrada, potência e torque? A Peugeot sugere que sim com a recente substituição de motor para as versões de maior volume de vendas do 208: sai o quatro-cilindros da série TU de 1,45 litro e duas válvulas por cilindro, entra o três-cilindros Puretech de 1,2 litro e quatro válvulas. Para confirmar se a troca foi positiva, o Best Cars submeteu um desses carros a uma avaliação completa.
Recebemos a versão superior equipada com ele, a Allure, que custa R$ 55.790 ou R$ 56.980 com pintura especial (há ainda a Active de R$ 49 mil e a Active Pack por R$ 52.490). Entre seus equipamentos de série estão alarme volumétrico, ar-condicionado automático de duas zonas, bolsas infláveis laterais dianteiras, computador de bordo, controlador e limitador de velocidade, controle elétrico de vidros, travas e retrovisores, direção com assistência elétrica, faróis de neblina, lanternas traseiras com leds, repetidores laterais das luzes de direção, rodas de alumínio de 15 pol, sensores de estacionamento na traseira, sistema de áudio com tela tátil de sete polegadas e teto envidraçado.
Grade, faróis e lanternas atualizados realçam o desenho moderno do 208 Allure
À primeira vista, há pouca vantagem na mudança. Apesar de todo o avanço técnico que o novo motor representa (leia Comentário Técnico na página 2), a potência caiu de 89/93 cv do quatro-cilindros para 84/90 cv no três-cilindros, e o torque máximo, de 13,5/14,2 m.kgf a 3.000 rpm para 12,2/13 m.kgf a 2.750 rpm, sempre na ordem gasolina/álcool. Os dados de desempenho, assim, apontam perdas expressivas: a aceleração de 0 a 100 km/h piorou de 11,7/10,9 segundos para 14,3/12,8 s e a velocidade máxima caiu de 177/181 km/h para 171/177 km/h.
O motor fornece respostas consistentes ao acelerador e mostra-se bem “esperto” ao redor de 2.500 rpm, com sensação de maior cilindrada
Onde a novidade alcança seu maior benefício é no consumo: pelos dados oficiais conforme os padrões do Inmetro, o novo 208 faz 15,1/10,9 km/l no ciclo urbano e 16,9/11,7 km/l no rodoviário, ganhos importantes sobre os 11,6/8 km/l (cidade) e 14,3/9,6 km/l (rodovia) do antigo, sempre naquela ordem de combustíveis. O benefício da troca chega a 36% no caso do consumo urbano com álcool.
Submetido aos padrões de medição do Best Cars o pequeno Peugeot também foi bem, com destaque para o consumo em trajeto urbano leve, 15,6 km/l de gasolina (foi mantido o combustível com o qual o recebemos, para evitar misturas no tanque). No trajeto rodoviário os 12,5 km/l foram mais modestos, como habitual em carros de pouca potência, que são mais exigidos nessa medição pelo ritmo de viagem e o uso de ar-condicionado. Ficamos devendo a comparação ao 208 de 1,45 litro, que não passou pelas mesmas medições.
Boa posição de dirigir com instrumentos elevados e pequeno volante; tela de 7 pol do sistema de áudio tem prioridade no painel; espaço traseiro é bem limitado
Economia é bom, sobretudo nesses tempos bicudos, mas como ficou o 208 Puretech para quem dirige?
As impressões com o novo motor são, de modo geral, positivas. Superada a faixa mais baixa (até 1.500 rpm ou pouco mais), fornece respostas consistentes ao acelerador e mostra-se bem “esperto” ao redor de 2.500 rpm, região comum no uso urbano. A sensação nessas condições é de cilindrada superior, em torno de 1,4 litro, equivalendo-se ao motor substituído. Explorado a pleno, porém, o Puretech não tem muito mais a oferecer: em alta rotação o desempenho é moderado, equivalente ao de concorrentes de 1,0 litro (veja números e análise no quadro abaixo).
Ponto sempre controverso em um três-cilindros é suavidade de funcionamento: menos equilibrados que os quatro-cilindros, esses motores muitas vezes incomodam por uma vibração sentida na forma de oscilação. O da Peugeot revela um pouco desse efeito em marcha-lenta e mais ao rodar abaixo de 2.000 rpm, “limpa” dali em diante e volta a incomodar acima de 4.500 rpm (o limitador atua a 6.500), embora seja silencioso na maioria das situações. É um motor agradável, portanto, nas faixas de uso mais frequentes tanto em cidade quanto em rodovia (são 3.750 rpm a 120 km/h em quinta marcha), mais que o do Ford Ka 1,0 e semelhante ao Volkswagen usado em Up, Gol e Fox.
Próxima parte
Desempenho e consumo
Abastecido com gasolina, como o recebemos, o 208 tem potência pouco superior à dos principais modelos de 1,0 litro (um deles, o Ford Ka, chega a ter 1 cv a mais) e pesa mais que a maioria deles, o que explica seu desempenho semelhante ao desses carros. Na aceleração de 0 a 100 km/h, feita em 15,6 segundos, o Peugeot superou o VW Fox Track (16,5 s) e o Nissan March SV (17,1 s), mas perdeu para o VW Move Up (13,5 s) e o Ford Ka SEL (14,4 s), todos com motores de três cilindros, embora seja preciso considerar que esses quatro usavam álcool.
Seu torque bem distribuído, porém, contribui para boas retomadas: de 60 a 120 km/h em quarta o 208 levou 20,8 segundos ante 22,3 s do Up, 24,2 s do Ka, 25,4 s do March e 27,5 s do Fox. E ainda é possível completar tal manobra em terceira (16,2 s), algo que só o Ford também permite: os outros, com transmissão mais curta, atingem antes o limite de rotações do motor.
A comparação de consumo ideal só pode ser feita com uma avaliação anterior do Move Up com gasolina, que foi bem mais econômico: 19,1 km/l no trajeto urbano leve, 9,5 no urbano exigente e 14,8 no rodoviário. No entanto, além de ser bem menor, esse VW foi medido com 25% de teor de álcool na gasolina: os 27% do combustível atual prejudicam um pouco os índices do Peugeot, que ainda assim são expressivos.
Um exercício pode ser feito aplicando-se a diferença de rendimento entre gasolina e álcool pelos padrões do Inmetro (veja os índices em quadro mais abaixo) ao que conseguimos nas medições, de modo a simular como ficaria o 208 com álcool. Chega-se assim a 11,2 km/l no trajeto urbano leve, 6,1 no urbano exigente e 8,7 no rodoviário. Se confirmados na prática, esses números deixariam o Peugeot com consumo próximo ao do Fox (11,4/6,3/9,0 km/l) e menos econômico que o Ka (12,9/6,4/9,8 km/l) e o March (12,4/7,0/9,8 km/l).
Aceleração | |
0 a 100 km/h | 15,6 s |
0 a 120 km/h | 22,4 s |
0 a 400 m | 19,9 s |
Retomada | |
60 a 100 km/h (3ª.) | 10,3 s |
60 a 100 km/h (4ª.) | 12,4 s |
60 a 120 km/h (3ª.) | 16,2 s |
60 a 120 km/h (4ª.) | 20,8 s |
80 a 120 km/h (3ª.) | 12,1 s |
80 a 120 km/h (4ª.) | 15,2 s |
Consumo | |
Trajeto leve em cidade | 15,6 km/l |
Trajeto exigente em cidade | 8,4 km/l |
Trajeto em rodovia | 12,5 km/l |
Autonomia | |
Trajeto leve em cidade | 772 km |
Trajeto exigente em cidade | 416 km |
Trajeto em rodovia | 619 km |
Testes efetuados com gasolina; conheça nossos métodos de medição |
Dados do fabricante
Velocidade máxima | 171/177 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 14,3/12,8 s |
Consumo em cidade | 15,1/10,9 km/l |
Consumo em rodovia | 16,9/11,7 km/l |
Consumo conforme padrões do Inmetro |
Acabamento correto, velocímetro digital, teto envidraçado, controlador e limitador de velocidade, ar-condicionado de duas zonas, bolsas infláveis laterais
Aspecto que merece aprimoramento é o comando da transmissão: os engates são pouco precisos e não foi raro a primeira marcha “escapar” ao se acoplar a embreagem em saídas. O item destoa da excelência do conjunto mecânico, pois no restante o 208 está muito bem acertado para sua proposta.
É o caso do conforto de marcha, talvez o mais alto oferecido hoje no segmento: sobre pisos irregulares, ondulações e lombadas, o Peugeot absorve tudo muito bem e permite um rodar macio — talvez só o “primo” Citroën C3 se iguale na categoria. Curvas rápidas revelam mais inclinação lateral e movimentos de carroceria do que seria ideal, mas a nosso ver a marca encontrou um bom compromisso para uma versão sem pretensões esportivas. Outro destaque é a assistência elétrica de direção, que a deixa bem leve em manobras e no uso urbano. Melhoráveis são os freios, com pedal algo elástico e discos dianteiros não ventilados, mais propensos ao superaquecimento sob uso intensivo.
Novo motor é menos potente, mas atende bem ao uso urbano e não incomoda pelo ruído em rodovia; comando da transmissão precisa melhorar
Instrumentos elevados, bom conteúdo
Saindo da mecânica, o 208 continua um carro agradável. A solução do posto do motorista com volante pequeno e quadro de instrumentos lido por cima dele nos parece muito prática — apenas a grafia do velocímetro é congestionada, fato atenuado pelo repetidor digital. Controlam-se o sistema de áudio (com entradas USB e auxiliar e espelhamento de telefone por sistemas Apple Car Play e Mirror Link, mas sem toca-CDs), o computador de bordo (com duas medições) e o telefone via Bluetooth com facilidade pela tela central elevada e sensível ao toque, que não vem mais com navegador na versão Allure, ao contrário dos modelos iniciais.
Seu conforto de marcha é talvez o mais alto hoje no segmento: o Peugeot absorve tudo muito bem e permite um rodar macio
O espaço interno está na média da classe, com acomodações razoáveis para pernas e cabeça dos passageiros de trás, mas largura muito limitada para três pessoas. O motorista tem posição adequada, com banco, volante (ajustável em altura e distância) e pedais bem definidos entre si, e visibilidade favorecida pela base de para-brisa baixa e colunas dianteiras não muito largas. Apesar da simplicidade do tecido de revestimento, o interior mostra bom aspecto geral e a capacidade de bagagem, 285 litros, está bem situada na categoria.
Itens que agradam (além dos equipamentos citados no começo do texto) são cintos de três pontos e encostos de cabeça para todos os passageiros, faróis de duplo refletor com leds para luz diurna, lavador de para-brisa com ótima dispersão de água, mostrador de temperatura externa, o bom arranjo do teto envidraçado (cujo forro impede toda a passagem de raios solares) e volante revestido em couro. Sem falar nas belas linhas do 208, acentuadas por detalhes charmosos como as lanternas traseiras com leds.
Rodar confortável é ponto alto, com estabilidade adequada; porta-malas leva 285 litros
Poderiam melhorar: o controle elétrico de vidros tem função um-toque só para o do motorista, os difusores de ar ficam baixos (pela prioridade à tela central), há luz de cortesia apenas na parte dianteira da cabine e poucos locais para objetos do dia a dia, o bocal do tanque de combustível ainda usa chave e faltam alças de teto, banco traseiro bipartido e faixa degradê no para-brisa. Também achamos infelizes as partes plásticas de painel e portas em cinza claro com textura estriada, embora isso seja pessoal.
A versão de motor mais acessível do 208 era, até então, um carro moderno com coração ultrapassado — a unidade de 1,45 litro nascera com menor cilindrada na década de 1980 no 205, que daria lugar ao 206 e ao 207 antes de chegar ao atual modelo. Essa defasagem fica para trás com o novo e eficiente Puretech, que representa vantagens efetivas para o comprador em termos de economia e atende bem às necessidades de desempenho.
A Peugeot deveria, no entanto, rever sua política de preços: mesmo que a versão Allure seja bem-equipada, não se justifica custar R$ 55.790, mais que concorrentes de boa dotação de equipamentos e desempenho superior como Chevrolet Onix LTZ 1,4 (98/106 cv, R$ 51 mil), Fiat Punto Essence 1,6 (115/117 cv, R$ 52.060), Ford Fiesta SE 1,5 (107/112 cv, R$ 52.090), Hyundai HB20 Comfort Style 1,6 (122/128 cv, R$ 51.845) e VW Fox Highline 1,6 (110/120 cv, R$ 55.490).
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Comentário técnico
• As adaptações para o Brasil, onde é flexível em combustível, passaram por aumento da taxa de compressão de 11:1 para 12,5:1, reforço aos pistões, mancais e sedes de válvulas e a adoção de aquecimento dos injetores para permitir a partida a frio com álcool, sem injeção de gasolina. Em relação ao antigo 1,45-litro a Peugeot encurtou o diferencial em 9,3% (o que afeta todas as marchas na mesma proporção) sem alterar outras relações, coerente com a potência reduzida.
• A plataforma do 208, de código interno PF1, serve a diversos outros modelos compactos do grupo PSA: os C3, C4 Cactus e C-Elysée (chinês) da Citroën, o DS3 da divisão DS e os 2008 e 301 da mesma Peugeot. Como é frequente na indústria hoje, são várias as opções de distância entre eixos: 2,466 metros para C3 e DS3, 2,538 m para 208, 2,595 m para C4 Cactus e 2,655 m para C-Elysée e 301.
Foto: divulgação
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 3 em linha |
Material do bloco/cabeçote | alumínio |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 75 x 90,3 mm |
Cilindrada | 1.197 cm³ |
Taxa de compressão | 12,5:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima (gas./álc.) | 84/90 cv a 5.750 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 12,1/13,0 m.kgf a 2.750 rpm |
Potência específica (gas./álc.) | 70,2/75,2 cv/l |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | manual / 5 |
Relação e velocidade por 1.000 rpm | |
1ª. | 3,64 / 7 km/h |
2ª. | 1,95 /13 km/h |
3ª. | 1,28 / 19 km/h |
4ª. | 0,98 / 25 km/h |
5ª. | 0,77 / 32 km/h |
Relação de diferencial | 4,69 |
Regime a 120 km/h | 3.750 rpm (5ª.) |
Regime à vel. máxima informada | 5.350/5.500 rpm (5ª.) |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco (266 mm ø) |
Traseiros | a tambor (203 mm ø) |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Diâmetro de giro | 10,4 m |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Estabilizador(es) | dianteiro e traseiro |
Rodas | |
Dimensões | 6 x 15 pol |
Pneus | 195/60 R 15 |
Dimensões | |
Comprimento | 3,975 m |
Largura | 1,702 m |
Altura | 1,472 m |
Entre-eixos | 2,541 m |
Bitola dianteira | 1,475 m |
Bitola traseira | 1,47 m |
Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,33 |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 55 l |
Compartimento de bagagem | 285 l |
Peso em ordem de marcha | 1.073 kg |
Relação peso-potência (gas./álc.) | 12,8/11,9 kg/cv |
Garantia | |
Prazo | 3 anos sem limite de quilometragem |
Carro avaliado | |
Ano-modelo | 2017 |
Pneus | Pirelli Cinturato P1 |
Quilometragem inicial | 2.000 km |
Dados do fabricante |