Dia a Dia: motor do VW Up convence no Fox BlueMotion

 

Ágil para um 1,0-litro e muito econômico, o primeiro VW
de três cilindros cativa ao volante, mas deveria custar menos

Texto e fotos: Fabrício Samahá

 

Na linha europeia da Volkswagen, as versões BlueMotion ocupam desde 2006 a posição de carros ambientalmente corretos, com diferenças técnicas voltadas à redução de consumo de combustível e de emissão de gás carbônico. No Brasil, o fabricante experimentou adotar a mesma estratégia em duas versões com motor de 1,6 litro — uma do Polo, lançada em 2009, e outra do Fox, apresentada no ano passado —, mas os resultados foram muito tímidos em termos de vendas. Poucos se convenceram a pagar mais na compra por uma economia que levaria anos para amortizar a diferença.

O carro que vem mudar esse quadro e colocar o logotipo BlueMotion em quantidade em nossas ruas é outro Fox, com uma grande novidade: o primeiro motor de três cilindros da Volkswagen no Brasil, destinado a equipar o carro pequeno Up, que deve ser lançado ainda este ano. Por um valor 2% mais alto que o do conhecido Fox de quatro cilindros e 1,0 litro, o BlueMotion oferece mais potência, menor consumo e uma unidade bem mais moderna sob o capô, que o Best Cars colocou sob avaliação em Dia a Dia.

Tanto o motor quanto as demais alterações técnicas foram descritos em detalhes em nosso primeiro contato com o novo Fox, pelo que vamos direto ao que interessa: como ele anda nas situações cotidianas nas quais avaliamos todos os carros.

 

 
Grade mais fechada, rodas de 14 pol e logotipos são as poucas diferenças externas
do BlueMotion para o Fox conhecido: a grande novidade está mesmo sob o capô

 

Resposta rápida: muito bem. Fazia tempo que um motor de 1,0 litro não nos convencia tanto de sua viabilidade para qualquer condição de uso, mesmo em se tratando de um carro de certo peso (993 kg) e dotado de itens de conforto como ar-condicionado e direção assistida. O mérito é tanto do valente motor quanto do conjunto bem adequado para sua adoção, como relações de transmissão, pneus e suspensão. Mas vamos por partes.

 

O Fox arranca com vivacidade, sem a preguiça tão comum nos 1,0-litro, e acompanha o tráfego ou mesmo se adianta a ele sem demonstrar esforço

 

Ao ligar o motor EA211, usando a partida assistida (basta um rápido giro da chave para que o motor de partida funcione pelo tempo necessário), nota-se o único aspecto algo estranho do novo Fox: a marcha-lenta, mesmo perto de 1.000 rpm, produz um leve “balanço” parecido com o que se nota em um quatro-cilindros quando a rotação está baixa demais, próxima de apagar o motor. Pode chamar a atenção, mas não incomoda. E depois?

Depois o Fox arranca com vivacidade, sem a preguiça tão comum em modelos de sua cilindrada. A VW anuncia que 85% do torque máximo estão disponíveis já a 2.000 rpm, apesar das quatro válvulas por cilindro, e basta dirigir o carro para acreditar. Ele acompanha o tráfego ou mesmo se adianta a ele sem demonstrar esforço, com ruído moderado —  um ronco discreto e agradável — e praticamente nenhuma vibração, mesmo quando levado ao limite de 6.800 rpm, embora os pedais vibrem um pouco em rotações médias. Para nós seria preferível uma primeira marcha mais longa, pois “acaba” muito rápido em saídas mais enérgicas, mas a fábrica deve ter considerado questões como a topografia rigorosa de muitas cidades do País.

 

 
Isento de vibrações, com ruído moderado e agradável e boa disposição mesmo em
rotações baixas, o motor dá novo vigor a um carro que decepcionava em desempenho

 

Nos cerca de 400 quilômetros rodados em rodovias, o BlueMotion continuou a nos convencer da viabilidade de usar um Fox de 1,0 litro para esse fim, algo impensável com o antigo e insuficiente motor. Manter 120 km/h (o que produz 3.800 rpm em quinta) ou mesmo um pouco mais não implica ruídos incômodos, evidência de um ótimo trabalho de isolamento por parte da fábrica. Ganhos de velocidade nessa faixa são demorados, como se espera de um carro de 75 cv (foi dirigido apenas com gasolina; com álcool tem 82) com área frontal expressiva, mas quem quiser andar realmente rápido não sentirá qualquer esforço do pequeno motor: ele parece feito para passar o dia à velocidade máxima do carro, como se estivesse na Alemanha.

Se em desempenho o Fox de três cilindros impressiona bem, em consumo ele surpreende. Embora não tenha passado por nossa simulação, apresentou índices muito convincentes no computador de bordo, como 17 km/l em viagem à média de 120 km/h, 20 km/l em trecho de rodovia de baixa velocidade (com muitas lombadas) e 16,5 km/l na média geral da avaliação, incluído o uso urbano e ar-condicionado ligado em metade do tempo — sempre com gasolina. Assim, não é difícil fazer o tanque de 50 litros render mais de 800 km em viagens. Imaginamos como seria com um câmbio mais longo, calculado para velocidade máxima em quarta, mas a VW mais uma vez parece ter dado prioridade à agilidade.

Sabe-se que parte dessa economia foi obtida com alterações como pneus mais estreitos, com composto de baixa resistência ao rolamento e maior pressão de enchimento, e assistência eletro-hidráulica de direção em vez de hidráulica. Os pneus mais cheios tendem a transmitir mais irregularidades à suspensão e, para que isso não sacrificasse o conforto, a VW deixou os amortecedores mais macios. Como ficou tudo isso?

 

 
Compacto e com soluções técnicas muito modernas, o três-cilindros consegue ótimas
marcas de consumo; o comando de câmbio permanece um destaque do modelo

 

Sobre os pneus (Goodyear GPS Duraplus no carro avaliado), é claro que passar da medida 195/55 R 15 para a 175/70 R 14 significa menos borracha em contato com o solo e maior perfil lateral, mas o BlueMotion oferece estabilidade bastante adequada para sua proposta e pode ser dirigido como qualquer carro de sua categoria. Na verdade é o Fox de quatro cilindros que tem pneus largos e de perfil baixo em excesso, por questões de aparência, e não o três-cilindros que os tem de menos. Além disso, a maior pressão contribui para o comportamento em curvas e a precisão da direção; contudo, os pneus mostraram maior aspereza que a habitual.

 

 

A direção revela calibração bem acertada, leve em baixa velocidade e precisa em alta — tão boa quanto as de assistência elétrica, sistema que a VW deve ter preterido por questões de custo. Quanto aos amortecedores mais suaves, trouxeram ganhos e perdas. Seu benefício foi compensar bem a alta pressão dos pneus, fazendo desse o Fox mais confortável que já dirigimos (o perfil alto certamente ajuda, pois os outros tinham os 195/55 R 15). Apenas as molas duras ainda se fazem notar em condições como emendas salientes de pontes. A parte negativa é que os amortecedores controlam pouco os movimentos em alta velocidade e, associados à grande altura do modelo, o tornam algo sensível a ventos laterais. Não é um carro que transmita imediata confiança em seu comportamento como outros da marca.

De resto, o BlueMotion mantém o câmbio manual que é uma das referências do mercado por sua leveza e precisão de comando, embora não apreciemos a forma de engate da ré, apertando a alavanca antes de mover à frente e à esquerda. Seria interessante oferecer nessa versão o câmbio automatizado ASG, uma forma de dispensar o pedal de embreagem sem implicar perdas em desempenho e consumo.

 

 
A renovação interna de 2009 deixou o Fox agradável, embora ainda simples, mas não
resolveu falhas de projeto como pedais muito à direita e largas colunas dianteiras

 

Por fora e por dentro

Apesar de se tratar de um velho conhecido dos brasileiros — está para completar 10 anos de mercado —, o Fox merece uma análise detalhada pelo tempo decorrido desde que o avaliamos pela última vez. Na parte externa as diferenças do BlueMotion são poucas: grade dianteira mais fechada, novas calotas, os logotipos da versão na frente e na traseira. Por dentro, o tecido de revestimento dos bancos com tom levemente azulado é a principal alteração.

O interior beneficia-se da ampla reforma apresentada em 2009, quando o painel evoluiu muito em forma e função e o acabamento melhorou, estando hoje bem situado dentro de sua categoria. O quadro de instrumentos, bem legível, traz um mostrador central que serve para velocímetro digital (o que todo carro deveria ter), computador de bordo com duas medições, indicador gráfico de consumo instantâneo, mensagens de alerta, monitor de manutenção (com avisos separados para o momento de trocar óleo e os diversos filtros, conforme escolha do usuário), alerta programável para excesso de velocidade e configurações em geral.

Próxima parte

 

 

 
Espaço interno e a conveniência do banco traseiro corrediço, que pode ser ajustado para
dar mais espaço às pernas ou à bagagem, são bons argumentos que o Fox conserva

 

É também ali que aparecem as mensagens do sistema Eco Comfort, que avisam para não acelerar com o carro parado ou fechar janelas com o ar-condicionado ligado, entre outros (cada tipo de alerta pode ser ou não ativado). A VW incluiu ainda um mostrador da marcha em uso que sugere reduções e mudanças para cima (até mesmo “pulando” marchas) de forma inteligente: nota-se que ele aprova o uso do método carga, com acelerador bem aberto em baixa rotação, assim como recomenda subir marcha tão logo o giro aumente com pouca pressão do pé direito. Um aliado da economia, sem dúvida. De “pé embaixo” o indicador se acende a 6.000 rpm.

A esse bom recurso aliam-se outros, como controle elétrico dos vidros com temporizador e abertura/fechamento a distância (difícil entender por que só os dianteiros têm função um-toque, já que existe sensor antiesmagamento nos quatro para permitir o fechamento geral), alarme com ultrassom, bons faróis de duplo refletor, repetidores de luzes de direção nos retrovisores, faróis e luz traseira de neblina, rádio/toca-CDs/MP3 com diversas conexões (USB, auxiliar, para cartão SD e interface Bluetooth para telefone celular), para-sóis com espelhos iluminados, indicador de temperatura externa, porta-garrafas nas quatro portas e três encostos de cabeça no banco traseiro (falta o cinto de três pontos para o passageiro central).

A VW também aprimorou detalhes nos últimos anos, como os comandos de ar-condicionado, cujas luzes indicadoras mal podiam ser vistas durante o dia; a iluminação dos instrumentos, antes em azul e vermelho (sem o devido contraste ao fundo preto) e agora permanente em branco; e os sensores de estacionamento na traseira, pois hoje o painel do rádio indica a posição dos obstáculos. Alteração discutível foi a dos comandos de faróis, que passaram da alavanca de luzes de direção para o painel — há quem ache o arranjo anterior mais prático.

 

 
Os bancos acomodam bem, mas o de trás deveria ser bipartido; no quadro de
instrumentos, iluminação permanente e o prático repetidor digital do velocímetro

 

O que poderia estar na lista para as próximas melhorias? Mais espaço para objetos no console central, faixa degradê no para-brisa e uma maçaneta para a quinta porta, que só pode ser aberta com a chave ou pelo controle remoto (ativo apenas com a chave fora do miolo de ignição). Outras falhas bem conhecidas do Fox talvez tenham de esperar sua próxima geração. É o caso dos pedais deslocados à direita, que tornam menos cômoda uma posição de dirigir que no restante agrada — há até regulagens do volante em altura e distância, item não comum na classe. Ou das colunas dianteiras avançadas e muito largas em sua base, que prejudicam a visibilidade, ou ainda do limpador de para-brisa, cuja palheta direita termina seu curso bem no centro do campo visual do motorista.

 

O mostrador sugere mudanças de marcha para cima de forma inteligente: nota-se que ele aprova o uso de acelerador bem aberto em baixa rotação

 

Em contrapartida, o espaço interno é dos mais amplos entre nossos carros pequenos (restrito apenas em largura atrás, como esperado) e o banco traseiro com ajuste longitudinal representa conveniência, pois se pode privilegiar a acomodação das pernas dos passageiros no dia a dia e, quando for viajar, avançar o assento a fim de ganhar espaço para bagagem. A capacidade varia entre 260 e 353 litros conforme a posição do banco; no entanto, este é inteiriço e impede o rebatimento de apenas 1/3 ou 2/3.

Os preços sugeridos do Fox BlueMotion partem de R$ 32.590 com três portas e R$ 34.090 com cinco, em torno de 2% a mais que no 1,0-litro de quatro cilindros. Os equipamentos de série passam por direção assistida, computador de bordo, bolsas infláveis frontais, freios com sistema antitravamento (ABS), banco do motorista com regulagem de altura, chave tipo canivete, conta-giros, para-sóis com espelho e desembaçador, lavador e limpador do vidro traseiro.

 

 
Alertas para manutenção, para excesso de velocidade e para ações que não favorecem
o consumo podem ser configurados; novo rádio mostra proximidade de obstáculos

 

Opcionais são muitos e levam aqueles preços às alturas. O cinco-portas avaliado vinha com os pacotes I-Trend BlueMotion (faróis de duplo refletor, repetidores de luzes de direção, para-sóis iluminados, o rádio citado), Conforto Completo (ar-condicionado, controle elétrico dos vidros, travas e retrovisores, comando a distância de travamento, alarme e luzes de leitura, entre outros), Funcional II (banco traseiro corrediço com três encostos de cabeça, volante ajustável), faróis e lanterna de neblina, sensores de estacionamento traseiros e pintura metálica.

 

 

Tudo somado, chega-se a R$ 43.013, preço alto demais para um carro de 1,0 litro sem qualquer luxo e com 10 anos de produção. Mesmo retirando a pintura especial, na faixa de valor do Fox encontram-se modelos mais modernos com conteúdo similar e motorização superior, como o Citroën C3 Origine de 1,45 litro (que acrescenta bancos de couro, mas não vem com rádio, e custa R$ 40 mil), o Ford Fiesta SE de 1,5 litro (que vem ainda com rodas de alumínio e fixação Isofix para cadeiras infantis por R$ 42.490) e o Peugeot 208 Active Pack de 1,45 litro (com rodas e navegador em tela tátil por R$ 43 mil).

O Dia a Dia com a nova versão do Fox não deixou dúvidas: o motor de três cilindros da VW é bom o bastante para substituir o quatro-cilindros e motorizar com grandes qualidades toda a família de 1,0 litro — do futuro Up ao Fox, passando por Gol e Voyage. Chega a fazer qualquer pessoa rever a objeção adquirida durante anos, e com razão, aos carros dessa cilindrada. Quanto ao automóvel que ele equipa, é ainda um bom produto, mas deveria custar menos para se manter competitivo em um segmento em rápida renovação.

 

Ficha técnica

Motor
Posição transversal
Cilindros 3 em linha
Comando de válvulas duplo no cabeçote
Válvulas por cilindro 4, variação de tempo
Diâmetro e curso 74,5 x 76,4 mm
Cilindrada 999 cm3
Taxa de compressão 11,5:1
Alimentação injeção multiponto sequencial
Potência máxima (gas./álc.) 75/82 cv a 6.250 rpm
Torque máximo (gas./álc.) 9,7/10,4 m.kgf da 3.000 rpm
Transmissão
Tipo de câmbio e marchas manual / 5
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco ventilado
Traseiros a tambor
Antitravamento (ABS) sim
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência eletro-hidráulica
Suspensão
Dianteira independente, McPherson, mola helicoidal
Traseira eixo de torção, mola helicoidal
Rodas
Dimensões 5 x 14 pol
Pneus 175/70 R 14
Dimensões
Comprimento 3,823 m
Largura 1,657 m
Altura 1,545 m
Entre-eixos 2,465 m
Capacidades e peso
Tanque de combustível 50 l
Compartimento de bagagem 260 a 353 l (conforme ajuste do banco)
Peso em ordem de marcha 993 kg
Desempenho
Velocidade máxima (gas./álc.) 166/167 km/h
Aceleração de 0 a 100 km/h (gas./álc.) 13,5/13,2 s
Consumo em cidade 12,7/8,8 km/l
Consumo em rodovia 14,7/9,9 km/l
Dados do fabricante; consumo conforme Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular

 

 

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