Primeiro com compressor na versão G60, depois com o VR6,
sucessor do Scirocco deu seguimento a uma série de sucesso
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Desenvolver modelos esportivos a partir da plataforma de automóveis produzidos em grande volume, aproveitando tantos componentes quanto possível, sempre foi uma estratégia bem-sucedida em fabricantes como a Volkswagen. O Karmann Ghia havia nascido dessa proposta na década de 1950, usando o chassi-plataforma e o motor do Fusca, e a mesma regra foi aplicada nos anos 70 e 80 a duas gerações do Scirocco usando a arquitetura do Golf.
Quando o segundo Scirocco estava envelhecendo, a VW passou a trabalhar em seu sucessor com um novo nome: Corrado, derivado do verbo correr em espanhol. A Karmann Coachworks, construtora de carrocerias na cidade alemã de Osnabrück, foi mais uma vez encarregada da produção do monobloco do esportivo, mantendo um trabalho já executado com o Fusca conversível, o Karmann Ghia, o Scirocco e o Porsche-VW 914.
Um estilo moderno e atraente, dentro dos padrões retilíneos daquele período, marcava a estreia do Corrado em outubro de 1988. As formas guardavam semelhanças com as do Passat apresentado em março do mesmo ano, como o padrão de lanternas traseiras e para-choques, mas o hatchback de três portas — que alguns consideram um cupê — tinha a própria identidade. O desenho era acima de tudo robusto, encorpado, transmitindo solidez e conseguia boa aerodinâmica com o Cx 0,32. Detalhe chamativo era o aerofólio traseiro que se erguia ao alcançar a velocidade de 70 km/h, permanecendo discreto junto à terceira porta no restante do tempo. Não era mero artifício estético, pois quando elevado reduzia em 64% a sustentação da traseira.
Embora baseado no segundo Golf, o Corrado lembrava o terceiro Passat em vários
detalhes de estilo; o aerofólio traseiro móvel em velocidade era um item peculiar
O Corrado era um pouco maior que o Golf de segunda geração, do qual usava a plataforma, com comprimento de 4,05 metros e largura de 1,67 m, mas era mais baixo (1,32 m) e mantinha sua distância entre eixos de 2,47 m. O peso da versão mais potente era de 1.115 kg. O interior de quatro lugares se associava facilmente ao do Passat, com um desenho funcional tipicamente alemão. De acordo com a versão e o mercado, estavam disponíveis itens convenientes como computador de bordo, controlador de velocidade, ar-condicionado, volante revestido em couro, teto solar, bancos aquecidos e revestimento interno em couro.
Venceu até o Porsche no comparativo: “Tem mais aderência e tração que o 944, direção com melhores respostas e uma estabilidade direcional impecável”
Sob o capô, duas versões do conhecido motor de quatro cilindros e 1,8 litro estavam disponíveis. O Corrado 16V vinha com duplo comando, quatro válvulas por cilindro e injeção eletrônica para desenvolver a potência de 136 cv e o torque de 17,1 m.kgf. A estrela era mesmo a versão G60, que identificava o uso de um compressor em forma de caracol (ou da letra “G”) para obter 160 cv e 22,9 m.kgf, embora tivesse apenas um comando e duas válvulas por cilindro. Capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em 7,5 segundos e alcançar a velocidade máxima de 225 km/h, o G60 conquistava pelo fornecimento de potência desde baixas rotações, simulando um motor de maior cilindrada.
Com alguns componentes do Passat, como o eixo traseiro, a mecânica do Corrado recorria a receitas comprovadas: motor transversal com tração dianteira, câmbio manual de cinco marchas, freios a disco (ventilados à frente) com sistema antitravamento (ABS) opcional, suspensão dianteira independente McPherson e traseira por eixo de torção. As rodas de 15 pol usavam pneus 185/55 ou 195/50.
O interior também remetia ao do Passat, mas o entre-eixos era o do Golf; dos motores
de 1,8 litro da fase inicial, o destaque era o G60 com compressor, que obtinha 160 cv
A revista inglesa Car colocou o G60 lado a lado com o Audi Coupe Quattro da linha 80 e o Porsche 944. O desempenho do VW impressionou com a velocidade máxima mais alta e aceleração de 0 a 96 km/h em 8 segundos, só 0,1 s atrás do mais rápido do grupo, o Porsche: “Este quatro-cilindros com jeito de turbina é um motor inesperado para um carro esporte, pois fornece plenas respostas em baixas para médias rotações antes de começar a perder o fôlego acima de 4.500 rpm. No Corrado, você tem sempre potência suficiente — mesmo a 2.000 rpm em quinta —, mas o preço que paga por isso é um ruído constante e onipresente”.
O comportamento dinâmico também foi elogiado: “Em curvas fechadas, o 944 não é tão ágil quanto o Corrado. Sob potência o VW eventualmente subesterça, mas reage obediente ao alívio do acelerador. Tem mais aderência e tração que o 944, direção com melhores respostas e uma estabilidade direcional impecável”. E foi com o Porsche a disputa pelo primeiro lugar: “No fim, o 944 vem em segundo, apesar do melhorado motor de 2,7 litros e o nome de prestígio. Ele tem um câmbio muito melhor que o do Corrado e painel mais agradável, mas, pelo custo adicional, não oferece mais desempenho e no departamento de chassi o VW está à frente”.
As vendas nos EUA começavam em 1990, seguidas um ano depois pela oferta de uma caixa de câmbio automática de quatro marchas. A linha 1992 trazia uma importante adição: o motor VR6, um seis-cilindros com “V” estreito (15 graus) entre as bancadas, ideal para instalação transversal por sua reduzida largura em comparação aos V6 mais comuns. A unidade de 2,9 litros e duas válvulas por cilindro fornecia 178 cv e torque de 24,5 m.kgf (do qual 85% estavam presentes de 2.000 a 6.000 rpm), valores que se traduziam em máxima de 225 km/h e 0-100 em 7,1 segundos. Juntos dela vinham controle eletrônico de tração e rodas BBS com pneus 205/50 R 15.
O motor VR6 de 2,9 litros, um V6 com ângulo fechado para instalação transversal,
trazia 178 cv ao Corrado em 1992 e o deixava 2 segundos mais rápido no 0-100 km/h
No mercado norte-americano a versão era chamada de SLC, sigla para Sports Luxury Coupe ou cupê esportivo de luxo, e substituía a G60. Lá, a revista Road & Track aprovou a novidade: “O VR6 lança o Corrado no nível de desempenho do Nissan 300 ZX e do BMW 325i. Não só é 2 segundos mais rápido de 0 a 96 km/h que o G60, mas também supera os tempos do Z e do 325. Apesar do ajuste da suspensão para melhorar o conforto e um ganho de peso de 50 kg, o novo Corrado tem um comportamento quase tão preciso quanto o do G60. Pode ser atirado com confiança nas curvas”.
O VR6 enfrentou Ford Escort RS Cosworth e Vauxhall (Opel) Calibra Turbo na Car, em 1992, e saiu-se bem apesar de ser o menos potente e o mais lento em aceleração: “O Corrado é um carro notavelmente integrado. As respostas do motor são sempre bem dispostas, enquanto no Calibra e (sobretudo) no Escort há momentos em que os motores estão fora da ação dos turbos. O VR6 empurra tão bem a baixas rotações que você pode pular marchas na cidade. Ele é mais suave, mas na faixa média de giros o Calibra supera o Corrado”.
“A direção do VW também é bem ajustada”, acrescentou a revista. “Ele não tem a aderência do Ford, mas se comporta com quase a mesma finesse. O esterçamento por torque está praticamente ausente, apesar dos 190 cv com tração dianteira. Sua cabine é confortável e conveniente”. Ao fim do confronto, a Car considerou o Corrado “uma absoluta joia de carro, amigável, fácil de levar, precisa quando deve, mas doce e graciosa mesmo sob enorme pressão”. O Escort venceu, porém, por suas vantagens como carro esportivo.
Nos EUA, um amplo comparativo da Car and Driver em 1992 terminou com o Corrado G60 empatado em quinto lugar com o Ford Probe GT, à frente do Toyota Celica GT-S e do Isuzu Impulse RS, mas atrás de Nissan 240 SX SE, Acura Integra GS-R, Honda Prelude Si e Eagle Talon TSi, este o vencedor. A revista definiu o VW como “melhor que a soma de suas partes; bonito, rápido e estável, com seu próprio e único tempero. Falta-lhe o polimento dos carros que o venceram, e nosso modelo de US$ 22 mil parece fraco em relação custo-benefício. Mas sua personalidade alemã é forte, e isso pode ser suficiente para convencer os fiéis”.
A Karmann fez um protótipo de conversível, mas a versão não chegou à produção;
outro Corrado especial foi o Magnum Sport Kombi, em forma de perua esportiva
Um rejuvenescimento do interior vinha em 1993 com novos quadro de instrumentos e comandos de ventilação, além da opção de toca-CDs com armazenador no porta-malas. O teto solar já vinha de série e o tanque de combustível fora ampliado. O motor da versão 16V passava a ser um 2,0-litros, o que trazia maior torque (18,3 m.kgf), mantendo a potência de 136 cv. Dois anos depois, a revista inglesa Top Gear comparava o VR6 ao Fiat Coupé, o Honda Prelude e o Nissan 200 SX e concluía: “O Corrado sente-se ultrapassado, mas ainda sai à frente do Honda. É bem mais divertido de dirigir e você pode realmente levar mais dois adultos atrás”. Perdeu, porém, para os mais modernos Nissan e Fiat.
A Karmann chegou a construir um Corrado conversível, de apenas dois lugares, mas o projeto não foi adiante — mesmo assim, transformação similar foi oferecida pela Zender alemã. Outra adaptação de carroceria bastante curiosa foi a Magnum Sport Kombi, com dois protótipos desenvolvidos pela empresa germânica Marold Automobil GmbH para a VW. A perua esportiva de três portas não tinha grande equilíbrio de linhas, mas mostrava o charme das shooting brakes. O Corrado teve também sua importação para o Brasil estudada pela VW, o que não se concretizou.
O ano-modelo 1994 foi o último nos EUA, mas a Europa continuou a vê-lo nas concessionárias até o ano seguinte, quando apareceu a edição limitada Storm, de 500 unidades, com bancos de couro, teto solar, sistema de áudio especial e o motor VR6 com 190 cv e 25 m.kgf. Nos quase sete anos de produção, saíram da linha da Karmann 97.521 Corrados.
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