Mais potência e torque com o menor peso deixam o 2008 (acima) muito rápido; com motores próximos, o Duster (ao lado) é bem mais leve que o T6, mas foi penalizado pelo câmbio
Mecânica, comportamento e segurança
Duster e T6 seguem a mesma escola de motores, com 2,0 litros, quatro válvulas por cilindro, injeção convencional (multiponto sequencial) e aspiração natural, ao passo que o 2008 ousa mais com turbocompressor e injeção direta em uma unidade de menor cilindrada, 1,6 litro (saiba mais sobre técnica). O resultado é potência e torque superiores no Peugeot: 165/173 cv e 24,5 m.kgf, ante 155/160 cv e 20/20,6 m.kgf do JAC e 143/148 cv e 20,2/20,9 m.kgf do Renault, sempre na ordem gasolina/álcool.
Com o bom aproveitamento do câmbio manual de seis marchas e o menor peso do grupo (1.231 kg), o 2008 só poderia sobressair em agilidade: é realmente rápido, quase esportivo, e seu motor isento de vibrações dá prazer em ser usufruído. Em uso rodoviário a sexta marcha pode ser mantida mesmo em subidas acentuadas ou ao deixar a velocidade cair: de 2.000 rpm em diante, basta acelerar para o turbo “encher” em instantes e empurrar o carro com facilidade.
Contudo, a demora na atuação do turbo traz um incômodo vazio abaixo dessa rotação, que faz o motor apagar com facilidade nas saídas até o motorista se habituar e passar a “queimar” um pouco de embreagem. Embora as partidas a frio com álcool sejam imediatas, na fase de aquecimento esse vazio parece mais acentuado. A sensação de “tudo ou nada” deixa a impressão de que a calibração eletrônica da versão flexível foi imperfeita, pois não percebemos tal inconveniente no Citroën DS3, único outro modelo de câmbio manual a usar esse motor (a gasolina somente) no Brasil.
Com turbo e injeção direta no moderno motor de 1,6 litro, o Peugeot (acima) vence em potência e torque; JAC (ao lado dele) e Renault usam fórmulas semelhantes em seus 2,0-litros
Nos concorrentes o fornecimento de potência é mais linear, típico de motores aspirados, mas o melhor desempenho só vem acima de 3.500 rpm. Embora a vantagem superior em 200 kg no peso — 1.294 ante 1.505 kg — lhe permita melhor relação peso-potência, o Duster perde em desempenho geral para o T6 pelo câmbio automático de apenas quatro marchas. Seus motores tornam-se um pouco ásperos e ruidosos em altas rotações (o do Renault “urra” de 4.500 rpm em diante; o do JAC tem uma faixa áspera em torno de 3.500 rpm), ainda que sejam adequados em uso normal.
As medições apontaram vantagem consistente de desempenho para o 2008, com os oponentes próximos entre si, seja em acelerações ou em retomadas
Como esperado, as medições do Best Cars apontaram vantagem consistente de desempenho para o 2008, com os oponentes próximos entre si, mas o J6 sempre à frente do Duster, seja em acelerações ou em retomadas. Como exemplo, acelerar de 0 a 100 km/h requer apenas 8,5 segundos no Peugeot, 12,5 s no JAC e 12,7 s no Renault. A mesma ordem vale para o consumo nas três condições de medição, com a maior vantagem do 2008 no trajeto rodoviário (veja os números e análise detalhada).
Único câmbio automático no trio, o do Duster deixa a desejar em calibração e refinamento: notam-se alguns solavancos nas mudanças e, em regra, ele retém marchas na faixa de 2.500 rpm quando já poderia trocá-las para menor consumo. A Renault definiu que em modo de seleção manual — feitas via alavanca, subindo marchas para frente — as trocas permaneçam automáticas para cima, no limite de rotações, e para redução ao abrir todo o acelerador.
Câmbios manuais do T6 (à esquerda) e do 2008 são leves, mas não muito precisos; o automático do Duster (à direita) precisa evoluir em calibração e número de marchas
Os manuais dos adversários são bons, mas poderiam ser mais precisos, em especial o do JAC. O que é melhor nele é o engate da marcha à ré, direto como se fosse a sexta — no Peugeot requer uso de anel-trava. O pedal de embreagem de ambos é macio, mas se estranha no T6 a dificuldade em dosar o acelerador nas saídas: é comum elevar-se a rotação mais que o necessário antes do acoplamento, fazendo um bom motorista parecer principiante.
A comparação teórica das suspensões deixaria o T6 em vantagem, pelo conceito independente multibraço na traseira ante o simples eixo de torção dos outros modelos. Mas da teoria à prática há um importante fator: calibração, ou como cada fabricante define molas, amortecedores, buchas e outros componentes do conjunto.
No mundo real, o JAC cumpre a promessa em termos de estabilidade, com atitude correta e aderência adequada dos pneus (de marca Giti, desconhecida aqui), mas decepciona em conforto. Ao primeiro rodar, os amortecedores macios passam a sensação de adequação a pisos de baixa qualidade. Todavia, qualquer irregularidade é fortemente transmitida à cabine, mostrando que as molas são duras demais, em especial as dianteiras. Em um trecho acidentado percorrido com os três carros o chinês revelou-se muito desconfortável, assim como nas lombadas que infestam as vias brasileiras.
Molas duras dão estabilidade e sacrificam o conforto no JAC; o Peugeot é o oposto, macio com prejuízo do comportamento; o Renault consegue bom compromisso entre os quesitos
No outro extremo está o 2008, que confirmou uma impressão negativa da avaliação feita no lançamento: falta carga aos amortecedores da versão THP, ou seja, são moles demais. A carroceria movimenta-se muito nos eixos longitudinal e transversal, sobretudo ao acelerar forte, quando o torque do motor ergue a frente — percebido até a mais de 100 km/h —, o que prejudica a estabilidade em curvas; a aderência dos pneus também não é expressiva. Em contrapartida, em piso irregular ele garante o maior conforto entre os três. O Duster fica no meio-termo com bom compromisso entre os dois quesitos, embora pudesse ter melhor absorção de irregularidades.
O 2008 é o único a ter controle eletrônico de estabilidade e tração, item de segurança que deveria ser mais comum em utilitários esporte. Para uso fora de estrada o controle de tração admite ajuste entre quatro programas e desativação, sistema chamado de Grip Control (leia mais). Apesar de ter faltado oportunidade para avaliá-lo dessa vez, o uso em trecho preparado com muita lama no lançamento comprovou sua utilidade.
Os três têm bons freios, com sistema antitravamento (ABS) e distribuição eletrônica entre os eixos (EBD). Duster e 2008 trazem ainda assistência adicional em frenagens de emergência, mas o Renault não usa discos na traseira. No T6 o curso longo do pedal requer movimento anormal para frenagens mais intensas. A direção com assistência elétrica do Peugeot revela o melhor acerto, com peso ideal para cada velocidade; a do Renault poderia ser mais leve em baixa velocidade, enquanto no JAC o peso em curvas de média velocidade está acima do ideal.
T6 e 2008 usam refletor elipsoidal nos faróis baixos e têm luz traseira de neblina, itens ausentes do Duster; só no chinês há regulagem elétrica do facho
Todos usam bons faróis de duplo refletor, que no T6 e no 2008 recorrem à tecnologia elipsoidal para o facho baixo. O chinês é o único a ter ajuste elétrico de altura de facho, item importante que a indústria nacional lamentavelmente tem abandonado. Repetidores laterais das luzes de direção e faróis de neblina equipam os três; luz traseira para a mesma condição, apenas os dois citados. Peugeot e Renault têm luz diurna, que usa leds no primeiro e lâmpadas halógenas no segundo.
O melhor campo visual dianteiro é do Duster, pois as colunas do 2008 obstruem mais e a do T6 são ainda piores, mas cabe destacar a sensação de ampla visibilidade do Peugeot por ter painel e capô mais baixos em relação à posição dos ocupantes. Comuns a todos são os retrovisores externos convexos, que no Renault poderiam ser mais largos.
O Peugeot sai à frente em segurança passiva ao vir com bolsas infláveis laterais nos bancos dianteiros e cortinas (que protegem ocupantes da frente e de trás), não disponíveis nos concorrentes, que se limitam às bolsas frontais obrigatórias. Por outro lado, apenas o T6 traz fixações para cadeira infantil em padrão Isofix — falta inaceitável no 2008, um projeto europeu moderno. Embora o passageiro central traseiro disponha de encosto de cabeça em todos, no Duster fica limitado ao cinto subabdominal, que deveria dar lugar a um de três pontos.
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