Ao contrário do brasileiro, o norte-americano atuou em diferentes categorias, teve grande família e opções de potência muito variadas
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Muitos brasileiros lembram-se com saudades do Dodge Dart, um dos maiores automóveis já fabricados aqui. Feito entre 1969 e 1981, ele deu origem a uma linha variada de cupês e sedãs com motor V8 de 5,2 litros, o de maior cilindrada usado em um carro nacional. Nos Estados Unidos, porém, o Dart teve uma história mais longa e representou um modelo grande, médio ou compacto (de acordo com a geração) pelos critérios locais.
Embora o nome Dart (dardo em inglês) já tivesse sido empregado em um carro-conceito de 1957 do estúdio italiano Ghia, foi em novembro de 1959 que o Dart chegou ao mercado como modelo 1960. Era uma versão mais curta, simples e barata dos carros grandes da marca, destinada a substituir os modelos da Plymouth em suas concessionárias: esta marca havia conquistado independência e uma rede própria. Na hierarquia do grupo a divisão Chrysler era a mais requintada, e a Plymouth, a mais simples.
Com linhas imponentes — quatro faróis elevados, para-choques volumosos, aletas nos para-lamas traseiros —, o Dart media 5,35 metros de comprimento e 3 m de distância entre eixos e podia vir como sedã de duas e quatro portas, hardtop de duas portas e perua de cinco portas e até nove lugares (esta com entre-eixos 10 cm maior), com acabamentos Seneca, Pioneer e Phoenix. No interior, os bancos dianteiros giravam de forma automática ao se abria a porta de seu lado para facilitar a entrada e a saída.
Lançado para 1960 com diferentes carrocerias, o Dart era reestilizado no ano seguinte e para 1962 já trocava de plataforma, ganhando o hardtop de quatro portas
Estavam disponíveis quatro motores: o novo Slant Six de seis cilindros em linha e 225 pol³ (3,7 litros) com potência bruta de 145 cv, o V8 de 318 pol³ (5,2 litros, 230 cv com carburador de corpo duplo e 255 cv com o quádruplo), o de 361 pol³ (5,9 litros, 310 cv com dois carburadores de corpo quádruplo) e o de 383 pol³ (6,3 litros, dois quádruplos, 330 cv), este acrescentado em 1961, quando vinha a primeira reestilização. Um câmbio automático de três marchas com alavanca na coluna de direção era de série, com opção pelo Torqueflite comandado por botões. A estrutura monobloco, novidade no grupo, era anunciada como quatro vezes mais forte que a habitual carroceria sobre chassi.
Mais rápido que o GTS 383, só mesmo o Hurst Hemi Dart, com peças de fibra de vidro e o motor Hemi V8 de 425 cv: seu objetivo eram as provas de arrancada
O motor V8 de 413 pol³ (6,8 litros) com 350 ou 375 cv assumia o topo da linha em 1961. Para o ano seguinte o Dart já passava à segunda geração, com a plataforma B de carros médios da Chrysler e menores dimensões: 5,13 m de comprimento, 2,95 m entre eixos. Agora fabricado em Newark, Delaware, nos EUA (antes no Canadá), ele acrescentava à linha o hardtop de quatro portas e o conversível de duas. O estilo estava controverso, com ampla grade em nível mais alto que os dois faróis e uma curva peculiar nos para-lamas traseiros, que não tinham mais aletas.
Os motores de 3,7, 5,2 e 5,9 litros permaneciam, mas o novo topo de linha era o V8 Ramcharger 413 com 410 cv, um dos mais potentes da categoria, destinado a competições de arrancada (havia opções de 365 e 380 cv). A suspensão dianteira passava a usar barras de torção e o câmbio Torqueflite era opção a um manual de três marchas. Curiosamente, essa geração durou um só ano.
Bem menor e mais leve, o Dart 1963 sucedia ao Lancer e abandonava os motores V8, mas um deles voltava em um ano; a carroceria foi pouco modificada até 1966
O Dart 1963 já era outro carro, destinado a substituir o Lancer — a mudança de nome foi decidida de última hora. Com a plataforma A do grupo, a mesma do Valiant, tornava-se um compacto com 4,98 m de para-choque a para-choque e 2,82 m entre eixos (a perua dessa vez era menor, com 2,69 m) e perdia peso. O desenho mais “limpo”, típico da época, destacava os dois grandes faróis em relação à grade de perfil baixo e descartava os excessos do ano anterior. Não havia mais o hardtop de quatro portas. A produção estendia-se a fábricas em Illinois e Michigan, com montagem também na Califórnia e em Missouri.
Menor e mais leve, o Dart dispensava os grandes motores: havia apenas os Slant Six de 170 pol³ (2,8 litros, 101 cv) e 225 pol³ (145 cv), mas no ano seguinte aparecia um pequeno V8 de 273 pol³ (4,5 litros) com 180 cv junto a nova grade e vidro traseiro maior. A versão esportiva GT vinha apenas como hardtop de duas portas e conversível. Câmbios manuais de três e quatro marchas e o Torqueflite (oferecido só por dois anos) estavam no catálogo.
Na pesquisa da revista Popular Mechanics, proprietários destacaram no Dart o rodar confortável, a estabilidade e o desempenho, mas criticaram acabamento e consumo. “Bom comportamento dinâmico foi elogiado pelos donos: mais de 60% apontam-no como sua maior qualidade. Seus projetistas evitaram com sucesso aquele visual de ‘carro pequeno e barato’. O motor de 145 cv adiciona pouco peso sobre o de 101 e custa só mais US$ 47, uma bagatela”.

Na linha 1967 o desenho do Dart era o que seria lançado no Brasil, com vidro traseiro côncavo e linhas esportivas; o GTS do ano seguinte (foto maior) podia ter motores de até 300 cv
As coisas esquentavam em 1965 com o Dart Charger — primeiro uso do nome que se tornaria modelo independente um ano depois —, série do GT em cor amarela com o motor 273 retrabalhado: com carburador quádruplo, comando de válvulas “bravo” e taxa de compressão superior, fornecia 235 cv. No mesmo ano vinham freios dianteiros a disco e ar-condicionado de fábrica. No seguinte, a frente renovada lembrava a do Charger e o painel era redesenhado.
O Dart assumia para 1967 o estilo com que o teríamos no Brasil. Com desenho comum ao Valiant, estava mais atraente e esportivo com linhas retas e o peculiar vidro traseiro côncavo, que formava colunas mais inclinadas. Cupê, hardtop e sedã de duas portas, sedã de quatro portas e conversível — perua, não mais — compunham a linha, com comprimento e entre-eixos similares aos do anterior, só que mais largos e baixos.
Os motores iniciais eram o Slant Six 170 (agora com 115 cv), o 225 (145 cv) e o V8 273 (180 ou 235 cv), com as mesmas opções de câmbios de antes, mas a linha 1968 trazia o V8 318 com 230 cv e o potente V8 de 340 pol³ (5,6 litros) e 275 cv, restrito às versões GTS e Swinger. O GTS podia ter ainda o V8 383 com 300 cv. Mais rápido que ele, só mesmo o Hurst Hemi Dart, edição limitada de menos de 100 unidades com peças de carroceria de plástico e fibra de vidro, capô com tomada de ar, interior despojado e o motor Hemi V8 de 426 pol³ (7,0 litros) com 425 cv. Era vendido sem garantia, pois seu objetivo eram as provas de arrancada.
Frente e traseira eram remodeladas em 1970, quando os maiores motores e o conversível eram descartados: o Demon 340 (em branco e em vermelho) tornava-se a versão mais esportiva
O Dart GT 273 foi comparado pela Popular Science ao Ford Falcon 289 e ao Rambler Rebel SST 343: “A surpresa foi o Dart superar o Rebel no quarto de milha [aceleração de 0 a 402 metros] e nas retomadas de velocidade. Com a suspensão do GT ele firmou novos recordes em estabilidade, com completo equilíbrio e comportamento neutro. É um pacote fácil de dirigir com ótimo desempenho e direção rápida”. Na Car and Driver o 340 do GTS 1968 foi descrito como “facilmente o motor mais empolgante que a Chrysler produziu desde o Hemi”.
Um Dart GTS com o V8 de bloco grande, 440 pol³ (7,2 litros) e 375 cv assumia o topo de linha em 1969. Um novo Slant Six de 198 pol³ (3,2 litros) e 125 cv aparecia no ano seguinte, ao lado de alterações na frente e na traseira, mas os potentes V8 383 e 440 e o conversível eram cancelados para o modelo não competir com o novo Challenger. Para 1971 vinham outras lanternas traseiras (inseridas no para-choque no caso do sedã) e o esportivo Demon 340, equivalente ao Duster da linha Valiant, com o V8 de 275 cv do Swinger. Grade e instrumentos mudavam para o ano seguinte. O Dart 1973 recebia frente reestilizada e grandes para-choques que resistiam a impactos de baixa velocidade, como exigia a legislação.
O Demon era renomeado Sport, mantendo o motor 340 (com 240 cv, agora líquidos), e oferecia o pacote Convertriple com banco traseiro rebatível e teto solar de aço — o nome sugeria um carro de tripla utilidade, versátil como uma perua e aberto para o céu como os conversíveis. Toda a linha trazia evoluções na suspensão e ignição eletrônica. A versão de entrada SE (Special Edition) aparecia em 1974 com bancos individuais e câmbio automático de série, enquanto o Sport 360 vinha com o V8 de 360 pol³ (5,9 litros) e 245 cv para substituir o 340.
De 1974 em diante o Dart teve o desenho frontal que receberíamos em 1979; com motor 340 e depois 360, o Sport (à direita) manteve o estilo jovial até o último ano, 1976
A grade mudava no ano-modelo seguinte, quando parte do país recebia carros com catalisador para reduzir emissões e o Slant Six 225 tomava o lugar do 198 como motor básico, além de oferecer câmbio manual de quatro marchas para reduzir o consumo. A série Hang 10 vinha em branco e tinha teto solar, faixas decorativas e bancos em padrão alegre de olho no público jovem — surfistas em particular.
O último Dart norte-americano, o modelo 1976, ganhava freios dianteiros a disco de série — parece incrível, mas foram opcionais enquanto a legislação não os exigia — e a edição limitada Spirit of 76, referente ao bicentenário dos EUA, com faixas em azul e vermelho na carroceria em branco do Sport. Com motor 360, mantinha desempenho respeitável: teste da Car and Driver apontou 0-96 km/h em 7,3 segundos e quarto de milha em 15,7 s, logo atrás do Pontiac Trans Am (7,0 e 15,6 s) e do Chevrolet Corvette L82 (7,1 e 15,3 s) e à frente do Ford Mustang II Cobra (8,9 s 17,0 s). Naquele ano o Aspen assumia seu lugar — a carroceria dessa fase chegaria ao Brasil para 1979. O nome voltaria à linha Dodge em 2013 com um sedã compacto.
Além do Brasil, o Dart foi produzido na Espanha, na Argentina e na Colômbia. Os espanhóis da Barreiros Villaverde começaram a fabricá-lo em 1965 com modelo similar ao norte-americano, mas em 1971 lançavam novo desenho (o mesmo do argentino), que manteriam até 1977. O Barreiros Diesel, para uso como táxi, tinha motor de 2,0 litros a diesel e apenas 65 cv. O colombiano era da mesma geração do nosso. Nos anos 60 o modelo chegou à Austrália e à África do Sul como Dodge Phoenix e teve uma versão DeSoto Diplomat no país africano.
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