A classe intermediária de Munique demonstra, desde 1972,
como um sedã pode associar conforto e esportividade
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
No início da década de 1970, a linha chamada de New Class (nova classe) da BMW, lançada em 1961 com o modelo 1500 e que havia evoluído até o 2002 tii, estava completando 10 anos e, portanto, envelhecida diante de novos concorrentes. Em segmento superior havia a linha E3, com os modelos 2500 e 2800, mas eram carros luxuosos e caros que atingiam um pequeno volume de vendas. Era preciso renovar o conceito de sedã com toque esportivo, de carro familiar com aptidão para dar o mesmo prazer ao dirigir rápido que um cupê esporte, e oferecer uma alternativa intermediária em valor.
No Salão de Frankfurt de 1972 a Bayerische Motoren Werke (Fábrica de Motores Bávara) apresentava essa opção: o Série 5, codinome E12 (em que “E” significa Entwicklungsnummeren ou código de desenvolvimento), representado pelas versões 520 e 520i. As denominações, adotadas pela primeira vez pela marca, identificavam a linha de carroceria com o primeiro algarismo e a motorização (de 2,0 litros no caso) pelos outros dois, enquanto “i” indicava o uso de injeção de combustível. Uma regra simples, mas que se perderia mais tarde. E por que o número 5? Segundo uma fonte, porque era o quinto novo projeto da marca depois da fase dos motores V8, que contou com modelos como o sedã 502 e o roadster 507. Entre eles houve — além do New Class e do E3 — o pequeno 700 e a série de cupês C/CS.
O Série 5 inaugurava um novo padrão de desenho para a BMW, em que a ampla área envidraçada se destacava na vista lateral. A frente conservava o estilo já conhecido da marca, com a grade “duplo-rim” e os quatro faróis circulares, o mesmo ocorrendo com a “dobra de Hofmeister” na parte inferior das janelas laterais traseiras — assim chamada em alusão a Wilhelm Hofmeister, chefe de Estilo da marca à época da introdução desse detalhe, nos anos 60. A tampa do porta-malas, em suave declínio, harmonizava-se com a linha do capô. Era um sedã elegante e que antecipava tendências para a década.
A primeira geração, E12, era lançada em 1972 para ocupar um espaço entre o New Class e o
grande E3; o motor de 2,0 litros e quatro cilindros equipava as versões iniciais, 520 e 520i
A geração E12 foi a primeira na BMW a fazer uso mais extenso de computadores para o projeto da estrutura, ainda que de modo primitivo como se espera de 1972. A carroceria contava com zonas de deformação programada em caso de colisões, na frente e na traseira, e uma cabine reforçada com barras de proteção no teto para o evento de uma capotagem.
O motor dos 520 e 520i era um quatro-cilindros de 2,0 litros com a mesma tecnologia de câmaras de combustão com turbilhão já adotada desde 1968 no seis-cilindros da marca. O desenho das câmaras produzia três “redemoinhos”, um deles próximo à vela de ignição, medida para afastar a detonação e reduzir o consumo. A versão com dois carburadores desenvolvia potência de 115 cv e torque de 16,5 m.kgf, e a dotada de injeção, 130 cv e 18 m.kgf. Havia novidades também no chassi se comparado ao New Class: maiores distância entre eixos (2,636 metros; o comprimento era de 4,62 m) e bitolas, suspensão dianteira McPherson com as colunas inclinadas para trás e maior curso das molas. A traseira mantinha o sistema independente por braços semiarrastados, dos mais eficientes para a época.
A revista inglesa Autocar, ao avaliar o 520, destacou as evoluções sobre o antigo 2000: “Ele se parece em muitas formas mais com o 2500 [da linha E3] que com o 2000 [da New Class]. A direção é muito precisa e o comportamento dinâmico mostra-se muito bom, com excelente amortecimento. O rodar é macio, lembrando novamente o do 2500. O carro foi a mais de 170 km/h indicados, mas não é silencioso quando acelera forte e em altas velocidades”.
As versões 525 e 528 trouxeram ao Série 5 os apreciados motores de seis cilindros em
linha; no interior de bom acabamento, os bancos e a posição de dirigir eram destacados
O bom comportamento dinâmico logo levou os clientes a pedir mais potência para que fosse mais bem desfrutado. Já no ano seguinte, 1973, aparecia o 525 com motor de seis cilindros em linha, 2,5 litros, 145 cv e 21,2 m.kgf, seguido após dois anos pelo 528, que extraía 165 cv e 25,8 m.kgf do seis-cilindros de 2,8 litros. Ambos os motores, ainda com carburadores, eram os mesmos da linha E3 de carros maiores. No mesmo ano a produção, iniciada em Munique, era transferida para a nova fábrica de Dingolfing, também na Alemanha.
O 528i era o primeiro Série 5 a romper a barreira dos 200 km/h; nos EUA, a publicidade anunciava a BMW como “o fabricante que se recusou a ser legislado para a mediocridade”
Na revista inglesa What Car?, o 528 enfrentava o Jaguar XJ 3,4 e o Volvo 264 GL. A estabilidade era destaque: “A suspensão tem um poder de curvas muito alto. Isso, combinado à pouca rolagem da carroceria e à direção, faz dele um carro que poucas pessoas levarão ao limite de aderência”. O BMW foi bem mais rápido para acelerar — de 0 a 96 km/h em 8,0 segundos contra 11,9 s do Jaguar e 15,4 s do Volvo —, mas consumiu mais que os concorrentes. Se mostrou ótimos bancos e posição de dirigir, o interior era o menos espaçoso dos três.
Em 1974 o mercado europeu recebia o 518, com modestos 90 cv e 14,5 m.kgf, uma opção para poupar combustível naqueles tempos de petróleo caro. Enquanto isso, o Série 5 estreava nos Estados Unidos com um motor ainda maior, o 3,0-litros a injeção do 530i, com 178 cv e 25,6 m.kgf, de forma a atender às rígidas normas de emissões poluentes introduzidas naquele ano sem penalizar o desempenho. Uma versão especial na África do Sul aparecia dois anos depois (leia boxe abaixo).
Nos Estados Unidos o BMW recebia para-choques enormes, de estética desastrosa; era
vendido lá o 530i, com motor de 3,0 litros a injeção, para contornar as normas de emissões
Algumas modificações eram introduzidas em 1977, mesmo ano do lançamento do Série 7 como sucessor do E3. A absorção de ruídos e a ventilação eram aprimoradas e surgiam itens como teto solar, freios dianteiros a disco ventilado e controle elétrico dos retrovisores (o dos vidros era de série, assim como ar-condicionado e direção assistida). O 520 recebia um seis-cilindros de 2,0 litros com bloco mais compacto (linha M20, em vez da M30 dos maiores) que, com dois carburadores, obtinha 122 cv e 16,3 m.kgf.
O 528i, com injeção mecânica Bosch L-Jetronic, oferecia 177 cv (aumentados a 184 cv no ano seguinte) e 24 m.kgf — e era o primeiro Série 5 a romper a barreira dos 200 km/h. Nos EUA, embora com menor potência (171 cv), a publicidade anunciava a BMW como “o fabricante que se recusou a ser legislado para a mediocridade”, em alusão à busca de desempenho enquanto muitas marcas lançavam modelos de potência sofrível, incapazes de atender de outra forma à legislação de emissões.
O 528 foi testado em 1977 pela Autocar, que enumerou qualidades como “comportamento previsível, boa direção, excelentes freios, nível de ruído bem mais baixo, melhor ventilação” e o definiu como “um carro muito mais agradável, com toda a ardência esperada de um BMW”. Sua conclusão: “A esse preço você tem o direito de esperar um grande negócio em termos de desempenho, conforto e refinamento. No primeiro aspecto ninguém ficará decepcionado, mas sentimos que há espaço para aperfeiçoamento a respeito de ruídos e para algum refinamento adicional”.
Conciliar conforto, desempenho e comportamento dinâmico foi um atributo reconhecido
desde o início no Série 5; ainda hoje, esse trinômio representa um de seus pontos altos
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Nas pistas
Ainda na primeira geração (E12), a subsidiária da BMW na África do Sul uniu esforços com a divisão Motorsport e elaborou um E12 apimentado: o 530 MLE ou Motorsport Limited Edition. Para homologar a versão para o campeonato sul-africano de turismo na classe Produção Modificada, era obrigatória uma série para venda ao público de no mínimo 100 carros — que acabaram superando 200.
Em vez do motor de 2,8 litros original do Série 5, o MLE usava o seis-cilindros de 3,0 litros do sedã E3, com dois carburadores e comando de válvulas mais “bravo”, o que resultava em 197 cv. Com câmbio de cinco marchas, diferencial autobloqueante e suspensão revista, era um carro rápido nas retas e nas curvas. Para-lamas alargados e defletores dianteiro e de porta-malas vinham na versão para as pistas, enquanto o modelo de rua tinha apenas o defletor frontal e novas rodas.
E não se trata de competição, mas os M5 das três últimas gerações (E39, E60 e F10) têm feito bom papel no “Inferno Verde” — o circuito alemão de Nürburgring em seu anel norte, ou Nordschleife. O Ring Taxi, descrito com humor como o táxi mais rápido do mundo, pode ser alugado por até três passageiros para uma volta muito emocionante pela pista de 20,8 quilômetros de extensão. Mais de uma volta pode ser dada, mas a BMW lembra que “o esforço ao sistema cardiovascular não deve ser subestimado”.