Produzido por um quarto de século, ele representou diferentes
patamares entre os carros grandes dessa divisão da Ford
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Monterey, nome de uma charmosa cidade no litoral da Califórnia, nos Estados Unidos, foi a denominação escolhida pela divisão Mercury da Ford para uma versão cupê de luxo do modelo Eight, lançada em 1950, que trazia teto revestido em vinil ou tecido e bancos de couro. Um conversível vinha no ano seguinte, mas foi com a remodelação da linha de carros grandes da Mercury para 1952 que a designação passou a toda sua série de topo, incluindo o sedã de quatro portas e (um ano mais tarde) a perua.
Com 5,14 metros de comprimento e 3 m entre eixos, o Monterey exibia formas típicas da época, com fartos cromados, pontas de lança no para-choque dianteiro e para-lamas traseiros algo salientes. Comparado ao anterior, tinha o centro do capô bem mais baixo e para-brisa em uma só peça. O interior levava seis pessoas em bancos inteiriços. O motor inicial era um V8 flathead (cabeçote chato, com válvulas laterais) de 255 pol³ ou 4,2 litros com potência bruta de 125 cv. Câmbios manual, manual com overdrive e automático de três marchas eram oferecidos. Suspensões (dianteira independente, traseira por eixo rígido) e freios a tambor seguiam os padrões de então.
Depois de marcar a produção do Ford de número 40 milhões com um conversível vermelho, o Monterey passava a 1954 com alterações de aparência e nova versão — a Sun Valley, um cupê com a seção dianteira do teto em plástico transparente, como no Ford Crestline Skyliner. Outra novidade era o motor V8 da série Y, de 256 pol³ (4,2 litros) e 161 cv, com válvulas no cabeçote e desempenho superior.
De início o Monterey era um cupê ou conversível (como o bege de 1951), mas
em 1953 o nome passava a identificar uma linha que incluía sedã e perua
A nova carroceria do modelo 1955 conferia-lhe ar mais imponente, com grade dianteira ampla e baixa, para-brisa envolvente — adotado por toda Detroit no período — e um friso recortado nas laterais que fazia, quando fosse o caso, a divisão entre as duas cores de pintura. A gama de opções crescia com um sedã hardtop, sem coluna central; o comprimento chegava a 5,24 m e o carro estava mais largo e baixo. Opções de conforto incluíam bancos com ajuste elétrico, direção assistida e rádio.
A carroceria fastback aparecia no esportivo
Marauder em 1963; no ano seguinte
vinha o V8 de 7,0 litros com até 425 cv
Embora deixasse de ser o Mercury grande mais luxuoso, posição transferida ao Montclair, o Monterey evoluía em mecânica com o motor V8 da série Y de 292 pol³ (4,8 litros) do Ford Thunderbird, com 188 cv com câmbio manual ou 198 com o automático. Quem quisesse desempenho ainda melhor seria atendido no ano seguinte com o V8 de 312 pol³ (5,1 litros) da mesma família com 210 a 235 cv. O volante com seção central recuada era uma das medidas de segurança em colisões.
O exagero em formas e dimensões que tomou conta da indústria norte-americana naquela década chegava ao Monterey em 1957, quando o comprimento alcançava 5,36 m, e o entre-eixos, 3,10 m. A carroceira ganhava perfil mais baixo — o assoalho estava mais perto do solo, permitido pelo novo chassi — e os para-lamas traseiros destacavam uma seção larga. Os faróis permaneciam dois, mas seriam quatro no ano seguinte, aproveitando a mudança na legislação. Não havia mais a perua, agora associada às linhas Commuter, Voyager e Colony Park.
O Mercury crescia em tamanho e cilindrada: em 1957 (esquerda) já media
5,36 metros; no ano seguinte vinham quatro faróis e o V8 de 7,0 litros
O motor 312 ganhava potência (255 cv) e surgia a opção do V8 de 368 pol³ (6,0 litros) da mesma série Y com 290 cv, já conhecido da divisão Lincoln, que não foi o topo da linha por muito tempo: para 1958 entravam no catálogo os V8 de 383 pol³ (6,3 litros e 312 cv) e 430 pol³ (7,0 litros e 360 cv) da série MEL, assim como a caixa automática Multi-Drive de três marchas.
As reformulações do grande Mercury seguiram frequentes. Para 1959 ele crescia ainda mais (5,53 e 3,20 m), a grade dianteira mudava de dupla para única, o para-brisa curvava-se no topo e o vidro traseiro envolvia as laterais. O motor 312 oferecia 210 ou 280 cv. No ano seguinte vinham faróis espaçados na própria grade e capô mais alto na seção central que nas laterais — antes era o contrário. O elemento destacado nos para-lamas traseiros estava sutil, quase um vinco, e as lanternas vinham na vertical.
Embora voltasse a ser o Mercury de topo, pois o Montclair e o Park Lane haviam saído de produção, o Monterey 1961 estava mais comedido em dimensões (3,05 m entre eixos) e na aparência, com capô mais plano e vidros pouco envolventes, mas havia sutis “rabos de peixe” na traseira. O compartilhamento no grupo tornava-se evidente com o uso da carroceria dos grandes Fords, diferenciada apenas em acabamento. No painel o velocímetro seguia escala horizontal, como seria no Brasil com a linha Galaxie/Landau.
Os modelos 1959, 1960 e 1961 (fotos menores) mostram a frequência das
mudanças; embaixo, duas das carrocerias do mais sóbrio modelo 1962
O motor básico V8 292 tinha como alternativas os inéditos V8 da linha FE com 352 pol³ (5,8 litros e 220 cv) e 390 pol³ (6,4 litros e versões de 300, 330 e 375 cv). A suspensão era aprimorada e ganhava maior intervalo (48 mil km) entre as lubrificações. Um ano depois, para suprir a lacuna do Meteor — nome que havia passado a uma carroceria média –, a Mercury apresentava o Monterey 6 com motor de seis cilindros em linha, 223 pol³ (3,7 litros) e 135 cv, opção de menores preço e consumo que só duraria um ano. Em contrapartida, o pacote esportivo S-55 trazia o motor V8 FE de 406 pol³ (6,7 litros) com 405 cv ao cupê e ao conversível.
No teste de um conversível 1961 com motor 390, a revista Motor Life destacou a nova suspensão: “Comparado ao modelo 1960, é muito superior. A transmissão de ruídos foi bastante reduzida, o comportamento é bom sob a maioria das condições e os grandes tambores dão-lhe uma frenagem efetiva. O motor desenvolve torque justo e traz bom desempenho geral. É um automóvel com estilo e elementos mecânicos que o separam de outros do mesmo fabricante”.
Já a Motor Trend aprovou o desempenho do S-55 1962: “Ele anda? Sim, em todos os aspectos. É magnífico em médias e altas rotações, retomando velocidade como se tivéssemos reduzido uma marcha. Este motor é uma brilhante peça de engenharia, o mesmo que a Ford oferece em seus carros de alto desempenho. Mas não se engane — este bruto de grandes músculos é um carro de homem, pelo fato de que direção assistida não está disponível”.
O Monterey Marauder de 1964, único ano dessa versão para o sedã, e dois
modelos 1966, com o debaixo mostrando o vidro traseiro Breezeway
Um estranho vidro traseiro com inclinação inversa à usual — como no Mercury Turnpike Cruiser e no Lincoln Continental de 1958 a 1960 — e parte central rebaixável, chamado de Breezeway, era uma das novidades do Monterey 1963. O V8 406 com 385 cv tornava-se opção ao V8 390, que oferecia 250 cv com carburador de corpo duplo e 300 cv com um quádruplo. Os motores seis-cilindros, V8 292 e V8 352 deixavam o mercado.
A carroceria fastback, com estilo de traseira similar ao do Sports Hardtop da Ford, aparecia no mesmo ano na versão esportiva Marauder. O conjunto S-55 incluía motor 390 com 300 cv e interior mais esportivo. Contudo, na linha 1964 a Mercury recolocava o Monterey como série mais acessível entre os modelos grandes com a volta do Montclair e do Park Lane. Com retoques visuais, ele ganhava como motor de topo o V8 de 427 pol³ (7,0 litros), com expressivos 410 ou 425 cv, e oferecia câmbio manual de quatro marchas. O Marauder agora podia vir com diversas carrocerias, mas logo desapareceria para ressurgir mais tarde como modelo independente.
A boa aceitação ao fastback levou a empresa a adotá-lo como padrão nos cupês 1965, embora o sedã com coluna central permanecesse com três volumes e o vidro Breezeway. Com linhas mais retas e sóbrias, o Monterey para o ano seguinte voltava a crescer (3,12 m de entre-eixos) e ganhava novos V8 da série FE de 410 pol³ (6,7 litros e 330 cv) e 428 pol³ (7,0 litros e 345 cv). Novos retoques de estilo e o fim do Breezeway vinham para 1967. Em pesquisa da Popular Mechanics com proprietários o modelo foi elogiado pela estabilidade, o conforto de rodagem e o estilo, mas criticado pelo consumo e a assistência técnica.
Conversível 1969 e cupê 1970 mostram os para-lamas “garrafas de Coca”;
embaixo, as mudanças de estilo nos Montereys de 1971, 1972 e 1973
Reprojetado para 1969, o grande Mercury ganhava dimensões (3,15 m entre eixos, salvo na perua, que voltava à linha com 3,10 m) e estilo atualizado, com para-lamas traseiros ao estilo “garrafa de Coca-Cola” e lanternas horizontais. Dois anos mais tarde, outra reestilização trazia grade dianteira protuberante e separada dos quatro faróis e janelas de porta sem moldura. O conversível deixava de ser oferecido — Detroit praticamente os extinguiu nos anos 70 por causa de normas de segurança —, mas os amantes do céu aberto podiam pedir um teto solar com controle elétrico.
Três motores V8 inéditos constavam da linha 1971: o “Windsor” de 351 pol³ (5,75 litros) com 240 cv, o “Cleveland” de 400 pol³ (6,6 litros) com 260 cv — assim chamados em alusão às cidades de produção — e o grande 429 pol³ (7,0 litros) com 320 ou 360 cv, versão esta com carburador quádruplo. No ano seguinte, com a medição líquida e menor taxa de compressão para uso de gasolina sem chumbo, os valores de potências caíram, ficando o V8 351 com 161 cv e o 429 com 209 cv pelo novo método. Câmbio automático Select Shift Cruise-O-Matic, freios dianteiros a disco e direção assistida vinham de série em toda a linha.
Para-choques resistentes a impactos de até 8 km/h, exigidos por lei, apareciam no Monterey 1973, que abandonava a grade protuberante e a curva dos para-lamas traseiros. O ano seguinte trazia a opção do maior motor já oferecido no modelo, o V8 Lincoln de 460 pol³ (7,5 litros) e 244 cv, mas a oferta teve curta duração: a Mercury encerrava o modelo para 1975, deixando em seu lugar o Marquis e acrescentando o Grand Marquis como topo de linha. O nome Monterey renasceria em 2004 em outra categoria — uma versão Mercury da minivan Ford Freestar.
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