
Motor de três cilindros do Up renova um dos carros pequenos mais antigos do mercado, mas falta vivacidade
Texto e fotos: Fabrício Samahá
Existe data de validade para o projeto de um automóvel? A história diria que não, com exemplos de enorme longevidade de modelos como o Volkswagen, o Citroën 2CV e o Mini inglês, projetados nas décadas de 1930, 1940 e 1950 (na ordem) e cuja produção alcançou os anos 90 (nos casos de VW e Mini, até virou o século). Embora hoje os requisitos sejam mais severos, ainda é possível manter um carro no mercado por mais de 10 anos sem acarretar sua obsolescência.
É o caso do Fox, lançado em 2003 pela Volkswagen como alternativa entre o Gol da época (de segunda geração) e o Polo. Há anos o modelo posiciona-se entre os 10 ou mesmo cinco carros mais vendidos do Brasil, apesar de seu envelhecimento diante de concorrentes lançados na atual década como Chevrolet Onix, Ford Ka e Fiesta, Hyundai HB20 e Nissan March. A nosso ver, essa competitividade apoia-se em dois fatores: um bom projeto original e aprimoramentos que o mantiveram atual.
A mais recente novidade da linha Fox é a versão Track, lançada em outubro na linha 2016, que combina o motor de três cilindros e 1,0 litro (de início restrito à versão Blue Motion, mas hoje padrão no modelo nessa cilindrada) a um visual com alguma pretensão “aventureira”, sem chegar a ser um Crossfox.
Grade, molduras e defletor pretos, rodas de alumínio de 15 pol: detalhes do Track
O preço básico de R$ 46.950 inclui equipamentos de série como ar-condicionado, banco do motorista com ajuste de altura, controle elétrico de vidros dianteiros e travas, direção com assistência elétrica, faróis e luz traseira de neblina, para-sóis com espelhos iluminados, retrovisores externos com luzes de direção, rodas de alumínio de 15 polegadas, sistema de áudio com MP3 e entradas USB, SD e auxiliar e volante com ajuste de altura e distância. Bolsas infláveis são apenas as frontais.
O três-cilindros suave e silencioso permite explorar toda a faixa de rotações sem aparentar esforço, com agradável som de escapamento
O carro avaliado trazia os pacotes opcionais Conforto Completo II (ajuste elétrico dos retrovisores, alarme com comando remoto, luzes de leitura, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros, entre outros), Funcional II (banco traseiro corrediço com três encostos de cabeça) e Tecnológico com sistema Discover Media (áudio com navegador, computador de bordo, retrovisor interno fotocrômico, faróis e limpador de para-brisa automáticos, volante de couro com comandos), este o superior entre os três aparelhos oferecidos. Com tudo isso, custava R$ 55.190 sem pinturas especiais. Muito para um carro de 1,0 litro? Sem dúvida, mas não seria diferente com os principais competidores quando equipados da mesma forma.
Embora não seja novidade na linha VW, pois já equipava o Up e o Fox Blue Motion (agora está também em Gol e Voyage), o motor EA-211 de quatro válvulas por cilindro trouxe ganhos importantes ao Fox. É um projeto bastante moderno (saiba mais sobre técnica) e com bons índices de potência e torque para sua cilindrada: 75 cv e 9,7 m.kgf com gasolina, 82 cv e 10,4 m.kgf com álcool. O antigo quatro-cilindros de duas válvulas por cilindro fornecia 72 e 76 cv, na ordem, embora com maior torque com álcool (10,6 m.kgf; com gasolina, os mesmos 9,7 m.kgf) em regime mais alto (3.850 em vez de 3.000 rpm).
No interior simples, a atração é o sistema mais avançado de áudio Discover Media, com navegador, tela tátil de 6,3 pol e uso de aplicativos do telefone
Como motores não se resumem a números, o melhor é ver como o três-cilindros opera no Fox Track. Seu funcionamento suave e silencioso permite explorar toda a faixa de rotações sem aparentar esforço, seja ao acelerar mais fundo com o agradável som de escapamento, seja viajando a 120 km/h em quinta marcha a 3.900 rpm. A inerente oscilação do motor de cilindros ímpares, tão percebida no Ford Ka em qualquer rotação, só se manifesta no Fox em marcha-lenta: parece estar baixa, como nos tempos do carburador desregulado. Nada que incomode.
Nossa avaliação com o Blue Motion em 2013 havia deixado boa surpresa com o desempenho geral do Fox. Embora o motor seja o mesmo (e estivesse com álcool dessa vez, ante gasolina daquela oportunidade), o Track tem as desvantagens de usar rodas de 15 polegadas com pneus 195/55, contra 14 pol e 175/70 da versão focada em economia, e de pesar 91 kg a mais que ela. Acredite, faz uma boa diferença: relação peso-potência pouco favorável e pneus excessivos para seu porte impõem dificuldade adicional a dar aceleração ao carro, que ficou longe de agradar.
Precisa de números? Vamos a eles: ao levar 16,5 segundos para passar de 0 a 100 km/h, o Track foi mais lento que Ford Ka SEL e Move Up e pouco mais rápido que o Nissan March SV, todos com motor de 1,0 litro e três cilindros. Também mostrou preguiça nas retomadas: com sonolentos 27,5 s para ir de 60 a 120 km/h, perdeu para os três modelos citados. Embora o Fox tenha sido mais convincente pela economia, os índices obtidos ainda ficam atrás dos mostrados por Up, Ka e March (veja os números e a análise abaixo).
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Desempenho e consumo
Com relação peso-potência e aerodinâmica (Cx e área frontal) desfavoráveis, o Fox Track foi um dos dois carros de menor desempenho entre os que passaram, nos últimos dois anos, pelas medições do Best Cars. Resultados como aceleração de 0 a 100 km/h em 16,5 segundos e retomada de 60 a 120 km/h em quarta em 27,5 s são bastante piores que os do Ka de 1,0 litro, que fez as provas em 14,4 e 24,2 s, na ordem. O “irmão” Up em versão Move (de pneus mais estreitos) é ainda mais rápido: 13,5 e 22,3 s nas mesmas tarefas. Apenas o March de mesma cilindrada perdeu para o Fox em algumas provas (fez em 17,1 e 25,4 s).
O Track foi prejudicado ainda pela terceira marcha incapaz de atingir 120 km/h reais, mesmo caso do Up e do March. O Ka pode alcançar tal velocidade, de modo a cumprir o 60-120 em 16,4 s. É verdade que isso não faz diferença no uso prático, mas regras de medição são regras de medição.
O Fox obteve melhor resultado em consumo, mas não muito. As marcas obtidas ainda não alcançam as do Ka (12,9, 6,4 e 9,8 km/l na ordem de trajetos abaixo) ou as do March (12,4, 7,0 e 9,8 km/l) e ficam distantes das obtidas pelo Up (14,3, 7,1 e 11,2 km/l).
| Aceleração | |
| 0 a 100 km/h | 16,5 s |
| 0 a 120 km/h | 25,9 s |
| 0 a 400 m | 20,1 s |
| Retomada | |
| 60 a 100 km/h (3ª.) | 11,2 s |
| 60 a 100 km/h (4ª.) | 15,8 s |
| 60 a 120 km/h (3ª.) | NA |
| 60 a 120 km/h (4ª.) | 27,5 s |
| 80 a 120 km/h (4ª.) | 19,7 s |
| 80 a 120 km/h (5ª.) | 29,6 s |
| Consumo | |
| Trajeto leve em cidade | 11,4 km/l |
| Trajeto exigente em cidade | 6,3 km/l |
| Trajeto em rodovia | 9,0 km/l |
| Autonomia | |
| Trajeto leve em cidade | 513 km |
| Trajeto exigente em cidade | 284 km |
| Trajeto em rodovia | 405 km |
| Testes efetuados com álcool; NA = não aplicável; conheça nossos métodos de medição | |
Dados do fabricante
| Velocidade máxima | 158/159 km/h |
| Aceleração de 0 a 100 km/h | 14,7/14,4 s |
| Consumo em cidade | ND |
| Consumo em rodovia | ND |
| Gasolina/álcool; ND = não disponível | |
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Espaço vertical e para pernas, com o banco traseiro corrediço, são destaques do Fox
O Fox sempre nos agradou pelo ótimo comando da caixa de transmissão manual, mas incomodou pela firmeza excessiva da suspensão, que sacrificava o conforto para manter boa estabilidade de sua carroceria estreita e alta. Nesse aspecto a VW trabalhou bem através dos tempos, pois o Track — que mantém os pneus e a calibração das outras versões de 1,0 litro — revela um rodar aceitável, firme sem excessos, e ainda transmite segurança em curvas. É fato que a absorção de irregularidades melhoraria com pneus de perfil mais alto, mas é difícil convencer o consumidor menos esclarecido a abrir mão do visual agradável de um carro com rodas maiores.
Sistema de áudio espelha celular
Além do motor, o Fox 2016 traz a novidade dos sistemas de áudio com conexões mais elaboradas a telefones celular. O aparelho de topo Discover Media tem tela sensível ao toque de 6,3 polegadas com sensor de aproximação (mostra menus assim que o dedo se aproxima da tela), seleção de álbuns por gestos na tela (como em telefones) e conexões USB, auxiliar, Bluetooth, para cartão SD e App-Connect. Esta última permite espelhar no aparelho a tela de um celular compatível com os padrões Mirror Link, Car Play (Apple) e Android Auto (Google) de modo a controlar aplicativos sem tocar no telefone.
Um projeto antigo, mas ainda válido; computador de bordo, comandos no volante e controle elétrico dos vidros traseiros são opcionais
Há ainda navegador integrado, toca-CDs, controles no volante e comando por voz para áudio, telefone e navegação. O aparelho é dos melhores já vistos em facilidade de uso, além de ter qualidade de áudio muito boa para o tipo de carro, mas se mostrou incapaz de compreender alguns endereços para navegar, mesmo com o motor desligado. O uso de aplicativos não abrange todos os presentes no telefone: a rede social Facebook e o navegador Waze, entre outros, ficam de fora.
O aparelho de topo Discover Media tem tela com sensor de aproximação, navegador, comando de voz e conexão App-Connect para celular
O acabamento interno do Track tem detalhes diferenciados como a costura azul aplicada ao simples tecido de revestimento dos bancos, forro de teto e colunas em preto (opcional) e um bom volante de couro com base achatada. O espaço interno é amplo em altura e para as pernas de quem viaja atrás, desde que o ajuste longitudinal do banco esteja em posição mais recuada, o que sacrifica o compartimento de bagagem — varia entre 260 e 353 litros conforme essa regulagem. Apenas a largura útil é modesta, inerente a um carro de suas dimensões.
O Fox mostra ainda itens positivos como alarme volumétrico (com ultrassom), alerta programável para excesso de velocidade, comando a distância para abrir e fechar vidros, computador de bordo com duas medições, controle elétrico de vidros com função um-toque para os dianteiros, faróis de duplo refletor mais os de neblina, luzes de leitura à frente e atrás, marcador de temperatura externa e vãos de carroceria estreitos e regulares. Ainda, a tampa traseira agora pode ser aberta pelo emblema VW sem uso da chave e, já há alguns anos, a iluminação em branco deixou os mostradores do painel bem legíveis.
O novo motor é silencioso, mas de desempenho discreto; transmissão continua ótima de usar; prejuízo à visibilidade pelas colunas é incômodo bem conhecido
No entanto, os plásticos internos são bastante simples e nota-se a ausência de alertas para uso do cinto e para porta mal fechada, banco traseiro bipartido, comando interno da tampa do tanque — usar chave para isso é tão anos 80… — e faixa degradê no para-brisa. Outros inconvenientes, que acompanham o Fox desde o lançamento, não têm correção fácil: pedais deslocados à direita com pouco espaço para o pé esquerdo, colunas dianteiras largas ao extremo (sobretudo na base) com prejuízo à visibilidade e limpador de para-brisa que faz a palheta direita terminar seu curso bem no centro do campo visual.
Ao colocar prós e contras na balança, conclui-se que o Fox permanece dentro do prazo de validade, se é que ele existe para automóveis. Atualizado em motor, sistema de entretenimento — tão importante para os motoristas da nova geração — e com vários aspectos melhorados ou corrigidos, ele supera 12 anos com o mesmo projeto sem parecer ultrapassado diante dos garotos da concorrência. É pena que seu desempenho ainda seja um ponto negativo, apesar de toda a revitalização feita sob o capô.
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Comentário técnico
• Entre as vantagens sobre o antigo quatro-cilindros da série EA-111 estão bloco de alumínio (que concorre para a expressiva economia de peso de 24 kg), quatro válvulas por cilindro com variação contínua do tempo de abertura para as de admissão, coletor de escapamento integrado ao cabeçote e partida a frio com álcool por preaquecimento do combustível (dispensa injeção de gasolina). O duplo circuito de arrefecimento permite manter temperaturas diferentes para o bloco e para o cabeçote, pelo uso de duas válvulas termostáticas. O bloco mais quente torna o óleo lubrificante mais fluido e reduz os atritos; o cabeçote mais frio afasta o risco de detonação.
• Na linha 2016 o Fox recebeu assistência elétrica de direção, que dispensa fluido e não consome potência do motor (apenas energia elétrica, mas não todo o tempo). Até então, a versão Blue Motion usava o sistema eletro-hidráulico e as demais tinham o hidráulico, menos eficiente dos três.
Ficha técnica
| Motor | |
| Posição | transversal |
| Cilindros | 3 em linha |
| Material do bloco/cabeçote | alumínio |
| Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
| Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
| Diâmetro e curso | 74,5 x 76,4 mm |
| Cilindrada | 999 cm³ |
| Taxa de compressão | 11,5:1 |
| Alimentação | injeção multiponto sequencial |
| Potência máxima (gas./álc.) | 75/82 cv a 6.250 rpm |
| Torque máximo (gas./álc.) | 9,7/10,4 m.kgf a 3.000 rpm |
| Potência específica (gas./álc.) | 75,1/82,1 cv/l |
| Transmissão | |
| Tipo de caixa e marchas | manual / 5 |
| Relação e velocidade por 1.000 rpm | |
| 1ª. | 3,77 / 6 km/h |
| 2ª. | 2,10 / 11 km/h |
| 3ª. | 1,28 / 18 km/h |
| 4ª. | 0,93 / 25 km/h |
| 5ª. | 0,74 / 31 km/h |
| Relação de diferencial | 4,93 |
| Regime a 120 km/h | 3.900 rpm (5ª.) |
| Regime à vel. máxima informada | 6.500 rpm (4ª.) |
| Tração | dianteira |
| Freios | |
| Dianteiros | a disco ventilado (256 mm ø) |
| Traseiros | a tambor (200 mm ø) |
| Antitravamento (ABS) | sim |
| Direção | |
| Sistema | pinhão e cremalheira |
| Assistência | elétrica |
| Diâmetro de giro | 10,9 m |
| Suspensão | |
| Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
| Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
| Estabilizador(es) | dianteiro |
| Rodas | |
| Dimensões | 6 x 15 pol |
| Pneus | 195/55 R 15 H |
| Dimensões | |
| Comprimento | 3,868 m |
| Largura | 1,663 m |
| Altura | 1,552 m |
| Entre-eixos | 2,467 m |
| Bitola dianteira | 1,432 m |
| Bitola traseira | 1,426 m |
| Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,364 |
| Capacidades e peso | |
| Tanque de combustível | 50 l |
| Compartimento de bagagem | 260 a 353 l (conforme ajuste do banco) |
| Peso em ordem de marcha | 1.084 kg |
| Relação peso-potência (gas./álc.) | 14,5/13,2 kg/cv |
| Garantia | |
| Prazo | 3 anos sem limite de quilometragem |
| Carro avaliado | |
| Ano-modelo | 2016 |
| Pneus | Pirelli P7 |
| Quilometragem inicial | 1.000 km |
| Dados do fabricante | |