Polo TSI: motor turbo e transmissão sob análise

Agora com álcool, o Highline mostra-se mais eficiente e põe à prova: seria melhor se tivesse caixa DSG?

Texto e fotos: Felipe Hoffmann

 

A terceira semana de avaliação do Volkswagen Polo Highline 200 TSI (leia sobre a primeira e a segunda) teve uma novidade: o uso de álcool para levantar comparações ao uso anterior com gasolina, tanto em consumo quanto em comportamento geral. A troca de combustível traz um ganho expressivo de potência (12 cv) ao motor turboalimentado de 1,0 litro, mas não em torque máximo, que permanece de 20,4 m.kgf.

Desde o primeiro contato com o TSI, a sensação foi de grande agilidade. Foi clara a lembrança do Polo anterior com motor de 2,0 litros por sua maneira de fornecer o torque. A potência é abundante em baixos e médios regimes, mas o motor perde brilho depois de 4.500 rpm por ter um turbo pequeno. É o oposto de motores turbo dos anos 90, quando se focava em potência máxima e não agilidade no trânsito.

 

Usar álcool no motor turbo de 1,0 litro traz mais 12 cv, mas não altera o torque máximo

 

Ao conectarmos nosso aparelho de aquisição de dados Race Capture Pro, notamos que as trocas de marchas rápidas mantêm o motor em giros baixos e com pressão positiva no coletor de admissão. O turbo continua a “empurrar” ar para dentro sem a necessidade de mistura rica, isto é, excesso de combustível.

 

 

É um resultado difícil de conseguir: com pressão alta de turbo ganham-se torque e potência, mas a temperatura de trabalho aumenta muito. Para evitar danos, usa-se mais combustível para que o excesso não queimado resfrie a câmara de combustão, ao sair do estado líquido para vapor em alta temperatura. A desvantagem é que se gasta mais, com rotação baixa e pressão positiva de turbo, que com giros altos e pressão negativa na admissão. Emissões de poluentes como HC e CO também aumentam muito.

Contudo, com um motor projetado para a elevada temperatura, pode-se usar menor cilindrada (com peças menores e mais leves) com cargas maiores e sem excesso de combustível, o que melhora a eficiência e o consumo. É o que ocorre no TSI do Polo. Na figura abaixo nota-se a pressão positiva no coletor de admissão: pressão atmosférica de 99 kPa e pressão de turbo de até 210 kPa (ou seja, até 1,1 bar de pressão relativa do turbo) a 90 km/h em quinta marcha.

 

A cerca de 90 km/h (linha azul), com motor por volta de 2.300 rpm em quinta marcha (linha preta) e temperatura do ar no coletor de admissão (IAT) em 50°C (linha vermelha), a pressão do coletor de admissão (MAP) varia entre 120 e 210 kPa (linha verde), com pressão atmosférica de 99 kPa

 

A desvantagem dessa estratégia é aumentar as chances da perigosa detonação, sobretudo com gasolina. Isso obriga os calibradores a adotar avanço de ignição bem atrasado. No Polo, em diversas condições ele chega a ser negativo: cria-se a centelha apenas quando o pistão já está descendo na fase de combustão. A figura a seguir representa os mesmos dados da figura 1, mas mostra o avanço no campo negativo chegando a -10°.

 

A 90 km/h (linha azul), variações do avanço de ignição (linha vermelha) e da pressão do coletor de admissão (MAP) entre 120 e 210 kPa (linha verde), com pressão atmosférica de 99 kPa

 

Como é regra hoje, a transmissão automática é calibrada para usar a marcha mais econômica possível em função da velocidade e da potência requerida. A Volkswagen deve ter notado no mapa de consumo do motor que, nessas condições, operar com avanço negativo ainda é mais econômico que reduzir marcha e elevar a rotação.

Em condições variadas de uso, o Polo mostrou-se muito econômico com gasolina. Ao passar ao álcool, notamos que o avanço de ignição para as mesmas condições estava mais “normal”, ou seja, positivo. A característica do álcool de resfriar mais a câmara de combustão — em torno de três vezes mais que a gasolina comum —, motivo pelo qual os preparadores de motores amam tal combustível, reflete-se diretamente sobre a eficiência energética do motor. Com isso, o motor TSI é mais eficiente com álcool que com gasolina, quando descontada a diferença de poder calorífico (energia que se produz por litro) entre eles.

 

Com motor projetado para a elevada temperatura, podem-se usar cargas maiores sem excesso de combustível, o que melhora a eficiência, como no Polo TSI

 

Tal diferença é de 66% entre a gasolina atual com 27% de álcool anidro (exceto a do tipo premium, que tem 25%) e o álcool. Isso significa que, apenas pelas diferenças energéticas, um carro que faça 10 km/l com gasolina comum deveria fazer 6,6 km/l com álcool se mantivesse a eficiência. Contudo, essa relação não é válida para o Polo TSI.

Os dados oficiais de consumo pelos padrões do Inmetro apontam que na cidade ele roda 11,4 km/l com gasolina e 7,9 km/l com álcool (69,3%). Pela regra do poder calorífico ele deveria fazer 12,0 km/l com gasolina. Assim, nota-se que rodando com álcool, no ciclo-padrão, o motor é 5% mais eficiente no uso urbano e 3,6% no uso rodoviário que com gasolina. E como fica em nosso mundo real?

Nosso uso cotidiano na cidade de São Paulo abrange 72 km diários de deslocamento, com 80% do caminho pelas marginais Pinheiros e Tietê. Nesse trajeto, o Polo teve 8,6% mais eficiência energética com álcool, no mesmo dia da semana e com médias de velocidade semelhantes: 12,9 km/l ante 18,0 com gasolina, ou seja, o álcool rendeu 71,7% da gasolina. Se tivesse a mesma eficiência energética com ambos, o consumo com derivado de petróleo deveria ser de 19,5 km/l.

 

Nos destaques, o curto trecho entre o compressor do turbo e o coletor de admissão, que reduz o retardo do turbo, e uma das mangueiras do sistema que refrigera o ar que vai para admissão

 

Ao analisar outros dados do motor, não vimos grandes vantagens no complicado sistema de resfriador de ar integrado ao coletor de admissão. A ideia consiste em ter um “radiador” de água fria dentro do coletor com um sistema complexo de arrefecimento, uma vez que o líquido é o mesmo usado para resfriar o motor, mas com temperatura mais baixa. Sistemas de válvulas e bomba própria direcionam o líquido, que passa por um radiador externo (separado ao usado para refrigerar o motor) e o envia ao radiador dentro do coletor para resfriar o ar que vem do compressor do turbo.

Toda essa parafernália acaba não resfriando o ar admitido pelo motor tão bem quanto um resfriador convencional. Na figura, o gráfico mostra temperatura de admissão na casa de 50°C à velocidade de 90 km/h, ou seja, 22°C acima da ambiente de 28°C. Em todas as condições, a temperatura sempre esteve pelo menos 18°C acima da ambiente. Para efeitos comparativos, na Fiat Toro Diesel não vimos a temperatura exceder 4°C em relação à ambiente, algo comum em carros com resfriador.

 

 

O motivo da alta temperatura do Polo é que o radiador responsável pelo resfriador fica atrás do radiador do motor, de modo que recebe ar já aquecido. Em geral o resfriador fica na frente do radiador, recebendo ar fresco da grade dianteira. A Volkswagen justifica sua escolha por duas razões. Uma, o trecho bem curto entre o turbo e o coletor de admissão, que reduz o tempo de retardo do turbo — de outro modo, o ar que sai do turbo daria toda a volta pela parte da frente do carro, passando num resfriador de grande volume. Outra é manter a bomba d’água elétrica desse sistema ligada mesmo quando o motor desliga, pois o mesmo circuito é usado para refrigerar o turbo; isso o protege de possíveis desgastes a longo prazo.

O arranjo do Polo, porém, sacrifica a eficiência do motor, por trabalhar com temperatura de admissão mais alta e menor avanço de ignição. Também impacta o custo de produção e deixa receio quanto à manutenção quando o carro estiver com anos de uso, sobretudo com líquido de arrefecimento errado ou sem substituição, criando depósitos que causam entupimentos e transtornos.

Próxima parte

 

No mesmo trajeto urbano o Polo com álcool fez 72% do rendimento da gasolina, sinal de que o motor TSI obtém maior eficiência com o combustível vegetal

 

Caixa automática: melhor que a DSG?

Na primeira matéria do Polo prometemos abordar a transmissão automática Aisin de seis marchas. Com ela, tivemos boas surpresas e algumas nem tanto. A caixa AQ250, a mesma que equipa o Golf nacional desde 2008, ainda usa a seleção das posições (P, R, N, D) por cabo, apesar do gerenciamento eletrônico; hoje o habitual é o acionamento elétrico. Se não é das mais eficientes, de certa forma está compensada pelo motor moderno.

Como explicado na consulta sobre a decadência das caixas de dupla embreagem, sua grande vantagem — senão a única — em relação às automáticas epicicloidais com conversor de torque é a melhor eficiência, próxima à de uma caixa manual. De resto, a automática convencional mostra-se uma solução tão boa quanto, e com vantagens.

 

 

A caixa convencional é superior em tempo de troca em reduções, em especial em marchas que na DSG estariam no mesmo conjunto de embreagem. A resposta ao baixar de sexta para quarta, ou de quinta para terceira, é muito rápida no Polo — bem mais do que seria com dupla embreagem. Nas trocas para cima, a queda instantânea do ponteiro do conta-giros prova que tais trocas são tão rápidas quanto ao da DSG.

Outra vantagem: o conversor de torque faz ótimo “casamento” com o motor turbo ao multiplicar o torque entregue às rodas toda vez que está “patinando” — embora com perda de eficiência, ou seja, maior consumo. Essa multiplicação chega ao dobro quando o motor está girando e as rodas estão paradas, como ao arrancar. Isso é muito bem-vindo para motores de baixa cilindrada, com pouco torque em marcha-lenta, pois garante o “pulo” inicial numa saída de farol, por exemplo.

 

Nos destaques da transmissão, o acionamento da seleção de P, R, N e D por cabo (em cima) e o sensor de posição selecionada (embaixo)

 

Além disso, a “patinação” na saída assegura que o turbo “encha” mais rápido, por deixar o motor em rotação mais alta: o turbo entra no momento em que a multiplicação do conversor decai.
Como resultado, a saída do Polo TSI parece a de um carro com o dobro de sua cilindrada. Como o turbo já está “cheio” a 1.500 rpm, a transmissão troca de marcha bem cedo e garante uma aceleração vigorosa e constante. O conversor de torque ainda trabalha como um “amortecedor” quando os conjuntos de embreagens das engrenagens estão desacoplando e acoplando.

No entanto, conversor patinando prejudica o consumo. Por isso, depois de certa condição o bloqueio (lock-up) do conversor entra em ação: grosso modo, conecta a transmissão ao motor diretamente através de uma embreagem e elimina a atuação do conversor. A Volkswagen divulga usar o bloqueio a partir de 30 km/h, em drive, mas em alguns momentos se nota o uso do conversor para melhor dirigibilidade.

 

A “patinação” do conversor na saída assegura que o turbo “encha” mais rápido: como resultado, a saída do Polo parece a de um carro com o dobro de sua cilindrada

 

Por exemplo, entre 50 e 60 km/h em terceira marcha, ao pisar mais fundo o motor sobe algo como 500 rpm, mas não reduz marcha: isso garante uma retomada mais rápida, em parte pela maior potência, em parte pela multiplicação de torque pelo conversor. Percebe-se o mesmo efeito em ladeiras em segunda e terceira marchas. Antes de reduzir a caixa “ativa” o conversor, patinando para ver se o motor dá conta da subida, com resposta mais rápida e confortável que se houvesse redução.

A transmissão está dotada de controle de neutro ou ponto-morto: passa automaticamente a neutro (mantendo a alavanca em D) ao parar o veículo e manter o pedal de freio acionado. E não o faz pelo simples acionamento do pedal, mas pela variação da pressão da linha de freio: o objetivo é evitar a mudança inoportuna quando se pisa no freio durante uma breve parada ou manobra.

Tal controle mostra-se muito útil num motor de três cilindros, que vibra mais em marcha-lenta, ainda mais sob carga. Basta notar a vibração quando se alivia a pressão ao pedal ou se usa apenas o freio de estacionamento: a caixa engata a primeira marcha e aumenta o torque do motor, o que traz vibração. Outra estratégia interessante é a caixa sair em segunda marcha em aceleração lenta, típica de engarrafamento, a fim de economizar combustível. Caso se pise com mais vigor no acelerador, a primeira marcha é rapidamente selecionada.

 

A transmissão Aisin é a mesma desde o Golf 2008 e poderia melhorar em calibração, mas tem vantagens consistentes sobre a DSG de dupla embreagem

 

O que não agradou na transmissão do Polo? São pontos de refinamento da calibração. Falta suavidade a algumas trocas de marchas, como para segunda e terceira, em certas ocasiões — para quarta a mudança é imperceptível. Também se notam trocas mais abruptas no modo manual, como se não desligasse o bloqueio do conversor, mas pode ter sido proposital para o motorista sentir que está no comando das marchas.

Outro incômodo é a redução inesperada quando se está a 50-60 km/h em quarta marcha, entra-se numa leve descida e se tira o pé do acelerador. A central entende que há necessidade de freio-motor (mesmo sem se pisar no pedal de freio), reduz para terceira e tira o embalo que o motorista gostaria de manter, obrigando-o a acelerar de novo e gastando mais combustível. Seria preferível só reduzir marcha nessa condição se houvesse sinal do pedal de freio, algo que se nota em velocidades mais altas.

 

 

Nada grave, porém. Refinamentos de calibração para motor e caixa são comuns em carros recém-lançados, pois situações que só acontecem no mundo real obrigam os fabricantes a lançar atualizações, que são implementadas durante as revisões sem que o cliente saiba.

A semana terminou com 483 km rodados, todos em cidade e com álcool. O consumo médio geral foi de 10,8 km/l, com melhor trecho de 12,9 km/l (à média de 40 km/h) e pior de 5,7 km/l (média de 14 km/h). Na quarta e última semana do Polo, teremos uma viagem ao interior de São Paulo e análises do comportamento dinâmico. Antes de ser devolvida à fábrica, a “mostarda atômica” — seu carinhoso apelido dentro da equipe — passará também pela habitual análise técnica em oficina. Até lá.

Semana anterior

 

Terceira semana

Distância percorrida 483 km
Distância em cidade 483 km
Distância em rodovia 0
Consumo médio geral 10,8 km/l
Consumo médio em cidade 10,8 km/l
Consumo médio em rodovia
Melhor média 12,9 km/l
Pior média 5,7 km/l
Dados do computador de bordo com álcool

 

Desde o início

Distância percorrida 1.586 km
Distância em cidade 1.202 km
Distância em rodovia 384 km
Gasolina:
Consumo médio geral 14,3 km/l
Consumo médio em cidade 14,2 km/l
Consumo médio em rodovia 14,4 km/l
Melhor média 18,0 km/l
Pior média 9,4 km/l
Álcool:
Consumo médio geral 10,8 km/l
Consumo médio em cidade 10,8 km/l
Consumo médio em rodovia
Melhor média 12,9 km/l
Pior média 5,7 km/l
Dados do computador de bordo

 

Preços

Sem opcionais R$ 69.190
Como avaliado R$ 73.990
Completo R$ 76.240
Preços sugeridos em 27/2/18

 

Ficha técnica

Motor
Posição transversal
Cilindros 3 em linha
Comando de válvulas duplo no cabeçote
Válvulas por cilindro 4, variação de tempo
Diâmetro e curso 74,5 x 76,4 mm
Cilindrada 999 cm³
Taxa de compressão 11,5:1
Alimentação injeção direta, turbocompressor, resfriador de ar
Potência máxima (gas./álc.) 116/128 cv a 5.500 rpm
Torque máximo (gas./álc.) 20,4 m.kgf de 2.000 a 3.500 rpm
Transmissão
Tipo de caixa e marchas automática, 6
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco ventilado
Traseiros a disco
Antitravamento (ABS) sim
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência elétrica
Suspensão
Dianteira independente, McPherson, mola helicoidal
Traseira eixo de torção, mola helicoidal
Rodas
Dimensões 6,5 x 17 pol*
Pneus 205/50 R 17*
Dimensões
Comprimento 4,057 m
Largura 1,751 m
Altura 1,468 m
Entre-eixos 2,565 m
Capacidades e peso
Tanque de combustível 52 l
Compartimento de bagagem 300 l
Peso em ordem de marcha 1.147 kg
Desempenho (gas./álc.)
Velocidade máxima 187/192 km/h
Aceleração de 0 a 100 km/h 10,1/9,6 km/l
Consumo em cidade 11,6/8,0 km/l
Consumo em rodovia 14,1/9,8 km/l
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro; *opcionais

 

Sair da versão mobile