Ela não é só a perua mais rápida do mundo: é um supercarro
disfarçado e uma daquelas boas coisas que o dinheiro pode comprar
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: Paulo Keller
Números, números… Eles regem muita coisa em nossa existência — desde o nascimento, quando somos pesados em quilogramas e medidos em centímetros, até resultados profissionais alcançados na vida adulta. É também assim com os automóveis, que podem ser descritos em grande parte pelos números que apresentam: os centímetros cúbicos da cilindrada, os cavalos-vapor da potência, os quilômetros por hora da velocidade máxima, os litros da capacidade de bagagem, os quilogramas do peso e assim por diante.
Por isso, foi pelos números — fantásticos, um mais que o outro — que resolvemos contar como é a nova Audi RS6 Avant, um dos dois carros especiais avaliados para a edição de 17º. aniversário do Best Cars (leia também sobre o BMW M 135i). Mas um grande automóvel não se faz apenas de números: depois de conhecê-la, você saberá como é dirigir um dos modelos familiares mais rápidos da produção mundial.
Grandes tomadas de ar, para-lamas largos para abrigar rodas de 21 pol e
difusor traseiro não deixam dúvidas do caráter “de briga” da RS6
305 km/h são a velocidade máxima da RS6,
como vendida no Brasil, e para atingi-la
o carro ainda não precisa da oitava marcha
Faróis que usam apenas leds para iluminação intensa e amplo ajuste,
um dos recursos dessa superperua, 21 anos depois da pioneira RS2
Desempenho apto a encarar superesportivos, sem abrir mão do espaço de
uma grande perua e do conforto de um Audi: um prazer para poucos
Números como potência, torque, aceleração e velocidade máxima dão
noção de sua capacidade, mas o melhor é conferir como ela se comporta
Próxima parte |
Conheça mais do trabalho de Paulo Keller
Alumínio é usado em partes da carroceria e componentes de suspensão;
o motor V8 com dois turbos obtém 140 cv para cada um dos 4,0 litros
A tração integral opera com divisão de torque variável; nas demais
imagens, caixa automática e freio a disco de carbono-cerâmica
Os discos de freio de carbono-cerâmica têm
durabilidade muito maior e elevada
eficiência, mesmo em condições extremas
é o coeficiente aerodinâmico (Cx) da RS6. Longe de indicar fluidez para o ar, ele reflete outras preocupações, como usar pneus extralargos, reduzir a sustentação em alta velocidade e admitir grande volume de ar para os órgãos mecânicos, o que implicou amplas tomadas no para-choque dianteiro. Por outro lado, a parte inferior do carro conta com amplas carenagens plásticas.
Com e sem a tampa de isolamento térmico, o brilhante motor V8; os
discos enchem as rodas de 21 pol; na última série, diferencial traseiro
esportivo, braços da suspensão posterior e o duplo escapamento
são as memórias de posição do banco do motorista, dotado de ajuste elétrico integral como o do passageiro, incluindo o apoio lombar; apenas a regulagem de apoio de coxas é manual.
zonas de ajuste de temperatura equipam o ar-condicionado da perua, uma para cada ocupante (ela vem configurada para quatro pessoas, sem lugar para um passageiro central no banco traseiro). Há difusores de ar também nas colunas centrais para atender a quem viaja atrás.
Próxima parte |
Desempenho e consumo
A RS6 Avant foi por larga margem o carro mais rápido que já avaliamos, incluindo aqueles que não passaram por medições práticas (até alguns meses atrás usávamos simulações). Arrancou de 0 a 100 km/h em apenas 4,6 segundos, passou pelos 400 metros em 12,2 s (a mais de 180 km/h) e alcançou os 200 km/h em 14,2 s.
Provavelmente teria obtido tempos ainda menores com o assistente eletrônico de largada (launch control), que gerencia a rotação para máxima aceleração com mínima perda de aderência, mas que não nos foi possível ativar. Embora sem ele a rotação de saída fique limitada a 2.500 rpm (o estol da caixa automática), e apesar das quatro “patas” de 285 mm de seção agarrando o solo, a aceleração é tão furiosa que o controle de tração chega a ser ativado por instantes.
Retomadas também são rapidíssimas com essa Audi, capaz de passar de 80 a 150 km/h (note que fizemos medições até velocidades mais altas para esta avaliação especial) em 5,7 segundos. Claro que há um preço a pagar por tanta potência e pelas duas toneladas: o consumo de combustível, que até foi razoável em nossos trajetos-padrão, torna-se obsceno quando se colocam os cavalos para trabalhar de verdade.
Aceleração | |
0 a 80 km/h | 3,1 s |
0 a 100 km/h | 4,6 s |
0 a 120 km/h | 5,5 s |
0 a 150 km/h | 7,5 s |
0 a 180 km/h | 11,5 s |
0 a 200 km/h | 14,2 s |
0 a 400 m | 12,2 s |
Retomada | |
60 a 100 km/h (D) | 3,9 s |
60 a 120 km/h (D) | 5,2 s |
60 a 150 km/h (D) | 7,4 s |
80 a 120 km/h (D) | 3,5 s |
80 a 150 km/h (D) | 5,7 s |
Consumo | |
Trajeto leve em cidade | 7,1 km/l |
Trajeto exigente em cidade | 3,8 km/l |
Trajeto em rodovia | 9,8 km/l |
Autonomia | |
Trajeto leve em cidade | 479 km |
Trajeto exigente em cidade | 257 km |
Trajeto em rodovia | 662 km |
Testes efetuados com gasolina; conheça nossos métodos de medição |
Dados do fabricante
Velocidade máxima | 305 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 3,9 s |
Consumo em cidade | ND |
Consumo em rodovia | ND |
ND = não disponível |
Próxima parte |
No interior luxuoso, embora de aspecto sóbrio, destaque para os bancos
de forma e densidade ideais com revestimento em camurça sintética
pixels: resolução da projeção de informações no para-brisa (head-up display) que equipa a RS6. Um sistema de espelhos faz aparecer diante do motorista, à altura da via e com a sensação de distância entre 2 e 2,5 metros de seus olhos, informações como velocidade do momento, aquela memorizada no controlador e instruções de navegação.
A tela retrátil do painel serve para áudio (com disco para armazenamento),
ajustes do Drive Select, navegação e configurações, além de informar
pressão e temperatura dos pneus; no quadro, mostrador de tempo de volta
De pureza excepcional, o sistema de áudio
Bang & Olufsen inclui disco rígido e os
tweeters do painel se retraem ao desligá-lo
Os modos Comfort e Dynamic são autoexplicativos. Auto faz ajustes automáticos de acordo com a forma de direção; Individual permite configurar as funções em separado (entre Comfort, Auto e Dynamic), divididas em grupos: motor/câmbio, suspensão, direção, diferencial traseiro esportivo e som do motor.
Instrumentos com farta informação, central de comandos no console,
logotipo no câmbio, ar-condicionado com quatro zonas e difusores
nas colunas, memórias do banco, ajuste nas coxas, alto-falante retrátil
Com o Drive Select em modo Comfort a RS6 passaria por qualquer Audi de
luxo, com rodar macio, baixo ruído e fácil modulação do acelerador
Devoradora de asfalto: ela acelerou de 0 a 200 km/h em 14,2 segundos e
poderia chegar a 305 km/h, conforme o limitador adotado no Brasil
Ao volante
Números contam muito sobre o que faz da RS6 Avant um carro tão especial e desejado, mas o que realmente conquista quem a dirige é a forma como cada ingrediente foi temperado e combinado aos demais.
Ameaçadora por fora, com suas grandes tomadas de ar, rodas enormes com pneus extralargos e para-lamas bastante alargados para encobri-los, a grande perua é sóbria e refinada por dentro. Qualquer que seja a cor externa — são nove as disponíveis no Brasil, incluindo as atraentes azul Estoril e vermelho Misano, esta a do carro avaliado —, o interior vem sempre em preto, incluindo o forro de teto, e com apliques no padrão fibra de carbono.
Os bancos, excelentes, são firmes e de conformação exata para manter o corpo apoiado nas curvas e descansado em longos trajetos, sem causar desconforto pelas laterais muito duras ou pronunciadas; suas amplas regulagens garantem posição adequada a motoristas de qualquer biótipo. O revestimento em camurça sintética, de nome comercial Alcantara, combina com o ambiente esportivo e mostra-se mais agradável que o couro em um clima como o nosso.
Próxima parte |
É hora de diversão: ajustada para Dynamic, a RS6 ronca forte, acelera
muito e provoca o motorista a procurar o altíssimo limite nas curvas
Já o volante passou de Alcantara para couro, talvez para evitar o mau aspecto que a camurça adquire com o tempo nessa região de atrito com as mãos. Seus ajustes elétricos permitiram à fábrica configurar que se eleve para facilitar a entrada e a saída do motorista. O acabamento demonstra qualidade e execução cuidadosa em todos os itens. Como se espera de um carro com suas dimensões, o espaço no banco traseiro é farto para dois adultos de qualquer estatura, com vão para as pernas dos maiores já vistos.
Ao dar partida, o V8 acorda com um rugido que deixa claro aos presentes a estirpe do que há debaixo do capô — as borboletas das saídas de escapamento ficam abertas por alguns segundos para garantir a demonstração. Com o Drive Select ajustado em Comfort, a RS6 prova-se tão suave e fácil de dirigir quanto qualquer Audi de luxo: a suspensão roda macio (a absorção de impactos é melhor que a esperada pela medida dos pneus), o acelerador não pega ninguém de surpresa, as trocas de marcha são feitas até abaixo de 2.000 rpm e mal se ouve o escapamento. Em qualquer faixa de giros o funcionamento do motor é limpo, isento de vibrações.
Mas você não a compraria para usá-la assim, como uma A6 Avant comum, certo? Altere o seletor para Dynamic e, como um Clark Kent que corre à cabine telefônica e sai dali voando como o Super-Homem, a RS6 se transforma. O acelerador torna-se rápido, a direção ganha peso — até excessivo em baixa velocidade, mas perfeito para andar muito rápido —, os amortecedores agora “copiam” cada oscilação do piso. As mudanças de marcha ocorrem em giros mais altos e, acima de tudo, o som de motor passa a empolgar.
Embora a atuação automática da caixa seja impecável, o grande prazer é
comandar as trocas e ouvir o som rasgado que o escapamento produz
Empolgação chega a ser um termo fraco para o que ele causa até no mais pacato motorista. Em uma “esticada” de marchas, enquanto o baixo relevo do logotipo RS6 do encosto do banco começa a ser impresso nas costas, o V8 emite um ronco encorpado, com direito a um frep!!! a cada mudança de marcha e, com o câmbio em modo manual, um tré-tré-tré-tré ao chegar ao limite de giros. Logo você se vê induzido a comportamentos pouco sociáveis, como chegar a 6.700 rpm em primeira no quarteirão de casa enquanto os vizinhos gostariam de estar dormindo.
Altere o seletor para Dynamic e, como um
Clark Kent que sai da cabine telefônica
como o Super-Homem, a RS6 se transforma
Melhor guardar esse arsenal para usufruir em uma boa rodovia. Se estiver em um dos (cada vez mais raros) trechos de Autobahn sem limite de velocidade em seu país natal, a RS6 pode cruzar a bem mais de 200 km/h sem sobressaltos, com perfeita estabilidade direcional e a sensação de poder passar o dia nesse ritmo sem cansar o motorista. A caixa automática, irrepreensível em seu funcionamento, chega a lembrar a automatizada de dupla embreagem S-Tronic da mesma Audi pelas trocas rapidíssimas.
O modo Dynamic inclui ajuste do diferencial esportivo, que deixa a traseira “alegre” nas saídas de curva. Exagere no entusiasmo com o pé direito e os 285 mm de seção dos PZeros tornam-se pouco para a potência despejada nas rodas de trás — epa, aquela traseira ali é minha! Com o controle eletrônico de estabilidade em modo normal as coisas logo se colocam nos eixos, mas antes de passar ao programa esportivo é bom reservar direitos de uso da faixa ao lado ou do acostamento. Como fica com o controle desativado? Deixamos a tarefa de descobrir para quando tivermos um circuito à disposição, o que não era o caso na avaliação.
São R$ 557.100 para colocar essa Audi na garagem, mas as sensações
ao acelerá-la deixam uma grande vontade de acertar na Mega-Sena
Embora desconfortável para o dia a dia pela suspensão muito firme, o Dynamic é o programa ideal para encarar uma estrada de montanha com “a faca entre os dentes”, com a garantia de alto regime de spm (sorrisos por minuto). Com a devida moderação no pé direito nas saídas, seu comportamento em curva revela atitude praticamente neutra, apesar do maior peso no eixo dianteiro, e deixa a sensação de que jamais se encontrará o limite de aderência dos pneus — até que uma espiada na projeção de velocidade no para-brisa revela estar-se, sem perceber, 40 ou 50 km/h acima do ritmo imaginado.
Felizmente, capacidade de frenagem é o que não falta a essa perua endiabrada. Os imensos discos de cerâmica dissipam velocidade com uma rapidez desconcertante para um carro de duas toneladas, mesmo quando se anda a patamares típicos de Alemanha, como constatamos de forma repetida ao fim de cada prova de aceleração em nossa pista. Se havia receio de algum efeito colateral do uso desses discos, ele se esvaiu: têm fácil modulação (apesar da forte pegada inicial, bem-vinda em um carro tão rápido) e não emitem ruídos a frio ou a quente.
Deixamos para o fim o menos empolgante dos fantásticos números que cercam a Audi RS6 Avant: 557.100 — seu preço em reais, o segundo mais alto da série RS no Brasil, superado apenas pelos R$ 589.360 do RS7 Sportback. Para os privilegiados que puderem bancá-lo, o prazer de acelerá-la vale cada centavo. Para os que não puderem, recomendamos distância: depois que ela se for, superar a saudade não será nada fácil.
Mais Avaliações |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | longitudinal |
Cilindros | 8 em V a 90° |
Material do bloco/cabeçotes | alumínio |
Comando de válvulas | duplo nos cabeçotes |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 84,5 x 89 mm |
Cilindrada | 3.993 cm³ |
Taxa de compressão | 9,3:1 |
Alimentação | injeção direta, 2 turbocompressores, resfriador de ar |
Potência máxima | 560 cv de 5.700 a 6.600 rpm |
Torque máximo | 71,4 m.kgf de 1.750 a 5.500 rpm |
Potência específica | 140,2 cv/l |
Transmissão | |
Tipo de câmbio e marchas | automático / 8 |
Relação e velocidade por 1.000 rpm | |
1ª. | 4,71 / 9 km/h |
2ª. | 3,14 / 14 km/h |
3ª. | 2,11 / 20 km/h |
4ª. | 1,67 / 26 km/h |
5ª. | 1,29 / 33 km/h |
6ª. | 1,00 / 43 km/h |
7ª. | 0,84 / 51 km/h |
8ª. | 0,67 / 64 km/h |
Relação de diferencial | 3,08 |
Regime a 120 km/h | 1.850 rpm (8ª.) |
Regime à vel. máxima informada | 5.950 rpm (7ª.) |
Tração | integral permanente |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado de carbono-cerâmica (420 mm ø) |
Traseiros | a disco ventilado (ø ND) |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Diâmetro de giro | 11,9 m |
Suspensão | |
Dianteira | independente, braços sobrepostos, mola pneumática |
Traseira | independente multibraço, mola pneumática |
Estabilizador(es) | dianteiro e traseiro |
Rodas | |
Dimensões | 9,5 x 21 pol |
Pneus | 285/30 R 21 Y |
Dimensões | |
Comprimento | 4,979 m |
Largura | 1,936 m |
Altura | 1,461 m |
Entre-eixos | 2,915 m |
Bitola dianteira | 1,662 m |
Bitola traseira | 1,663 m |
Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,352 |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 75 l |
Compartimento de bagagem (normal/banco rebatido) | 565 l / 1.680 l |
Peso em ordem de marcha | 1.950 kg |
Relação peso-potência | 3,5 kg/cv |
Garantia | |
Prazo | 2 anos sem limite de quilometragem |
Carro avaliado | |
Ano-modelo | 2014 |
Pneus | Pirelli PZero |
Quilometragem inicial | 19.000 km |
Dados do fabricante; ND = não disponível |