
Grande sedã de R$ 225 mil esbanja conforto e detalhes de conveniência; desempenho com motor V6 satisfaz
Texto e fotos: Fabrício Samahá
Os carros norte-americanos ficaram associados na mente de muitos brasileiros a dimensões exageradas, motores generosos e rodar macio até demais. Bons representantes dessa categoria foram produzidos aqui da década de 1960 ao começo da de 1980, a linha Galaxie/Landau da Ford e a série de modelos com motor V8 da Dodge. Com o tempo as marcas europeias tomaram conta do mercado de sedãs grandes e luxuosos (no qual as japonesas e sul-coreanas são coadjuvantes) e, depois da extinção do Chevrolet Omega australiano, o Chrysler 300C restou como único representante da espécie.
Importado de Brampton, Ontário, no Canadá, o 300C vem ao Brasil em versão única com motor V6 de 3,6 litros ao preço sugerido de R$ 224.900 (mais frete). Os itens de série abrangem ar-condicionado automático de duas zonas, bancos de couro, bancos dianteiros com ajuste elétrico (memória para o do motorista) e ventilação, bolsas infláveis laterais dianteiras, de cortina e para os joelhos do motorista; câmera traseira de manobras, chave presencial para acesso e partida, controle eletrônico de estabilidade e tração, faróis de xenônio, rodas de alumínio de 20 polegadas, sensores de estacionamento à frente e atrás e teto solar panorâmico. O sistema de áudio UConnect tem tela sensível ao toque de 8,4 pol, nove alto-falantes mais um para subgraves, amplificador de 12 canais com 506 watts, navegador e comandos por voz.
Imponência é com ele mesmo, das formas retilíneas à ampla grade e às lanternas em sutis “rabos de peixe”; as rodas para o Brasil são de 20 pol
O 300 (modelo do qual o 300C é apenas uma versão) foi lançado em 2004 nos Estados Unidos como representante moderno da “série letra”, carros grandes fabricados de 1955 a 1965 com as designações C-300 a 300L, e sucessor do 300M feito entre 1998 e 2004. Ao contrário do “M”, porém, ele adotou tração traseira e motor V8 em uma plataforma que aproveitava componentes do Mercedes-Benz Classe E, pois as empresas estavam associadas na Daimler Chrysler. A segunda geração aparecia em 2011, com nova carroceria sobre a mesma arquitetura, e chegava ao Brasil no ano seguinte apenas com motor V6 (o V8 foi oferecido como opção na primeira).
Tradição: pinos de trava nas portas, freio de estacionamento acionado por pedal, comando do limpador de para-brisa à esquerda da coluna de direção
A aparência do 300C impressiona, tanto pelas dimensões incomuns no cenário urbano nacional — 5,04 metros de comprimento, 1,90 m de largura, 3,05 m de distância entre eixos — quanto pelas formas imponentes, que incluem ampla grade (aumentada em 2015), alta linha de cintura e lanternas traseiras verticais montadas em uma versão bastante sutil dos “rabos de peixe” do passado. O pacote para o Brasil inclui rodas de 20 pol com acabamento usinado, que nos EUA equipam apenas a versão de topo Platinum — as demais usam entre 17 e 19 pol.
O ambiente interno é discreto e de bom gosto, com apliques em padrão madeira no console, painel e parte do volante, mas alguns plásticos não têm aspecto refinado como deveriam. Os bancos amplos são macios e confortáveis, embora falte apoio lateral nas curvas, e o motorista dispõe de amplas regulagens elétricas para banco, volante e até os pedais, este um recurso incomum. No novo quadro de instrumentos iluminado em tom azul destaca-se a tela central configurável com informações como velocidade, pressão dos pneus e do óleo lubrificante, tensão da bateria, vida útil do óleo e temperaturas dos óleos do motor e da transmissão.
Mais de 5 metros de comprimento e 3 m entre eixos fazem do 300C um dos maiores sedãs do mercado; faróis são de xenônio; porta-malas leva 500 litros
A grande tela do centro do painel serve aos sistemas de áudio (de excelente qualidade e graves bem presentes), navegação, telefone, câmera traseira de manobras, ajustes de ar-condicionado e para comandar funções como os aquecimentos de bancos e volante, ventilação nos bancos (ótima medida para o calor tropical) e a tela elétrica contra sol no vidro traseiro. No console central agora vem um comando giratório seletor da transmissão, como em modelos Jaguar e Land Rover, que funciona bem. Os porta-copos podem gelar a bebida ou mantê-la quente, um mimo inesperado.
O primeiro 300C chamava atenção pelo perfil muito baixo das janelas, mas ao rodar no modelo atual não se nota nada diferente nesse aspecto, sinal de que nos acostumamos a vidros laterais que mais parecem escotilhas. A tradição norte-americana está nos pinos de trava nas portas, no freio de estacionamento acionado por pedal e no comando do limpador de para-brisa à esquerda da coluna de direção. Embora as luzes de posição nos cantos dos para-choques sejam típicas dos EUA, as demais especificações seguem as europeias, como retrovisor esquerdo convexo, luzes de direção em tom âmbar, luz traseira de neblina — e a falta de faixa degradê no para-brisa.
Bons itens incluem faróis bem eficientes com lâmpadas de xenônio para ambos os fachos, recuo do banco do motorista para facilitar entrada e saída, ajuste lombar elétrico para ambos os dianteiros, para-sóis com extensor para proteger do Sol pelas laterais, amplo espaço para objetos, três entradas USB (duas para os passageiros de trás), auxiliar e para cartão SD, alerta específico de qual porta está mal fechada, forro elétrico no teto solar, fixações Isofix para cadeiras infantis, lavador dos faróis, mola a gás para sustentar o capô e vidros traseiros que descem por inteiro.
Interior sóbrio, mas plásticos podem melhorar; instrumentos iluminados em azul; ótimo espaço longitudinal e transversal, nem tanto em altura atrás
O que poderia melhorar: o áudio não liga sem a ignição, seus comandos atrás do volante confundem os não iniciados em Chrysler, as portas tendem a fechar em subidas se não forem abertas até o fim e faltam porta-luvas refrigerado (embora os porta-copos supram a falta em parte), função um-toque no controle elétrico de vidros traseiros, alarme volumétrico e limitador de velocidade ou alerta para seu excesso.
O espaço lateral e para pernas dentro do 300C é tão amplo quanto suas dimensões fazem esperar. Contudo, no banco traseiro a altura útil é apenas boa (passageiros acima de 1,80 metro ficam com a cabeça junto ao teto) e o lugar do passageiro central chega a ser inviável. A capacidade de bagagem (500 litros) é ótima, ajudada pelo uso de estepe temporário, ao custo de não caber o enorme pneu furado em seu alojamento após a troca. A bateria está no mesmo compartimento. Os braços da tampa roubam espaço, mas são guardados em locais reservados; há divisão em 60:40 no encosto traseiro rebatível.
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Desempenho e consumo
O peso acima de 1,8 tonelada tira parte do brilho, mas o 300C ainda revelou bons dotes de desempenho em nossas medições, como ao acelerar de 0 a 100 km/h em 8,2 segundos, chegar aos 160 em 19 s e passar de 80 a 120 km/h em 7,6 s. É interessante notar que, embora com 84 cv a menos, ele retoma velocidade quase tão bem quanto o Jaguar XF S de 380 cv, que fez o mesmo 80-120 em 6,8 s. O inglês, porém, “despacha” o canadense nas arrancadas, como ao passar de 0 a 100 em 5,9 s. Ambos têm tração traseira e caixa automática de oito marchas, que no Chrysler efetua mudanças a no máximo 6.500 rpm.
Fato curioso: a transmissão é tão longa que o 300C usaria a quinta para alcançar a velocidade máxima informada de 240 km/h, ainda assim 500 rpm aquém do pico de potência. Se pudesse atingi-la em oitava, estaria descansando pouco acima de 3.000 rpm. Vale observar que usar a posição L da caixa não afeta as acelerações ou retomadas: muda apenas a marcha em uso com carga (abertura de acelerador) parcial ou desaceleração.
O consumo do Chrysler também ficou bem próximo ao do Jaguar (não são concorrentes em preço, mas a comparação é válida pelas características físicas). Marcas como 9,7 km/l no trajeto rodoviário indicam que, sem ser econômico, o grande sedã pode ter efeitos moderados no bolso se dirigido com certa parcimônia, seguindo o tráfego. E a autonomia é muito boa, mérito do tanque de 70 litros.
Aceleração | |
0 a 100 km/h | 8,2 s |
0 a 120 km/h | 10,9 s |
0 a 160 km/h | 19,0 s |
0 a 400 m | 16,1 s |
Retomada | |
60 a 100 km/h* | 5,7 s |
60 a 120 km/h* | 8,9 s |
80 a 120 km/h* | 7,6 s |
Consumo | |
Trajeto leve em cidade | 8,5 km/l |
Trajeto exigente em cidade | 4,2 km/l |
Trajeto em rodovia | 9,7 km/l |
Autonomia | |
Trajeto leve em cidade | 536 km |
Trajeto exigente em cidade | 265 km |
Trajeto em rodovia | 611 km |
Testes efetuados com gasolina; conheça nossos métodos de medição |
Dados do fabricante
Velocidade máxima | 240 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 7,9 s |
Consumo em cidade | 7,1 km/l |
Consumo em rodovia | 10,1 km/l |
Consumo conforme padrões do Inmetro |
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Muitas informações no quadro central e funções na tela de 8,4 pol; teto solar panorâmico; porta-copos aquece e esfria; memórias para o banco; volante com ajuste elétrico; tela contra sol; para-sol com extensor; aquecimento e USB para o banco traseiro
Bom V6, suspensão macia
Adotado na segunda geração do 300C, o motor Pentastar V6 é amplamente conhecido na linha Chrysler (saiba mais sobre técnica no quadro abaixo) e fornece bons valores de potência, 296 cv, e torque, 36 m.kgf. O que está fora do padrão mais recente, em que o turbocompressor toma conta do segmento de luxo, é o alto regime do pico de torque: 4.800 rpm. Mesmo com esse fator e os imponentes 1.828 kg de peso, o grande sedã mostra vitalidade desde baixas rotações. O 3,6-litros é macio como seda e produz muito pouco ruído em uso moderado, embora emita leve ronco ao se acelerar a pleno.
A transmissão automática Torqueflite de oito marchas é impecável em suavidade e responde bem ao que o motorista pede via acelerador. Talvez o faça mais do que precisaria: ao acelerar bastante a 100 km/h, por exemplo, a caixa reduz de oitava para quarta e subidas médias em rodovia trazem facilmente para sexta para manter 120, até porque o regime em oitava a tal velocidade é baixíssimo (1.550 rpm). Mas a proximidade entre as relações faz com que mal se perceba a sucessão de mudanças.
Motor V6 muito suave produz boas acelerações, limitadas pela 1,8 tonelada de peso; caixa de oito marchas tem posição L, mas não seleção manual
Estranha-se a ausência de seleção manual de marchas: segundo o fabricante, era pouco usada pelos compradores da primeira geração, que oferecia o sistema Autostick. O único recurso é a posição L (low, baixa) no seletor, que faz o motor operar em regimes mais altos e provoca sucessivas reduções quando se desacelera para aumentar o freio-motor, útil em descidas. Tradicional entre os norte-americanos, o L não impede que a caixa mude de marcha para cima, limitação que tornava tal posição quase inútil no primeiro modelo do Ford Fusion vendido aqui.
A suspensão do 300C foi calibrada com o conforto como prioridade, embora menos que no antigo padrão “náutico” norte-americano
A tração traseira certamente representa peso adicional ao 300C, mas traz dividendos como boa distribuição de massas (52% sobre o eixo dianteiro), grande esterçamento de rodas (faz retorno em espaço claramente menor que, por exemplo, o atual Fusion) e ausência de efeitos da aplicação de torque sobre a direção. Nas provas de aceleração foi simples transmitir toda a potência ao solo pelos largos pneus de 245 mm, sem patinação, e obter tempos como 8,2 segundos de 0 a 100 km/h. As retomadas são muito boas e o consumo razoável (veja números na página anterior).
Com suspensões modernas, o grande Chrysler foi calibrado com o conforto como prioridade: molas e amortecedores são suaves, embora menos que no antigo padrão “náutico” norte-americano. Dentro dessa proposta, duas ressalvas: poderia ser melhor a absorção de pequenas irregularidades, como juntas de dilatação de pontes e remendos do asfalto, para o que concorrem os pneus largos, e a nova assistência elétrica da direção nem deixa o volante tão leve em manobras nem tão preciso em alta quanto se gostaria, sinal de que algum trabalho a mais de calibração deve ser feito.
O 300C tem bom conteúdo e preço atraente em relação aos alemães de prestígio, mas nem tanto diante de outros amplos sedãs de marcas generalistas
Os grandes discos de freio dissipam velocidade com eficácia, a estabilidade direcional é ótima e a atitude em curvas indica correto posicionamento das rodas, com pouca tendência ao subesterço. Contudo, os amortecedores macios permitem mais movimentos de carroceria do que o ideal. Curiosamente, ao procurar o limite em curvas, percebe-se que a traseira sai ao cortar o acelerador (o que não é comum em modelos de tração traseira) até que o controle eletrônico de estabilidade intervenha — não seria difícil imitar a clássica “traseirada” dos carros policiais norte-americanos em perseguições no cinema. Embora exista um modo mais permissivo de tal controle, o programa básico não intervém em demasia.
Na combinação de nossos quatro “Ps” — proposta de uso, porte, potência e preço —, o 300C parece uma grande opção diante dos bem mais caros similares alemães Audi A6 (4,93 m, 2,0 litros, turbo, 252 cv, R$ 283 mil), BMW 535i (4,90 m, 3,0 litros, turbo, 306 cv, R$ 338.950) e Mercedes-Benz E400 Avantgarde Sport (4,88 m, 3,0 litros, turbo, 333 cv, R$ 340.900). Seu valor está mais próximo ao de modelos menores das três marcas, Audi A4, BMW Série 3, Mercedes Classe C.
No entanto, outras marcas tão generalistas quanto a Chrysler oferecem modelos próximos em três dos “P” por valores menores, como Honda Accord (4,91 m, 3,5 litros, 280 cv, R$ 160.100) e Hyundai Azera (4,92 m, 3,0 litros, 250 cv, R$ 180.840), sem falar no menos potente Ford Fusion Titanium (4,87 m, 2,0 litros, turbo, 234 cv, R$ 129.400 sem tração integral). Podem não ter as linhas imponentes e a tração traseira do 300C, mas também são boas formas de desfrutar o jeito norte-americano de viajar.
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Comentário técnico
• O motor Pentastar (nome alusivo ao tradicional emblema da Chrysler, a estrela de cinco pontas) V6 não usa turbocompressor ou injeção direta, como tem sido tendência, mas é feito de alumínio e traz duplo comando com acionamento por corrente e variação do tempo de abertura das válvulas.
• A transmissão de oito marchas é a conhecida ZF, em amplo uso por marcas como BMW e Jaguar ou mesmo pela Volkswagen Amarok, só que neste caso com outras relações de marcha e caixa de transferência (reduzida). O 300C, porém, abre mão da seleção manual de marchas. As relações finais (considerados diferencial e pneus) são das mais longas já vistas em carros a gasolina, a ponto de 120 km/h serem mantidos com apenas 1.550 rpm em oitava.
• A opção por formas retilíneas, que transmitem robustez, não fez do 300C um carro muito aerodinâmico: o Cx é 0,32, um pouco alto para um carro tão longo, o que em tese favoreceria o índice.
Ficha técnica
Motor | |
Posição | longitudinal |
Cilindros | 6 em V a 60° |
Material do bloco/cabeçote | alumínio |
Comando de válvulas | duplo nos cabeçotes |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 96 x 83 mm |
Cilindrada | 3.604 cm³ |
Taxa de compressão | 10,2:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima | 296 cv a 6.350 rpm |
Torque máximo | 36,0 m.kgf a 4.800 rpm |
Potência específica | 82,1 cv/l |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | automática / 8 |
Relação e velocidade por 1.000 rpm | |
1ª. | 4,71 / 11 km/h |
2ª. | 3,14 / 17 km/h |
3ª. | 2,11 / 25 km/h |
4ª. | 1,67 / 31 km/h |
5ª. | 1,28 / 41 km/h |
6ª. | 1,00 / 52 km/h |
7ª. | 0,84 / 62 km/h |
8ª. | 0,67 / 78 km/h |
Relação de diferencial | 2,62 |
Regime a 120 km/h | 1.550 rpm (8ª.) |
Regime à vel. máx. informada | 5.850 rpm (5ª.) |
Tração | traseira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado (320 mm ø) |
Traseiros | a disco (320 mm ø) |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | eletro-hidráulica |
Diâmetro de giro | 11,9 m |
Suspensão | |
Dianteira | independente, braços sobrepostos, mola helicoidal |
Traseira | independente, multibraço, mola helicoidal |
Estabilizador(es) | dianteiro e traseiro |
Rodas | |
Dimensões | 8 x 20 pol |
Pneus | 245/45 R 20 Y |
Dimensões | |
Comprimento | 5,044 m |
Largura | 1,902 m |
Altura | 1,492 m |
Entre-eixos | 3,052 m |
Bitola dianteira | 1,611 m |
Bitola traseira | 1,62 m |
Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,32 |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 70 l |
Compartimento de bagagem | 500 l |
Peso em ordem de marcha | 1.828 kg |
Relação peso-potência | 6,2 kg/cv |
Garantia | |
Prazo | 3 anos sem limite de quilometragem |
Carro avaliado | |
Ano-modelo | 2015 |
Pneus | Goodyear Eagle F1 Supercar |
Quilometragem inicial | 4.000 km |
Dados do fabricante |