Viagem ao litoral revela economia e alguns incômodos; consumo confirma maior eficiência com álcool
Texto e fotos: Felipe Hoffmann
Depois de três semanas, o Fiat Argo Drive do teste Um Mês ao Volante enfim experimentou gasolina, tanto em trechos urbanos quanto rodoviários. Depois de rodarmos mais 59 km com álcool à média de 13,4 km/l, foi completado o tanque com o novo combustível para rodarmos 488 km, com média geral de 18,2 km/l.
Para “secar” o tanque ao máximo, desafiamos o marcador de nível de combustível, acreditando que ainda havia mais líquido que o apontado. Afinal, nos outros abastecimentos, restava boa quantidade no tanque mesmo depois de rodar bastante com a luz da reserva acesa e o aviso sobre necessidade de abastecer. Usando a segunda medição (Trip B) do computador de bordo, muito útil, calculamos quantos litros ainda haveria no tanque e puxamos até o limite. A colaboradora Julia Pacheco nos avisou que a luz de reserva havia aparecido no painel quando estava a quase 40 km de nós. Tomando sua média de consumo, pedimos para vir sem preocupação.
De fato, ela chegou com tranquilidade e, após alguns cálculos, encaramos mais 59 km de trânsito sem abastecer, mesmo que na metade do caminho o nível de combustível mostrado no painel tenha passado a zero — apagaram-se todos os traços que marcam o nível. No fim, chegamos ao posto e à bomba habituais com 599 km rodados com o tanque de álcool — e ainda havia 1 litro no tanque. Uma autonomia surpreendente para esse combustível e para o tanque de 48 litros. Os últimos 59 km (não contados na semana passada) renderam 13,4 km/l em 1h 55min de trânsito por bairros paulistanos.
Mostrador digital destaca necessidade de abastecer, mas seguimos com ele assim por 59 km; no dia 21, a saudação que o instrumento faz a cada nova estação
Julia gostou bastante do carro no uso urbano, em especial do conforto da suspensão nas ruas de pavimentação ruim. Também elogiou o sistema de áudio “prático de usar o celular” e o nível de ruído interno, mas sentiu falta da regulagem de distância do volante. E relatou a dificuldade de acelerar devagar e progressivamente em primeira e segunda marchas, por achar o pedal do acelerador muito “arisco” e difícil de dosar: “Pressiona-se um pouco o pedal e o carro já pula, e na troca para segunda ou se dá um pulo por acelerar demais ou se tem aquele ‘soluço’ de falta de acelerador”.
De fato, o acelerador abrupto é um item que tem obtido muita reclamação no Argo, tanto na equipe quanto em relatos de proprietários. Seria um acerto relativamente simples para a Fiat, que poderia lançar uma nova calibração — a ser incorporada à central do motor durante as revisões em concessionária, sem que o cliente saiba. Enquanto o fabricante não resolve o assunto, donos impacientes têm solução no mercado paralelo, como soubemos ao visitar a Reiko, empresa especializada em reprogramação de centrais eletrônicas de motor e transmissão, para acertos finais do próximo curso Motores sem Segredos ministrado pelo autor.
Luís Paulo Addas, responsável pela empresa, explica que um retrabalho na progressão de pedal é algo relativamente simples e rápido: “Geralmente o que os clientes procuram é um acelerador com resposta mais rápida, pois muitos carros hoje possuem um retardo na resposta para garantir uma condução mais confortável e favorecer os testes de emissões. Respostas rápidas do motor exigem enriquecimento da mistura ar-combustível e atraso de avanço de ignição durante a manobra, o que prejudica as emissões e o consumo. Mesmo que o carro não ande mais ao chegar a 100% de pedal, o cliente acaba tendo maior sensação de desempenho no dia a dia”.
O Argo foi à praia e fez 19 km/l de média entre ida e volta: econômico, mas o motor consegue aproveitar ainda melhor o poder calorífico do álcool
No caso do Argo, a Reiko poderia fazer o caminho inverso caso fosse o desejo do cliente, como alguns frotistas que a procuram para limitar a velocidade máxima do carro a fim de evitar multas dos funcionários. Segundo Luís, a empresa já trabalha no sistema para alterar a central do Argo que, sendo nova no mercado, adota sistema de criptografia e barreiras colocadas pelo fabricante para inibir modificações.
Eficiente, o Argo fez 21,4 km/l na ida ao litoral e 16,7 km/l na volta; em um trecho repleto de lombadas, foi tão econômico quanto o Renault Kwid
Ao medir o consumo com gasolina, pudemos notar que sua eficiência é menor que com álcool. Como já explicamos na seção, a relação de poder calorífico — ou seja, de quanta energia cada combustível tem — é de 66% entre álcool e a gasolina brasileira atual com 27% de álcool anidro. Isso significa que, se a eficiência do motor for a mesma com ambos, um carro que faz 10 km/l com gasolina deveria fazer 6,6 km/l com álcool em iguais condições de uso. Pois bem: no mesmo trajeto e com velocidades médias semelhantes, o Argo fez 15,2 km/l com álcool e 20,8 de gasolina, uma razão de 73%. Com a mesma eficiência, seriam 23 km/l de gasolina.
Pelos consumos medidos pela Fiat, assinalados na etiqueta do Inmetro colada ao para-brisa, nos testes padronizados a relação foi de 71,3%. Isso significa que o motor do Argo é realmente mais eficiente com álcool, combustível que permite avanços de ignição maiores, mais próximos do ideal, sem que haja detonação — o que aumenta a eficiência do motor. Isso significa também menor emissão de gás carbônico (CO2), resultado da queima do combustível. Como a cana-de-açúcar consome CO2 do ar para crescer, justifica-se a emissão de 0 g/km na etiqueta do Inmetro.
Pelos dados oficiais de consumo, em padrões do Inmetro, o Fiat faz com álcool 71% do que obtém com gasolina e recebe nota A em consumo e emissões
No Argo, boa parte da diferença de eficiência está relacionada à alta taxa de compressão (13,2:1), que traz benefícios ao usar um combustível com maior resistência à detonação, tanto para o consumo e as emissões quanto para potência e torque. O uso de gasolina de alta octanagem, como a Podium da BR e a Ipiranga Octapro, provavelmente seria beneficiado por essa característica, pois as centrais modernas buscam sempre o melhor avanço de ignição para o combustível em uso.
Batismo de rodovia
Aproveitamos a quarta semana para o esperado batismo de rodovia do Argo, com uma viagem ao litoral norte de São Paulo, e constatamos que ele também é econômico nessas condições. Embora a quinta marcha relativamente curta (120 km/h com cerca de 3.600 rpm) possa incomodar pelo nível de ruído, com a sensação de estar girando muito o motor, isso não significa que haveria folga para uma marcha bem mais longa: como o motor de 1,35 litro não tem tanto torque em médias rotações, devido à pequena cilindrada, essa alteração poderia exigir reduções de marchas frequentes em subidas leves de rodovias, o que alguns criticam. A marcha atual praticamente faz coincidir a rotação de potência máxima com a de velocidade final.
O que faz aumentar a sensação de marcha curta é, por um lado, o escasso isolamento acústico da versão que se traduz em maior ruído interno, e de outro, o fato de se estar apenas com uma “casquinha” do acelerador para manter 100 km/h — até que se acelera até o fim e se nota haver pouca reserva de potência até seu máximo. A pouca progressão do pedal torna difícil manter a velocidade constante, além de cansar o músculo da canela por manter o pé muito no alto.
Falta de freio-motor chamou atenção na descida da Imigrantes; acelerador abrupto continua alvo de críticas, incluindo a motorista Julia Pacheco
Na descida de serra da Rodovia dos Imigrantes, com limite de 80 km/h, ficou à mostra como o motor tem pouco freio-motor: era preciso acionar os freios quase o trecho todo. Mesmo em terceira marcha, com o motor perto de 4.500 rpm, tínhamos de frear o Argo sem carga de passageiros e malas. Esse é um dos fatores que apontam sua eficiência: motores de baixa eficiência geralmente possuem atritos elevados, o que produz grande freio-motor. Vale notar que a potência do Argo de 1,35 litro é similar à de um Tempra de 2,0 litros da década de 1990, que tinha 105 cv com injeção. O “primo velho” teria maior freio-motor, mas também um consumo bem mais alto.
Como resultado de toda a eficiência, obtivemos excelentes consumos em rodovia, 21,4 km/l na ida e 16,7 km/l na volta. No trecho habitual de 40 km repleto de lombadas da Rodovia Rio-Santos, o Argo fez 20,2 km/l, quase o mesmo que o Renault Kwid (20,3 km/l), que pesa 360 kg a menos, e bem melhor que o Honda Civic EXL (17 km/l). O desempenho em rodovia agradou, mas obriga a reduções de marcha para buscar maiores rotações em ultrapassagens ou subidas de serra.
O Argo ficará mais alguns dias conosco, uma cortesia da Fiat para compensar a semana de combustíveis escassos e o abastecimento irregular. Na última semana continuamos com gasolina, com sua vantagem de autonomia ainda maior.
Semana anterior
Quarta semana
Distância percorrida | 547 km* |
Distância em cidade | 212 km* |
Distância em rodovia | 335 km |
Consumo médio geral | 18,2 km/l |
Consumo médio em cidade | 16,7 km/l |
Consumo médio em rodovia | 19,0 km/l |
Melhor média | 21,4 km/l |
Pior média | 8,8 km/l |
Dados do computador de bordo com gasolina; *inclui 59 km rodados com álcool |
Desde o início
Distância percorrida | 2.044 km |
Distância em cidade | 1.709 km |
Distância em rodovia | 335 km |
Consumo médio geral | 18,2 km/l (gas.) / 13,4 km/l (álc.) |
Consumo médio em cidade | 16,7 km/l (gas.) / 13,4 km/l (álc.) |
Consumo médio em rodovia | 19,0 km/l (gas.) |
Melhor média | 21,4 km/l (gas.) / 15,2 km/l (álc.) |
Pior média | 8,8 km/l (gas.) / 7,5 km/l (álc.) |
Dados do computador de bordo |
Preços
Sem opcionais | R$ 54.990 |
Como avaliado | R$ 60.190 |
Completo | R$ 62.190 |
Preços sugeridos em 2/5/18 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 2, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 70 x 86,5 mm |
Cilindrada | 1.332 cm³ |
Taxa de compressão | 13,2:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima | 101 cv a 6.000 rpm/ 109 cv a 6.250 rpm |
Torque máximo | 13,7/14,2 m.kgf a 3.500 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | manual, 5 |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 15 pol |
Pneus | 185/60 R 15 |
Dimensões | |
Comprimento | 3,998 m |
Largura | 1,724 m |
Altura | 1,50 m |
Entre-eixos | 2,521 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 48 l |
Compartimento de bagagem | 300 l |
Peso em ordem de marcha | 1.140 kg |
Desempenho e consumo | |
Velocidade máxima | 180/184 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 11,8/10,8 s |
Consumo em cidade | 12,9/9,2 km/l |
Consumo em rodovia | 14,3/10,2 km/l |
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro |