O Uno Mille foi o primeiro nacional de 1,0 litro na era moderna, em 1990; a Honda instala
motores de 2,0 litros no CR-V e no Accord trazidos ao Brasil para recolher menos IPI
A cada litro, mais IPI
Nenhum país no globo tem tantos automóveis com motor de 1,0 litro quanto o Brasil, e não porque gostemos muito desse tipo de “carro-jabuticaba”. Como se sabe, existe benefício fiscal por meio de IPI para modelos que não superem tal cilindrada desde 1990, quando surgiu o primeiro da era moderna — o Fiat Uno Mille. Note que não se tratava do “carro popular”, programa iniciado apenas em 1993 e que não se limitava a versões de 1,0 litro (Fusca, Kombi e Chevrolet Chevette de 1,6 litro foram incluídos na redução de imposto). O “popular” acabou, mas o carro de 1,0 litro chegou a nossos dias.
É verdade que o benefício fiscal já foi maior. Em 2000 o IPI para eles era de 10%, contra 25% dos motores de maior cilindrada, diferença que permitiu à VW vender o Gol 1,0 16V Turbo com um motor sofisticado de 112 cv por preço menor que o do Gol 1,8 de 99 cv. Dois anos depois, porém, a revisão de alíquotas reduziu essa vantagem e inviabilizou algumas iniciativas em 1,0 litro — como o Polo 1,0 16V da mesma VW, lançado quase em simultâneo à mudança tributária e logo retirado do catálogo.
Contudo, a mudança das faixas de IPI também criou o patamar de 2,0 litros, acima do qual o imposto subia bastante. Isso reduziu as ofertas além dessa cilindrada na indústria local (caso do Vectra 2,2 de oito válvulas, que perdeu 200 cm³) e afetou até os importados, chegando ao caso da Honda, que instala no Accord feito nos EUA e no CR-V produzido no México motores de 2,0 litros em vez dos 2,4 usados na América do Norte.
Redução para quê? A lei exige, mas Land Rover e Mercedes-Benz conseguem vender
no Brasil os utilitários Freelander e ML a diesel sem atender ao requisito técnico
Restrições para o diesel
O uso de óleo diesel por automóveis é proibido no Brasil — em um caso talvez único em âmbito mundial — desde 1976, quando a medida foi tomada a fim de reduzir a importação de petróleo. Nos anos 2000 as regras que permitem a aplicação desses motores foram revistas, passando a autorizá-los para veículos enquadrados como jipes, com tração nas quatro rodas e redução, e como picapes com capacidade de carga mínima de 1.000 kg.
É por isso que não existem à venda picapes leves (Strada, Saveiro) a diesel por aqui, mesmo que sejam fabricadas no País para exportação, e que as médias (S10, Ranger) em alguns casos têm maior capacidade de carga em suas versões a diesel que nas similares a gasolina ou flexíveis. No caso de utilitários esporte, como TrailBlazer e Hilux SW4, o diesel é permitido desde que tenham tração 4×4 e redução.
Então surgem as exceções: primeiro a Mercedes-Benz, com o ML, e depois a Land Rover, com o Freelander, conseguiram homologar utilitários sem redução para uso de diesel. As alegações dos fabricantes são que, com controles eletrônicos sofisticados e (no caso do ML) um torque bastante elevado, esses modelos são capazes de arrancar em subidas com tanta facilidade quanto os dotados de redução. Ah, bom…
Antes que a transferência da linha para o Brasil resolvesse a questão cambial, a
Silverado teve a capacidade aumentada para recolher imposto de caminhão
De picape para caminhão
Turbulências econômicas e oscilações cambiais deixaram a General Motors do Brasil em situação complicada no fim dos anos 90, ao tornar caro demais importar a picape pesada Silverado da fábrica argentina de Córdoba. A GM encontrou uma solução nas normas tributárias: ao elevar a capacidade de carga do veículo para 1.330 kg, enquadrou-o como caminhão leve e fez baixar a incidência de impostos, com reflexo no preço.
Só que a mudança trouxe desvantagens: além do prejuízo ao conforto de rodagem pela suspensão reforçada, a Silverado HD passava a exigir habilitação de categoria C e estava sujeita a limitações de uso, como menor velocidade máxima em rodovias e restrição de tráfego em centros urbanos, tal como um caminhão. Em 2000 a situação era contornada com a transferência da produção para São José dos Campos, SP, o que evitava os efeitos da supervalorização do peso argentino. A Silverado D20 retomava a capacidade de carga original (1.110 kg) e, para os interessados em levar mais peso, a divisão GMC lançava a 3500 HD para 1.330 kg.
O Ford Thunderbird de 1958, logo após o governo dos EUA permitir faróis duplos,
e o Mercedes-Benz SEC dos anos 80 com faróis modificados para venda no país
As regras para faróis e lanternas
No que se refere a dispositivos de iluminação e sinalização, cada país tem suas normas — muitas vezes conflitantes umas com as outras. Nos EUA vigorou entre os anos 40 e os 80 a exigência de faróis selados em tamanho-padrão, de início apenas dois e de 1957 em diante com permissão para quatro, mas sempre circulares — só nos anos 70 os retangulares foram liberados, ainda assim com dimensões previstas em lei. Fabricantes de outras origens tinham de adaptar faróis padronizados a seus carros exportados para a América, não raro em prejuízo da harmonia do desenho original.
Embora superada essa fase, os norte-americanos ainda requerem o facho simétrico, em vez do assimétrico usado praticamente em todo o resto do mundo. Há outras regras peculiares: as luzes de direção traseiras são vermelhas por lá, em vez do tom âmbar dos demais países, e são necessárias luzes de posição nas extremidades laterais, muitas vezes aplicadas aos para-choques. Por outro lado, a legislação europeia exige luzes de circulação diurna na frente, repetidores laterais de luzes de direção, lanterna traseira de neblina e ajuste elétrico (ou automático) do facho dos faróis, que os EUA dispensam.
Acordos de cavalheiros
Em alguns casos, limitações surgem não das normais legais, mas de “acordos de cavalheiros” firmados entre os próprios fabricantes. Na Alemanha, único país com rodovias de velocidade livre, fábricas como Audi, BMW, Mercedes-Benz e Volkswagen estabeleceram um acordo nos anos 90 para limitar a velocidade de seus carros a 250 km/h, usando restrições eletrônicas. O objetivo era evitar uma guerra interminável por velocidades mais altas que, ao contrário de outros países, acabariam sendo colocadas em prática pelos motoristas na Alemanha, expondo o tráfego a riscos.
Os alemães limitam-se a 250 km/h desde os anos 90, mas abrem exceções como
o Audi R8 e os Porsches; no Japão, também o Skyline GT-R seguia a regra dos 280 cv
De lá para cá, praticamente todo modelo dessas marcas veio com velocidade máxima não maior que 250 km/h. Mas há exceções: alguns supercarros ficaram de fora do acordo, como o Audi R8 e os Mercedes SLR McLaren e SLS AMG, e versões de alto desempenho (como as das linhas M da BMW, RS da Audi e AMG da Mercedes) costumam oferecer a opção de eliminar na fábrica o limitador. Enquanto isso, a Porsche preferiu não participar do “cavalheirismo”.
Outros casos de acordo em favor da segurança foram vistos no Japão. Nos anos 70, as fábricas definiram o limite de velocidade de 180 km/h — embora a maior velocidade permitida em suas rodovias fosse de 100 km/h — acompanhado do uso desse valor como fim da graduação dos velocímetros. Na década seguinte veio outro limite, o de potência: os carros lá vendidos foram restritos a 280 cv, razão para haver tantos esportivos daquela procedência com esse valor na ficha técnica — mesmo que, no mundo real, o desempenho de alguns deles fizesse imaginar que já tivessem deixado os 300 cv bem para trás…
Em meados dos anos 2000, diante de evidências de que tais restrições não tinham relação com os índices de acidentes no país, o limite caiu e a barreira foi rapidamente superada por diversas marcas.
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