Sempre robusto e funcional, às vezes atraente ou mesmo esportivo, esse japonês já superou 44 milhões de unidades
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
A Toyota Motor Co. Ltd. (TMC) foi fundada em 28 de agosto de 1937 como uma evolução da Toyoda Automatic Loom Works, grande fabricante de teares automáticos para a indústria têxtil. A venda de uma patente da empresa para a Platt Brothers inglesa trouxe recursos financeiros para desenvolver e testar seu primeiro automóvel, que saía no ano seguinte: o modelo AA, baseado no Chrysler Airflow, com motor de seis cilindros, 3,4 litros e potência de 62 cv. Com notável agilidade, apenas dois anos após o fim da Segunda Guerra Mundial era apresentado em 1947 o pequeno SA, de quatro cilindros, 1,0 litro e 27 cv.
Desde então, muito do extraordinário crescimento da empresa — líder mundial em automóveis em 2014 e 2015 — deve-se ao fenômeno chamado Corolla, que completou 50 anos em outubro e já vendeu mais de 44 milhões de unidades em cerca de 150 países.
Duas portas, tração traseira, motor de 1,1 litro e 60 cv, interior simples: o Corolla nascia em 1966 com a missão de atender a novos anseios do público
A primeira geração desse símbolo da marca, designada como KE10, surgiu em novembro de 1966: um sedã duas-portas compacto (3,85 metros de comprimento e 2,28 m entre eixos) e leve (710 kg) com tração traseira. A experiência com o modelo popular Publica “ensinou a Toyota que os consumidores queriam mais que o estritamente básico em seus carros: o Corolla atendia àquela demanda em desempenho, qualidade e conforto de marcha”, explica o fabricante na história do modelo. Sua importância foi tal que a rede de concessionárias de modelos mais simples da marca, a Publica Store, foi renomeada Corolla Store — a Toyota Auto Store encarregava-se de automóveis superiores.
O Corolla não demorou a se tornar o segundo veículo mais vendido no mundo: não prometia emoção ou grande desempenho, mas transporte eficiente e acessível
De linhas simples e funcionais, que não se afastavam do que os europeus faziam na época, o Corolla optava por interior com bancos dianteiros individuais e alavanca de transmissão no assoalho, em vez de banco inteiriço e alavanca na coluna de direção, então usados por muitos carros japoneses. O nome referia-se ao conjunto de pétalas de uma flor. Além do Japão, foi fabricado na Austrália e na Malásia.
O motor longitudinal de quatro cilindros e 1,1 litro, com comando de válvulas no bloco e um carburador, fornecia 60 cv e torque de 8,5 m.kgf. A marca o anunciava com “acessíveis 100 cm³ a mais” em alusão ao motor de 1,0 litro do concorrente Nissan Sunny, embora a maior cilindrada implicasse tributação mais alta. Tudo era simples, comprovado e por isso robusto, como a suspensão posterior de eixo rígido com feixe de molas semielípticas. A dianteira independente McPherson tinha a peculiaridade de somar molas helicoidais e um feixe semielíptico transversal. Usava pequenos pneus 6,00-12 e freios a tambor.
Quatro portas, perua, o fastback Sprinter, caixa automática: opções que ampliaram a família ainda na primeira geração
O modelo de quatro portas, a perua de duas e a opção de transmissão automática de apenas duas marchas chegavam em maio seguinte, seguidos pelo fastback Corolla Sprinter em abril de 1968 — mesma época em que se iniciavam as vendas nos Estados Unidos. A Toyota já oferecia naquele mercado o Crown, sem muito êxito, mas a chegada do Corolla trouxe-lhe um vigor sem data para acabar: os norte-americanos convenciam-se com ele de que os carros japoneses aliavam economia, resistência e qualidade. Um motor de 1,2 litro, 68 cv e 9,3 m.kgf era lançado em 1969; com dois carburadores, passava a 78 cv. Nesse ano começava o ciclo de 33 anos do Corolla na liderança do mercado japonês.
Avaliado nos EUA pela revista Car and Driver, o Sprinter chamou atenção pelo porte compacto: “É 6 cm mais estreito, quase 15 cm mais curto e também mais leve que um Volkswagen. De repente, as estradas parecem ter o dobro da largura e você mal precisa reduzir nas curvas, pois nunca sai de sua faixa. Essa condução é encorajada pelo delicioso comportamento do Corolla. Sua leveza contribui para um rodar desconfortável, mas permite bom desempenho com um motor pequeno. O Sprinter é atraente se seu tamanho permitir — se precisa de mais espaço para cabeça, o sedã não é uma má alternativa”.
Na Inglaterra, a Car comparou o sedã em 1968 ao Ford Escort 1300: “Os orientais fizeram seu carro bem mais bonito, o acabamento dos detalhes é vastamente melhor, os equipamentos mais abrangentes. O motor trabalha em alta rotação, exigindo muito uso da transmissão. Em espaço ele se equivale ao Escort, mas é mais silencioso. Ambos são leves e fáceis de dirigir. Equipe o Ford no mesmo padrão do Toyota e você terá preços tão próximos, que o conservadorismo britânico será a razão para o Escort vender 100 para cada Corolla no Reino Unido”. O japonês ainda acelerou mais rápido (0 a 96 km/h em 15,1 segundos ante 17,3 s) e obteve o mesmo consumo médio, mas foi pior em frenagem.
Dimensões e motores ampliados, incluindo um 1,6-litro com duplo comando e 115 cv para os esportivos, eram novidades do segundo Corolla
Segundo Corolla, maior e mais potente
Não levaram quatro anos para que, em maio de 1970, viesse a segunda geração (KE20). O entre-eixos aumentava em 5 cm e o comprimento em 10, surgia a perua de cinco portas e o motor de 1,2 litro aposentava o de 1,1, além de oferecer a opção de caixa automática no mercado norte-americano. Estava também mais pesado (780 kg) e adotava freios dianteiros a disco e bancos dianteiros com encosto alto. As portas não tinham mais quebra-ventos e havia molduras plásticas na frente e junto às lanternas traseiras.
Ao motor 1,2 eram acrescentados os de 1,4 litro (86 cv com um carburador, 95 com dois) e 1,6 litro (105 cv com um carburador), ainda com comando no bloco. Para os EUA as potências eram menores pelas medidas de redução de emissões poluentes: 55 cv no 1,2 e 75 cv no 1,6 — pelo padrão líquido, como no Japão, e não pelo bruto então usado pelos norte-americanos, que resultava em 73 e 102 cv, na ordem. Na suspensão dianteira era descartado o feixe de molas transversal. No mesmo ano era atingido o primeiro milhão de unidades.
O Sprinter deixava de ser uma versão do Corolla e assumia a própria linha, que agora abrangia um quatro-portas e era vendida no Japão por outra rede de concessionárias. Em março do ano seguinte vinham os esportivos de duas portas Corolla Levin e Sprinter Trueno com motor de 1,6 litro, duplo comando de válvulas no cabeçote e 115 cv. A denominação Levin homenageava um circuito de corridas na cidade neozelandesa de mesmo nome. Grade e lanternas traseiras mudavam na linha 1972.
Na publicidade nos EUA, a ênfase ao conteúdo pelo preço: “Alguns acham o vidro traseiro esquerdo sua parte mais bonita”, em alusão à etiqueta do valor
Nos EUA, a versão 1,6 de comando no bloco foi aprovada pela Car and Driver: “Ele parece ter uma dúzia de comandos no cabeçote, de tão alegre. Há uma sensação de carro esporte vinda de um despretensioso sedã. Roda a 110 km/h sem aparentar esforço e com boa reserva de potência. O motor transformou o caráter do Corolla, sem séria penalização em dólares. Mas poderiam aperfeiçoar sua estabilidade: mais pesado na frente, ele não pode fazer curvas rápido”.
O pequeno Toyota não demorou a se tornar o segundo veículo mais vendido no mundo, conquistando mais e mais mercados. Não prometia emoção ou grande desempenho, mas se revelava um eficiente e acessível meio de transporte pessoal para pessoas de diferentes idades, necessidades e estilos de vida. Em muitos países adquiriu a mesma difusão que o Fusca teve no Brasil, mesmo com a estreia em 1972 do Honda Civic, que seria para sempre um grande adversário mundo afora. A Toyota já era o quarto maior fabricante do globo, só atrás dos “três grandes” dos EUA — General Motors, Ford e Chrysler, nesta ordem.
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