Em uma via de paralelepípedos ou de terra, é melhor passar bem devagar para não forçar a suspensão ou passar rápido para a suspensão ou outros componentes sofrerem menos?
Luis Kriegger – Campinas, SP
Pergunta válida e, ao mesmo tempo, difícil de responder, uma vez que cada terreno tem características diferentes. Em teoria, caso só exista desnível negativo no piso (ou seja, buracos), podem-se diminuir os esforços nos componentes da suspensão se a roda passar tão rápido a ponto de perder contato com o piso, não havendo tempo para a suspensão fazer “descer” a roda. Passando-se em velocidade bem alta talvez se consiga esse efeito, mas isso torna a condução perigosa, pois se perde o contato do pneu com o piso. Por outro lado, se houver um desnível positivo no piso (um paralelepípedo mais alto que outro, por exemplo), quanto maior a velocidade, maior o impacto aos componentes de suspensão.
É interessante notar que toda suspensão, assim como qualquer objeto, tem uma frequência natural de oscilação (semelhante ao que explicamos na consulta sobre motor “arrastando-se”). Os veículos de passageiros em geral têm frequência natural de oscilação muito parecida, entre 1,1 Hertz (carros focados em conforto) e 1,3 Hz (modelos com suspensões mais esportivas). Lembre que 1 Hz representa um ciclo por segundo. No entanto, a suspensão tem sua frequência natural das partes não suspensas (pneus e rodas, braços de suspensão e tudo o que não está suspenso pelas molas) por volta de 10 Hz, variando um pouco conforme os pneus adotados, sua pressão de enchimento, componentes como braços e a geometria da suspensão.
Essas frequências parecidas são as responsáveis por criar aquelas ondulações repetitivas em estradas de terra, que são “assassinas” de suspensão e até de partes estruturais do veículo (veja foto). Como os veículos trafegam em velocidades semelhantes e têm frequências naturais de massa não suspensa parecidas, as rodas oscilam de forma a aumentar cada vez mais essas imperfeições.
A solução nesse caso é trafegar bem devagar, o que garante menor movimentação da suspensão, ou bem rápido, o que faz as rodas “saltarem” os desníveis negativos. O problema é andar exatamente na velocidade que impõe a frequência natural da suspensão. Há um dizer popular na engenharia de suspensões de que a pior velocidade em uma rua esburacada é 40 km/h, pois condiz com a frequência natural da massa não suspensa, fazendo a suspensão trabalhar o máximo possível. Mas, como dissemos, cada caso é um caso.
Não se pode esquecer que, mesmo quando há apenas desnível negativo, existe o risco de o buraco ser grande o suficiente para a roda ter tempo de “descer”, batendo o pneu com violência na borda do buraco, o que transfere toda a energia de impacto ao próprio pneu e à suspensão. O mesmo vale para um desnível positivo. Além disso, quanto mais rápido se trafega, maior o esforço do amortecedor para segurar o movimento, uma vez que a força de sua atuação é em função da velocidade, não do deslocamento como a mola (explicaremos melhor esse comportamento e as frequências naturais em artigo de suspensão no futuro).
Portanto, quanto mais rápido, mais as buchas de suspensão — sobretudo as que fixam o amortecedor — são obrigadas a absorver os impactos e movimentos da suspensão. Quem nunca passou rápido num desnível e sentiu aquela pancada forte? Não nos referimos ao fim de curso da suspensão, mas a emendas de pontes, degraus quando há reforma na via ou mesmo tachões destinados a redução de velocidade. Nesse caso a compressão da suspensão é tão rápida que o amortecedor se torna quase um objeto rígido, jogando toda a energia para as buchas. Afinal, para deslocar o veículo verticalmente muito rápido, precisa-se de muita força e energia em espaço de tempo curto.
Os sistemas da Land Rover e da Ford detectam buracos e adaptam a suspensão
Apesar da impressão de que andando mais rápido sentem-se menos os buracos ou desníveis, na verdade a suspensão trabalha mais. Ao se passar bem devagar, sente-se o veículo balançar de um lado para outro porque se dá o tempo de movimentar o carro para cima e para baixo, fazendo com que a suspensão trabalhe menos. Enfim, a maneira mais segura — tanto de condução quanto para proteção da suspensão — é trafegar em velocidades baixas.
Se serve de consolo para os brasileiros, buracos existem mundo afora, sobretudo em regiões com inverno rigoroso (neve), o que tem levado os fabricantes a desenvolver soluções para evitar danos à suspensão e amenizar o desconforto. A Land Rover apresentou um dispositivo que, ao detectar buracos na via, adapta o controle magneto-reológico dos amortecedores, registra as coordenadas de GPS do local e transmite a informação a um sistema pela internet, a fim de facilitar às autoridades a localização dos pontos que requerem manutenção. A ideia é que outros carros com o sistema também recebam tal informação ao trafegar pela via, para que o motorista possa se precaver.
Já a Ford acaba de lançar nos Estados Unidos um Fusion com sistema que reconhece buracos e aumenta a carga dos amortecedores, para que a roda não desça e caia no buraco, a fim de proteger o pneu e os componentes da suspensão e trazer maior conforto aos ocupantes. Mesmo com esse dispositivo, porém, a melhor forma de conduzir em ruas esburacadas é em velocidade reduzida, para evitar que o pneu perca contato com o solo.
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: divulgação