Com alguns cuidados ao volante e na manutenção, pode-se
manter o carro seguro e obter longa vida útil do importante sistema
É fácil notar em descidas de serra, sobretudo em períodos de trânsito intenso — como neste feriado prolongado —, como algumas pessoas usam demais os freios. Há quem trafegue por quilômetros quase sem tirar o pé do pedal do meio (ou da esquerda, quando são apenas dois), evidenciado pelas luzes correspondentes sempre acesas. E alguns deles acabam sentindo o efeito desse abuso: perda de eficiência do sistema pelo superaquecimento.
Como evitá-lo? Há uma antiga regra que ainda vale para a maioria dos casos: use para descer a mesma marcha que usaria para subir a serra. Isso significa manter o motor em certa rotação para obter o efeito de freio-motor, que contém a velocidade e permite usar menos os freios. Casos extremos (quem já desceu para Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, pela Rodovia Oswaldo Cruz sabe o que é isso) chegam a justificar a primeira marcha, mesmo em modelos com câmbio automático.
Embora pareça ser o mais comum, esse não é o único erro que motoristas cometem em relação a um dos mais importantes sistemas de segurança ativa do automóvel. Da observação dessas falhas de condução e de manutenção é que veio a ideia para este Editorial de utilidade.
O aquecimento torna-se crítico quando os
freios são usados por longos períodos,
sem pausas suficientes para dissipação do calor
O uso prolongado e abusivo dos freios, como em descidas de serra, talvez fosse evitado se mais motoristas soubessem como o sistema funciona. No freio a disco, este gira com a roda e é “mordido” por pastilhas de ambos os lados quando o fluido hidráulico chega até elas com pressão, após a força aplicada ao pedal ser multiplicada pela câmara do servofreio. No sistema a tambor, sapatas com material de atrito — as chamadas lonas — expandem-se para opor resistência ao tambor que gira com as rodas. Como se vê, em ambos os casos o que se obtém ao segurar o movimento das rodas é atrito e calor.
Apesar de os discos estarem expostos à circulação de ar e grande parte deles ser do tipo ventilado, com um espaço interno para aumentar a exposição ao ar, o aquecimento torna-se crítico quando as pastilhas são comprimidas contra eles por longos períodos, sem pausas suficientes para dissipação de todo o calor. O resultado é que o atrito das pastilhas tende a produzir resultado cada vez menos eficiente em frenagem das rodas — o chamado fading, desaparecimento em inglês, muitas vez mal traduzido como fadiga. O freio a tambor é ainda mais suscetível a tal efeito, sendo por isso restrito à traseira dos carros atuais e apenas até certos patamares de preço e desempenho.
Falando-se em superaquecimento e perda de eficiência, vem à mente outro elemento do sistema, não raro negligenciado: o fluido. Responsável por levar pressão do cilindro-mestre a cada freio, ele precisa ser substituído — a cada dois anos é um intervalo adequado — para manter suas propriedades ideais. Como o fluido é higroscópico (absorve umidade do ar), com o tempo ganha um percentual de água que abaixa o ponto de ebulição, expondo-o ao risco de ferver quando os freios são mais exigidos, além de prejudicar sua atuação por deixar o pedal “elástico”. A umidade pode ainda causar corrosão interna no sistema.
Retificar ou substituir
O que esquenta precisa esfriar, e é bom que isso seja feito normalmente pela dissipação de calor para a atmosfera. Por isso, nada de lavar o carro de imediato ao parar, sobretudo após ter usado bastante os freios: a água fria jogada nos discos pode levá-los a empenar. Em usos mais severos, como em circuitos de competição, chega a ser recomendado não aplicar o freio de estacionamento ao parar, pois a expansão das sapatas (ou a “mordida” das pastilhas, quando esse sistema também usa discos) pode ovalizar os tambores ou empenar os discos. Esses efeitos levam a trepidações nas frenagens e reduzem sua eficiência.
É importante não confundir a trepidação de discos empenados com aquela produzida no pedal pela atuação do sistema antitravamento (ABS). O dispositivo evita o travamento das rodas aumentando e liberando a pressão hidráulica aplicada a cada um dos freios, várias vezes por segundo, o que produz uma pulsação característica — mais notada em pisos irregulares ou de aderência muito baixa. Já os freios empenados vibram mesmo em frenagens suaves sobre asfalto liso e seco.
A espessura das pastilhas e lonas deve ser verificada de tempos em tempos, como a cada 10 mil km, o que requer uma simples inspeção visual no caso dos freios a disco. Recomenda-se a substituição ao atingirem a espessura mínima de 2 mm. Não deixe que o material de atrito acabe, o que causa riscos aos discos e tambores, mas também não há vantagem em trocá-las muito cedo: uma pastilha gasta ainda em condições de uso freia tão bem quanto uma nova.
Como o fluido absorve umidade do ar,
com o tempo seu ponto de ebulição torna-se
mais baixo e o expõe ao risco de ferver
Quando chegar a hora de substituir as pastilhas, cabe examinar os discos. Se estiverem muito riscados ou empenados, é preciso decidir entre a usinagem (“passe”), que retira certo material para restabelecer sua superfície lisa e plana, e a troca dos discos. Existe uma espessura mínima para eles, abaixo da qual estão mais vulneráveis ao empenamento; por isso a usinagem nem sempre é aplicável. No entanto, discos em boas condições podem ser mantidos com novas pastilhas sem perda relevante de capacidade de frenagem. Em qualquer caso, após a troca de pastilhas é ideal não usar os freios a pleno nos primeiros 500 quilômetros para seu perfeito assentamento.
Os dispositivos eletrônicos que têm sido comum nos automóveis, como o citado ABS, a distribuição eletrônica de força de frenagem entre os eixos (EBD) e o reforço de assistência em frenagens de emergência, não requerem manutenção periódica além daquela dispensada aos freios. Basta verificar ao acionar a ignição se a luz-piloto correspondente no painel acende-se e apaga-se, o que indica funcionamento correto dos sistemas.
Como se vê, manter os freios em ordem e preservar sua durabilidade é simples. Na próxima vez em que avistar uma placa de sinalização com os dizeres “declive — desça engrenado”, não pense só nos caminhoneiros com suas muitas toneladas na carroceria: seu automóvel também vai agradecer se contar com o auxílio do freio-motor nas descidas mais severas e alguns cuidados periódicos com os freios. Afinal, com segurança não se brinca.
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