Embora tenha ficado à sombra do Lexus LS 400 em vendas,
o representante da Nissan esbanjou tecnologia e refinamento
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
As maiores fábricas japonesas começaram sua atuação no mercado dos Estados Unidos de maneira semelhante, em geral com carros compactos e econômicos como Datsun 510, Honda Civic e Toyota Corolla, que representavam uma viável alternativa aos menores modelos locais. Na década de 1980, porém, com seus automóveis médios para os padrões norte-americanos — como Honda Accord, Nissan Maxima e Toyota Camry — já consagrados, tais empresas detectaram espaço para investir no segmento de luxo.
A primeira a lançar uma marca específica para esse mercado foi a Honda, em 1986, por meio da Acura. Já Toyota e Nissan desenvolveram em simultâneo o que seriam suas divisões de prestígio para os EUA: a Lexus e a Infiniti, na ordem. E ambas chegavam praticamente juntas ao mercado, em 1989, com modelos de topo que concorriam diretamente entre si — o LS 400, pela primeira, e o Q45, pela segunda.
Assim como o Lexus, o modelo mais luxuoso da Infiniti era um grande sedã de quatro portas com tração traseira, suspensão independente nas quatro rodas, motor V8 com quatro válvulas por cilindro e caixa de câmbio automática de série. As linhas dessa primeira geração, de codinome G50, eram suaves e arredondadas — orgânicas, como se dizia à época —, típicas dos carros japoneses do período, com a curiosidade de não haver grade dianteira: a admissão de ar para o radiador dava-se apenas por uma tomada inferior, como em outros carros de seu tempo (Volkswagen Passat, Honda Civic). Na traseira, complementos faziam parecer que as lanternas fossem de uma ponta à outra. O coeficiente aerodinâmico (Cx) 0,29 era um dos melhores do mercado mundial à epoca.
O modelo inicial do Q45, em 1989: grandes dimensões, tração traseira, motor V8 de
4,5 litros e 32 válvulas com potência de 280 cv e recursos técnicos sofisticados
A pintura usava um composto de flúor e uretano na camada superficial, com efeito similar ao de um antiaderente de panelas, para repelir poeira e água e manter a carroceria limpa por mais tempo mesmo sem aplicação periódica de cera. No interior, o requinte do Q45 não era ostensivo — em outra medida peculiar e que seria revista anos depois, a Infiniti havia optado por um revestimento de couro não tão macio quanto o dos concorrentes e por não usar qualquer aplique de madeira no acabamento. Mas havia detalhes refinados como ajuste elétrico dos bancos dianteiros (com memória) e do volante, ar-condicionado com controle automático, teto solar com acionamento elétrico e, no centro do painel, um tradicional relógio analógico.
O Q45 trazia requintes técnicos como suspensão traseira multibraço, rodas de alumínio forjado e sistema Super HICAS, pelo qual as rodas de trás também esterçavam
Fabricado em Tochigi, no Japão — origem que manteria até a última geração —, o Q45 era derivado do Nissan President com menor entre-eixos e estilo revisto. O motor designado como VH45DE era um V8 com ângulo de 90º entre as bancadas, bloco de alumínio e cabeçotes com duplo comando e quatro válvulas por cilindro. Entre seus recursos estavam virabrequim e bielas forjados, válvulas de escapamento preenchidas por sódio (para maior dissipação de calor) e, de 1990 em diante, variação de tempo de abertura das válvulas. Com potência de 280 cv e torque de 40,4 m.kgf, colocava-se entre os mais vigorosos da faixa de preço do Infiniti.
O novo topo de linha trazia requintes técnicos como suspensão traseira independente do tipo multibraço (uma das primeiras do mundo, antes mesmo do BMW Série 3 da geração E36) e opção de rodas de alumínio forjado, mais leves e resistentes. O pacote Touring acrescentava defletor traseiro e o sistema Super HICAS, pelo qual as rodas de trás também esterçavam, tanto no mesmo sentido das dianteiras (para aumentar a estabilidade em curvas de alta) quanto no sentido oposto (a fim de facilitar manobras e reduzir o diâmetro mínimo de giro). Freios com sistema antitravamento (ABS) e bolsa inflável para o motorista vinham de série.
Conforto e acabamento de qualidade não faltavam no interior do Infiniti (aqui
em versão para o Japão), mas alguns desejavam madeira e couro mais macio
Já no ano de lançamento, a revista norte-americana Popular Science colocava o Q45 diante de Audi V8, BMW 735iL, Lexus LS 400 e Mercedes-Benz 560 SEL — com exceção do BMW, todos dotados de motores V8 de 4,0 litros ou mais. Equilibrado, o Infiniti foi segundo colocado em aceleração (atrás do Mercedes), em frenagem e em velocidade no desvio entre cones (o Audi foi melhor nesses quesitos).
“O trem de força do Q45 é musculoso e pronto para se exercitar. O motor produz uma potente resposta em média rotação e um som agradável com acelerador a pleno sem incomodar. Como no Lexus, a central eletrônica do motor combina-se à da transmissão para mudanças suaves. O Infiniti tem um rodar impressionante e um comportamento competente: o carro de duas toneladas parece ágil como uma bailarina. Mas em curvas de piso áspero a estrutura não parece rígida o bastante”, analisou a revista.
Uma suspensão ativa, lançada em 1990, era a primeira oferecida em um carro de grande produção no mundo. O sistema usava pressão hidráulica, com um atuador junto a cada roda, para responder às variações de qualidade do piso e aos esforços longitudinais e laterais. Dez sensores (três de aceleração vertical, dois de aceleração lateral, um de aceleração longitudinal e quatro de altura de rodagem) forneciam informações a um microprocessador, que decidia como a suspensão deveria se modificar para atenuar os movimentos. A Infiniti oferecia o modelo também no Japão, com volante à direita.
Apesar do elogiado motor e de opções como a suspensão ativa e a direção nas quatro
rodas, o Q45 teve recepção morna nos EUA; à direita o modelo 1994, já com grade
Na avaliação da Consumer Guide, que considera os modelos usados hoje disponíveis, o primeiro Q45 destacava-se pelo “trem de força suave, silencioso e com boas respostas. Um som esportivo emana de sob o capô, mas o V8 funciona macio. Embora não tão confortável ao rodar quanto um LS 400 ou um Jaguar XJ6, o Q45 iguala-se facilmente aos grandes BMW e Mercedes-Benz nesse departamento, trazendo estabilidade em autoestradas. Comportamento e frenagem são bons, apesar da notável inclinação da carroceria. Apesar de espaçoso para quatro pessoas, o Q45 não é amplo quando se consideram suas dimensões externas”. Em resumo, a publicação considerou que ele “não se equipara ao Lexus em refinamento, mas você faria bem em experimentar ambos”.
O Infiniti foi também comparado pela Popular Mechanics a BMW 525i, Cadillac STS, Lincoln Continental e o LS 400 em 1992. Era o segundo mais caro, o mais potente e o mais vigoroso ao acelerar, fazendo de 0 a 96 km/h em 7,1 segundos: “O soberbo V8 do Q45 fornece um sério empurrão quando você pula no acelerador. Mesmo sendo o carro mais pesado do grupo — perto de duas toneladas —, é facilmente o mais rápido. Há muito espaço dentro desse grande carro. O acabamento interno é consistente com a excelência que se espera desse time, mas nossa equipe preferiu o padrão e o estilo do Lexus ao mais discreto Q45”.
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Nas telas
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O Q45 está presente em muitos filmes, mas em poucos obtém maior relevância. As aparições mais importantes são todas da mesma época, o modelo reestilizado da primeira geração, por volta de 1994. É o caso da aventura Encurralados no Paraíso (Trapped in Paradise, 1994), do filme de terror A Maldição (Thinner, 1996), da comédia A Thin Line Between Love and Hate (1996) e do policial City of Industry (1997).
Dos demais modelos desse Infiniti, o inicial (ainda sem grade dianteira) pode ser visto no policial Traffic: Ninguém Sai Limpo (Traffic, 2000), enquanto a geração de 1997 aparece no filme de ação Assassinos Substitutos (The Replacement Killers, 1998) ou, na versão de 1999, na comédia Friends and Family (2001).
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