
Versão turbo mostra o que o três-cilindros pode fazer ao hatch médio, mas preço com opcionais passa de R$ 96 mil
Texto e fotos: Fabrício Samahá
De quantos litros de cilindrada você necessita para a satisfação com o desempenho de um hatch médio? Até algum tempo atrás, no Brasil, seria difícil responder menos de 1,6 e, para muitos, a história começaria em 2,0 litros. Mas um lançamento veio mudar esse quadro: o Volkswagen Golf Comfortline TSI de 1,0 litro.
Com turbocompressor, injeção direta e outras soluções técnicas, o pequeno motor de três cilindros cedido pelo Up consegue surpreender pela vivacidade em um carro de 1,2 tonelada. Não pense em números de aceleração: apesar da boa marca de 10,9 segundos de 0 a 100 km/h, não é esse o foco do Golf de 1,0 litro, mas sim oferecer torque generoso em qualquer condição de uso, a ponto de dispensar a opção pela versão de 1,4 litro para grande parte dos motoristas.
Seja com gasolina (que lhe permite 116 cv e que usamos no teste), seja com álcool (apto a 125 cv), a versão de entrada do Golf obtém torque máximo de 20,4 m.kgf a apenas 2.000 rpm. Isso significa que, uma vez “enchida” a turbina, consegue-se mais torque nessa baixa rotação do que alguns motores aspirados de 2,0 litros — como os de Honda Civic, Nissan Sentra e Toyota Corolla — terão lá em cima, na faixa de 4.000 rpm.
Essa condição de trabalho do turbo não demora a ser atingida: com um retardo (lag) dos menores, o TSI logo está pronto para mover o Golf com desenvoltura. Apenas algum hábito se faz necessário ao sair — os acostumados a motores maiores e aspirados tendem a acoplar a embreagem com pouca pressão no acelerador e podem fazê-lo apagar. À parte essa adaptação, o 1,0-litro traz as delícias do turbo em motores pequenos.
Em rodovia não é preciso sair da sexta marcha para ultrapassagens moderadas ou certas subidas: basta abrir o acelerador para sentir a reserva de potência
No dia a dia, há tanta elasticidade no três-cilindros que pouco se precisa mudar de marcha para circular pela cidade, contornar esquinas e passar por lombadas. A caixa manual de seis marchas foi escalonada de forma a obter velocidade por 1.000 rpm na última similar à do Up, como 2.850 rpm a 120 km/h. Assim, agora existem quatro marchas no intervalo entre a primeira e a última, em vez de três, e a terceira ficou bem mais “esperta” que no irmão menor — o Up requer segunda para qualquer lombada.
No uso em rodovia, não é preciso sair da sexta marcha para ultrapassagens moderadas ou certas subidas: basta abrir o acelerador para sentir a ação de agradável reserva de potência. Tanto numa quanto noutra condição, o consumo é bastante baixo: excelentes 15,9 km/l em nosso trajeto urbano leve e bons 14,5 no rodoviário. O motor turbo preserva seu desempenho com qualquer altitude e, com um ótimo trabalho de anulação de vibrações e asperezas, o “três” ficou tão suave quanto um “quatro” — bem mais que no Up — na maioria das situações, até o limite de 6.500 rpm. O máximo que se percebe é sutil oscilação em marcha-lenta.
Logotipo TSI sem menção à cilindrada é única diferença externa para o outro Golf Comfortline, o MSI de 1,6 litro; rodas de 17 pol estão entre os numerosos opcionais
Seria possível, então, abrir mão por inteiro dos Golfs de maior cilindrada? Em termos. Quando se trata de desempenho puro, o 1,0-litro é apenas razoável: a pequena turbina parece “fechar o expediente” em alta rotação, quando o carro lembra a pacata versão de 1,6 litro. Para quem tem nesse quesito uma prioridade, a escolha do 1,4 turbo de 150 cv é aconselhável. Outra limitação é que, ao menos por enquanto, não existe opção de transmissão automática para o 1,0, embora a manual tenha comando preciso (não é tão leve) e a prática marcha à ré sincronizada.
Suspensão competente, interior agradável
O competente motor faz parte de um dos melhores conjuntos entre os hatches médios da categoria, em produção em São José dos Pinhais, PR, desde o começo de 2016. Comparado aos Golfs que vinham da Alemanha e depois do México, o nacional perdeu a suspensão traseira independente multibraço em favor do eixo de torção — mais simples, barato e talvez mais robusto para as condições severas do piso brasileiro. Como ficou?
Respostas do motor turbo a partir de 1.500 rpm são muito convincentes, com consumo baixo e operação suave; bom comando da caixa manual de seis marchas
Próxima parte
Desempenho e consumo
Aceleração | |
0 a 100 km/h | 10,9 s |
0 a 120 km/h | 14,7 s |
0 a 400 m | 17,8 s |
Retomada | |
60 a 100 km/h (3ª.) | 7,9 s |
60 a 100 km/h (4ª.) | 9,3 s |
60 a 120 km/h (3ª.) | 12,0 s |
60 a 120 km/h (4ª.) | 13,8 s |
80 a 120 km/h (3ª.) | 9,2 s |
80 a 120 km/h (4ª.) | 10,3 s |
Consumo | |
Trajeto leve em cidade | 15,9 km/l |
Trajeto exigente em cidade | 8,9 km/l |
Trajeto em rodovia | 14,5 km/l |
Autonomia | |
Trajeto leve em cidade | 730 km |
Trajeto exigente em cidade | 409 km |
Trajeto em rodovia | 665 km |
Testes com gasolina; conheça nossos métodos de medição |
Dados do fabricante
Velocidade máxima | 190/194 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 9,9/9,7 s |
Consumo em cidade | 11,9/8,4 km/l |
Consumo em rodovia | 14,3/10,1 km/l |
Gasolina/álcool; consumo conforme padrões do Inmetro |
Interior sóbrio e funcional com bom acabamento; velocímetro tem repetidor digital; controlador de velocidade é opcional; porta-malas (313 litros) adequado à classe
Melhor do que se poderia esperar. Bem acertado quanto a molas e amortecedores, o médio da Volkswagen roda com relativo conforto, apesar da traseira algo “seca”, e faz curvas muito bem com subesterço em grau aceitável. Os pneus opcionais 225/45 R 17 da Dunlop são muito aderentes e “avisam” na medida certa sobre seu limite. Em um “teste cego”, é provável que a versão nacional despertasse a mesma satisfação ao dirigir que as importadas, cuja traseira também era bem firme. Permanecem a sensação de grande solidez estrutural, os freios de grande capacidade, a direção com assistência elétrica bem calibrada e o controle eletrônico de estabilidade e tração.
O interior também agrada pelos materiais de acabamento e pela definição dos bancos (com espuma de densidade ideal e apoios laterais ótimos em curvas rápidas), do volante e da posição do motorista. Uma ressalva: ao ajustarmos o banco, o acionamento do pedal de embreagem parecia distante em relação ao de freio. Os apliques do painel, que imitam aço escovado, são uma boa alternativa ao já cansado preto brilhante e não deixam a poeira tão evidente. Sem fartura de espaço, dois adultos de média estatura dispõem de conforto no banco traseiro com altura útil muito boa. Ao levar três o do meio fica incomodado, sobretudo pelo encosto, e desloca os colegas para posições desconfortáveis. A capacidade de bagagem, 313 litros, está na média do segmento.
O carro avaliado trazia sistema de áudio com tela de 6,5 pol, que ativa menus à aproximação do dedo, e compatibilidade com Android Auto, Apple Car Play e Mirror Link. Havia ainda ar-condicionado de duas zonas com difusor para o banco traseiro, câmera traseira de manobras, comando a distância para abrir e fechar vidros, controlador de velocidade, faróis e limpador de para-brisa automáticos, porta-luvas refrigerado e com chave e teto solar amplo com controle elétrico.
Bancos dianteiros são ideais em formato e densidade; espaço traseiro acomoda bem dois adultos; tela serve a sistema de áudio (que se conecta a celular), navegador e computador
Detalhes bem executados passam por ajuste de altura também no banco do passageiro, apoio bem definido para o pé esquerdo, comando elétrico do facho dos faróis, computador de bordo com três medições (desde zerar, desde a partida e desde abastecimento), faróis de neblina acionados no lado das curvas, mola a gás para manter o capô aberto e monitor de pressão dos pneus. Os vãos entre painéis de carroceria são estreitos e exatos e os instrumentos ficam às escuras ao rodar só com luzes de posição acesas — perfeito, pois o hábito vai contra a lei e a segurança.
Mesmo tendo perdido a suspensão traseira multibraço, o Golf nacional roda com relativo conforto e faz curvas muito bem, com grande aderência dos pneus 225/45 R 17
Como estamos em país tropical, o fabricante poderia aplicar faixa degradê ao para-brisa e substituir o forro do teto solar, pois a tela deixa passar muito dos raios solares. Luzes diurnas por leds, em vez de lâmpadas halógenas, seriam coerentes com sua modernidade. O estepe de 16 pol, ante 17 dos demais pneus, é uma economia frequente na indústria que limita seu uso. E, embora o retrovisor esquerdo convexo seja bom, o biconvexo do modelo alemão era ainda melhor.
Os equipamentos da série da versão incluem ainda alarme antifurto, assistente para saída em rampa, bloqueio eletrônico do diferencial, bolsas infláveis (frontais, laterais dianteiras, de joelhos do motorista e de cortina), cintos de três pontos para todos os ocupantes, fixações Isofix para cadeira infantil, frenagem automática pós-colisão (pode evitar novo acidente com o carro descontrolado), rodas de alumínio de 16 pol, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros e sistema de áudio sem navegador. O preço básico é de R$ 77.247, apenas R$ 883 abaixo da versão MSI de 1,6 litro.
A versão ficou tão interessante que, para a maioria, pode dispensar a compra do 1,4-litro de 150 cv… desde que se abra mão da transmissão automática
É um valor atraente pelo que o Golf oferece — o problema está nos opcionais. O carro avaliado trazia os pacotes Comfort (ar-condicionado automático de duas zonas e bancos de couro) e Exclusive (que acrescenta o sistema Discover Media com navegador ao pacote Elegance: controlador de velocidade, faróis e limpador automáticos, retrovisor interno fotocrômico, rodas de 17 pol e volante com comandos), além do teto solar. Com tudo isso ele chegava a R$ 96.489 e, com pinturas especiais, poderia custar R$ 98.034: está salgado para um carro de sua potência e sem marca de prestígio.
O concorrente mais direto, o Ford Focus SE Plus de 1,6 litro (131/135 cv), custa R$ 84.900 com conteúdo semelhante ao do Golf avaliado, mas sem teto solar. Por R$ 91.890 tem-se o Chevrolet Cruze Sport 6 LT turbo de 1,4 litro (150/153 cv) com caixa automática de seis marchas, que deixa de fora poucos itens do VW, como o teto e cortinas infláveis. Assim, o Golf TSI de 1,0 litro agrada muito ao volante, mas requer moderação na escolha de opcionais sob pena de perder a boa relação custo-benefício.
Mais Avaliações
Comentário técnico
O motor TSI de três cilindros e sua injeção direta de combustível
• O motor EA-211 turboalimentado é similar ao do Up, mas não igual. Além da maior pressão de superalimentação (passou de 0,9 para 1,3 bar), a VW adotou novo turbocompressor (carcaça, turbina e compressor), válvulas de escapamento preenchidas por sódio (para melhor dissipação de calor) e sistema de arrefecimento redimensionado.
• Permanecem elementos construtivos como bloco de alumínio, injeção direta de combustível, variação do tempo de abertura das válvulas de admissão e de escapamento, virabrequim forjado (mais resistente), duplo circuito de arrefecimento (um para bloco, outro para cabeçote), coletor de escapamento integrado ao cabeçote, velas com eletrodo central de irídio e sensor de teor de álcool (identifica o combustível antes da combustão). A partida a frio dispensa preaquecimento por conta da alta pressão de injeção. O acionamento dos comandos de válvulas é mediante correia dentada e a relação r/l é ótima, 0,277.
• Em relação ao do Up, o motor do Golf produz mais potência (116 cv com gasolina e 125 com álcool ante 101 e 105 cv) e torque (20,4 m.kgf a partir de 2.000 rpm contra 16,8 m.kgf a 1.500 rpm, com qualquer dos combustíveis). Em comparação ao Golf 1,6 há ganhos discretos em potência (ante 110 e 120 cv), mas muito expressivos em torque: o MSI tem 15,8 e 16,8 m.kgf a bem mais altas 4.000 rpm.
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 3 em linha |
Material do bloco/cabeçote | alumínio |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 74,5 x 76,4 mm |
Cilindrada | 999 cm³ |
Taxa de compressão | 10,5:1 |
Alimentação | injeção direta, turbocompressor, resfriador de ar |
Potência máxima (gas./álc.) | 116/125 cv a 5.500 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 20,4 m.kgf de 2.000 a 3.500 rpm |
Potência específica (gas./álc.) | 116,1/125,1 cv/l |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | manual / 6 |
Relação e velocidade por 1.000 rpm | |
1ª. | 3,77 / 7 km/h |
2ª. | 1,96 / 14 km/h |
3ª. | 1,28 / 22 km/h |
4ª. | 0,97 / 28 km/h |
5ª. | 0,78 / 35 km/h |
6ª. | 0,65 / 42 km/h |
Relação de diferencial | 4,35 |
Regime a 120 km/h | 2.850 rpm (6ª.) |
Regime à velocidade máxima informada | 5.400/5.500 rpm (5ª.) |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado (288 mm ø) |
Traseiros | a disco (253 mm ø) |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Diâmetro de giro | 10,9 m |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Estabilizador | dianteiro |
Rodas | |
Dimensões | 7 x 17 pol |
Pneus | 225/45 R 17 |
Dimensões | |
Comprimento | 4,255 m |
Largura | 1,799 m |
Altura | 1,468 m |
Entre-eixos | 2,638 m |
Bitola dianteira | 1,539 m |
Bitola traseira | 1,514 m |
Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,334 |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 51 l |
Compartimento de bagagem | 313 l |
Peso em ordem de marcha | 1.223 kg |
Relação peso-potência | 10,5/9,8 kg/cv |
Garantia | |
Prazo | 3 anos sem limite de quilometragem (12 anos contra corrosão) |
Carro avaliado | |
Ano-modelo | 2017 |
Pneus | Dunlop Sport Maxx RT |
Quilometragem inicial | 13.000 km |
Dados do fabricante |