Ousado nas ideias e nas estratégias, o empresário formou
um dos grandes conglomerados da indústria dos Estados Unidos
Texto: José Geraldo Fonseca – Fotos: divulgação
Poucos industriais da área automobilística conseguiram deixar uma obra literalmente tão grande quanto Walter Percy Chrysler. De fato, além de fundador da Chrysler Corporation, ele encomendou a construção de um dos maiores e mais famosos prédios dos Estados Unidos, o Edifício Chrysler em Nova York.
Walter nasceu em 2 de abril de 1875 em Wamego, Kansas, filho de Anna Maria e Henry Hank Chrysler, um maquinista de locomotivas e mecânico de ferrovias. Foi roceiro, atendente de mercearia e vendedor de prataria antes de começar sua carreira em Ellis, no mesmo estado, como aprendiz de ferrovias. Graduado em mecânica em um curso por correspondência, passou alguns anos trabalhando para companhias ferroviárias, nas quais alcançou boa reputação como mecânico, sobretudo no acerto de válvulas dos motores a vapor.
Foi supervisor, superintendente, mecânico mestre de divisão e mecânico mestre geral. Laborou para a Union Pacific, depois para a Fort Worth & Denver, no Texas, e mais tarde para a principal oficina da Chicago Great Western, em Oelwein, Iowa — cidade onde hoje existe um parque com o nome de Chrysler. Suas mudanças de emprego tinham como finalidade atuar em diferentes áreas para uma visão completa da indústria ferroviária. O ponto alto de sua carreira nesse setor deu-se em Allegheny, subúrbio de Pittsburgh, Pensilvânia, onde se tornou gerente das oficinas da American Locomotive Company (ALCO).
Dos trens para os automóveis: Chrysler com Fred Zeder (esquerda), um dos
“mosqueteiros”, e aplicando um selo de inspeção a um Chrysler B-70
Foi nessa época que Chrysler começou a se interessar por automóveis. Em um Salão de Chicago, gostou tanto de um Locomobile que voltou quatro vezes ao evento para o conhecer melhor — e acabou comprando um. Então, desmontou-o diversas vezes para conhecer cada detalhe de seu funcionamento. Mas sua carreira automotiva começava mesmo em 1911 ao ser convidado a encontrar James J. Storrow, um banqueiro que, além de diretor da ALCO, era também executivo da General Motors.
O Chrysler B-70 ou Six teve 32.000 unidades produzidas em 12 meses, recorde até então para o primeiro ano de atividade de uma marca
Storrow pediu-lhe para desenvolver algumas ideias para a indústria automobilística. Diante do interesse de Chrysler, arranjou-lhe um encontro com Charles W. Nash, então presidente da Buick Motor Company, do grupo General Motors, que estava procurando por um chefe de produção. Chrysler deixou seu emprego na ferrovia para se tornar gerente na Buick de Flint, Michigan, mesmo ganhando metade do que recebia na ALCO. Lá, implantou maneiras de reduzir os custos de produção, como evitar usar no chassi o melhor acabamento que a carroceria necessitava.
Em 1916 William Crapo Durant, que havia fundado a General Motors em 1908, recuperou a empresa dos banqueiros para os quais a havia perdido. Chrysler, que era próximo dos banqueiros, pediu demissão a Durant, mas o novo patrão foi de Nova York a Flint para tentar convencê-lo a continuar na Buick, fazendo a oferta de um salário até então inimaginável — US$ 10 mil por mês durante três anos, mais um bônus de US$ 500 mil em ações ao fim de cada ano. Além disso, ele se reportaria diretamente a Durant, sem interferência de mais ninguém.
O B-70 estreava com requintes como marcador de temperatura no painel e
freios hidráulicos; Skelton, Zeder e Breer eram os “três mosqueteiros”
Chrysler aceitou de imediato e passou a dirigir a Buick com sucesso. Não muito depois do fim do contrato, porém, demitia-se por não concordar com os planos de Durant para a General Motors. Ao receber US$ 10 milhões da época por suas ações da GM, Walter tornava-se um dos homens mais ricos do país.
Foi então contratado pelo Chase National Bank para recuperar a Willys-Overland, de Toledo, Ohio, com um salário ainda maior que o que tinha na Buick — US$ 1 milhão por ano. Com o cargo de vice-presidente, lá encontrou os projetistas que passaram a ser chamados de seus “três mosqueteiros”: Frederick “Fred” Morrell Zeder, Owen Ray Skelton e Carl Breer, todos oriundos da Studebaker. Embora interessado em adquirir a companhia e lançar um carro com o nome de Chrysler Six, não teve sucesso e deixou-a em 1921.
No ano seguinte tentava comprar a fábrica de motores aeronáuticos da Duesenberg para produzir automóveis, mas Durant acabou pagando mais e ficou com a unidade. Chrysler não desistiu: em 1923 obtinha o controle da cambaleante Maxwell Motor Company, de Detroit, que havia acabado de se juntar com a Chalmers, da mesma cidade, criando a Maxwell-Chalmers Corporation. Walter levou para lá seu trio de projetistas. Seu primeiro novo carro, com projeto chefiado por eles, teria de ser um sedã de cinco lugares econômico, durável e capaz de superar 100 km/h.
A publicidade em 1924 e 1925 (em cima) explicava em detalhes seus recursos
técnicos; embaixo, anúncios dos modelos 70, 75 e 77, a partir da esquerda
O motor desenvolvido era de seis cilindros em linha e 3,3 litros, com potência de 69 cv e uma alta taxa de compressão (4,7:1) para os padrões da época. Entre suas inovações estavam o marcador de temperatura do motor no painel (até então ele ficava sobre o radiador, onde no novo carro foi instalada uma tampa ornamental) e o motor montado em coxins de borracha para absorver vibrações. Os freios tinham comando hidráulico nas quatro rodas, algo então comum apenas em automóveis de alto preço, e havia filtros de ar e óleo. Os protótipos foram testados por 40.000 quilômetros.
Chamado de Chrysler B-70 ou Six, o pioneiro da nova marca começava a ser fabricado em dezembro de 1923 com nove tipos diferentes de carroceria. O número 70 vinha da velocidade máxima em milhas por hora, equivalente a 112 km/h. No primeiro ano completo de produção, deixaram a empresa 32.000 unidades, um recorde até então para o primeiro ano de atividade de uma marca, conseguido com bastante criatividade — caso do primeiro anúncio comparativo feito no mercado.
Em 6 de janeiro de 1925 a empresa passava a se chamar Chrysler Corporation. Em setembro a Chrysler comprava a American Motor Body Company, para produção das carrocerias. A marca Maxwell durava até o ano seguinte, sendo substituída pelo Chrysler modelo F-58, um carro mais modesto com motor de quatro cilindros, 3,05 litros e 38 cv. No mesmo ano surgia o Imperial E80, com seis cilindros, 4,75 litros e máxima de 130 km/h. Depois vinham o 50 e o Imperial L80, com cilindrada aumentada para 5,1 litros e 112 cv. Um Imperial foi também o primeiro conversível da Chrysler.
Próxima parte |