O desenho de Pininfarina mostrou-se longevo nesse hatch bem-sucedido, cuja família incluiu sedã, perua e conversível
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Todo fabricante tem suas melhores fases em termos de desenho, quando traz ao mercado carros de estilo atraente, com clara identidade e que permanecem agradáveis com o passar do tempo. A Peugeot certamente viveu um desses períodos entre o fim dos anos 80 e o encerrar do século, quando apresentou modelos como o 405, o 306, o 406 e o 206.
Sucessor do 309, o 306 foi apresentado em março de 1993 com cinco portas, seguido da versão de três no segundo semestre, para competir entre os hatches médios como Ford Escort, Opel Astra, Renault 19 e Volkswagen Golf. Suas formas simples e elegantes, elaboradas pelo estúdio italiano Pininfarina — famoso por seus desenhos para a Ferrari e contratado por longo tempo pela marca francesa, desde o 403 de 1955 —, traziam elementos atuais como a frente sem grade, com admissão de ar por tomadas no para-choque, para-lamas abaulados e sem molduras nos arcos das caixas de rodas, grande área envidraçada e um mínimo de adornos.
A distância entre eixos de 2,58 metros era das maiores para um carro da classe dos quatro metros (exatos 4,03 m) e, com 1,38 m de altura, ele antecedeu a fase de carrocerias elevadas. A plataforma do 306 era a mesma do Citroën ZX de 1991, dentro do programa de compartilhamento iniciado nos anos 70, quando a Peugeot absorveu a marca do duplo chevron. Com motor transversal e tração dianteira, ele usava o conceito de suspensão traseira típico dos carros franceses da época: rodas independentes, braço arrastado, barras de torção. Esse eixo trazia buchas que se deformavam em curvas a fim de causar ligeiro esterçamento das rodas traseiras para “dentro”, aumentando o limite de aderência.
Derivado da plataforma do Citroën ZX, o 306 estreava em 1993 com três e cinco portas
Para concorrer em variados patamares da categoria, o 306 oferecia uma ampla linha de motores. Versões mais modestas usavam os de 1,1 litro (potência de 60 cv, torque de 9 m.kgf), 1,4 litro (75 cv e 11,3 m.kgf) e 1,6 litro (88 cv e 13,7 m.kgf), mas havia também o 1,8 (101 cv e 15,6 m.kgf) e duas unidades de 2,0 litros: com duas válvulas por cilindro, 121 cv e 17,9 m.kgf e com quatro válvulas, coletor de admissão de geometria variável, 152 cv e 18,6 m.kgf. O mais potente vinha na versão S16 (GTI em alguns mercados, como a Bélgica), capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em 9,2 segundos e atingir velocidade máxima de 215 km/h, mas criticado pela falta de potência em baixas rotações.
O GTI-6 vinha em 1996 com mais potência e torque (163 cv e 19,7 m.kgf) e câmbio de seis marchas; era capaz de 0-100 km/h em 8,8 segundos
O esportivo era dotado de rodas de 15 polegadas e freios a disco também na traseira, itens também aplicados ao XSI com o motor 2,0 de duas válvulas. Não poderiam faltar as opções a diesel, nas quais a Peugeot era especialista de longa data: 1,8 aspirado (60 cv e 11,2 m.kgf), 1,9 aspirado (68 cv e 12,2 m.kgf) e 1,9 com turbocompressor e resfriador de ar (92 cv e 20 m.kgf). Toda a linha usava câmbio manual de cinco marchas, com opção pelo automático de quatro marchas no 1,8.
A revista inglesa Car comparou o 306 XSi ao BMW 316i Compact e ao VW Golf GTI: “O Peugeot tem o comportamento dinâmico mais preciso dos três, com uma fluidez maravilhosa ao fazer curvas. A suspensão é firme e muito bem controlada. O interior é espaçoso e confortável, exceto pela falta de apoio lombar, e o motor responde bem. Ele é o único carro aqui que deveria usar um logotipo GTI. Se você quer um hatch tão eficiente em espaço quanto em dinâmica, não compre um Compact: o Golf, medalha de prata, e o 306, de ouro, são carros melhores”.
O esportivo S16 chegava com 152 cv no motor de 2,0 litros; o conversível era feito pela Pininfarina
A francesa Le Moniteur Automobile avaliou o S16: “É o novo ponto de referência em comportamento em rodovia. Melhor de ‘chão’ que o XSi, já extremamente eficaz, o S16 recebe uma calibração de suspensão mais esportiva. Ao contrário do afiado 309, ele é fácil de dominar e mais convencional que seu ‘primo’ ZX”. Contudo, o motor decepcionou: “É um desastre, francamente: não proporciona nenhuma sensação”.
A família começava a crescer em abril de 1994 com o conversível, desenhado e fabricado pela Pininfarina. Com capota de tecido que podia ter acionamento manual ou eletro-hidráulico, oferecia apenas os motores de 1,6 a 2,0 litros. Em outubro seguinte aparecia o sedã de três volumes, com linhas menos inspiradas, nem tão compensadas assim pelo espaço para bagagem — apenas 368 litros.
Uma evolução do S16 vinha em 1996: o GTI-6, com mais potência e torque (163 cv e 19,7 m.kgf), câmbio de seis marchas e alterações na suspensão, capaz de 0-100 km/h em 8,8 segundos e máxima de 220 km/h. Um refresco visual aparecia em maio de 1997, com novos faróis com luzes de direção integradas, grade e para-choque que lembravam as formas mais arredondadas do sedã 406. O interior recebia materiais superiores e novos comandos. Outra novidade era a perua 306 Break, que oferecia mais espaço para bagagem ao custo de certo prejuízo à harmonia de linhas.
Câmbio de seis marchas, 163 cv, de 0 a 100 em 8,8 segundos: o GTI-6 substituía o S16
O sedã não se destacava pelo porta-malas; a perua vinha em 1997 com estilo controverso
Diversas edições especiais foram oferecidas, como Alpine, D-Turbo S, Games, Le Mans, Mardi Gras, Meridian e Miami para o hatch; Cashmere, Eden Park, Equinoxe e Symbio para o sedã; Platinum, Suisse e St. Tropez para o conversível; e Roland Garros para toda a linha. A série de 500 unidades Rallye, restrita ao Reino Unido, era um GTI-6 bastante despojado — sem ar-condicionado, controle elétrico de vidros e retrovisores, toca-CDs ou faróis de neblina — e por isso mais leve e ainda mais rápido para acelerar.
“O Rallye parece pouco diferente de outros 306 e sua cabine é monótona, mas nenhum outro hatch desde o 205 GTI envolveu tanto o motorista. O motor empurra viciosamente desde 3.000 rpm até o limite de 7.200 e, com seis marchas, ele nunca cai da zona de zoom. O comportamento não lhe dá tanta confiança: tem certo nervosismo que afeta sua disposição a levá-lo ao limite de aderência. Ele pode — e vai — sair apressado com a traseira, mas tal ocorrência é rara, a menos que se esteja em um circuito ou abusando na chuva”, avaliou a Car.
Novas mudanças vinham no modelo 2000, com faróis de superfície complexa, outras lanternas traseiras e para-choques inteiros na cor da carroceria, além de maior equipamento de série — freios ABS e limpador de para-brisa automático estavam em quase todas as versões. Bolsas infláveis laterais haviam sido aplicadas no ano anterior. O pacote visual do GTI-6 era estendido às versões XSi, XT e D-Turbo. Sob o capô as novidades eram versões de quatro válvulas por cilindro para o 1,6 (109 cv e 15 m.kgf) e o 1,8-litro (110 cv e 15,8 m.kgf), enquanto o 2,0 de mesma configuração oferecia uma opção mais “mansa” que o GTI-6, com 132 cv e 18,3 m.kgf. Para os adeptos do diesel havia o moderno motor HDI de 2,0 litros com injeção eletrônica de duto único, 90 cv e 20,9 m.kgf.
Roland Garros, uma das várias edições; alguns 306 tinham caixa automática e apliques de madeira
O 306 Maxi brilhou em ralis; o conceito HDI Break de Chasse sugeria uma perua esportiva
Mesmo com idade avançada, o GTI-6 era eleito melhor “hot hatch” pela inglesa What Car?, que justificava: “Um motor que gosta de girar e uma caixa de seis marchas com relações próximas mantêm o GTI-6 constantemente em ebulição. A suspensão é dura e a direção deixa o motorista bem informado o bastante para pegar as escapadas de traseira, pelas quais o 306 é conhecido e amado pelos motoristas hábeis. E este ano ele representa um custo-benefício ainda melhor que antes”.
Esse foi mais um Peugeot bem sucedido em ralis: a versão Maxi foi campeã francesa na modalidade em 1996 e 1997. Ela estreou em 1995 com motor de 2,0 litros, 16 válvulas e 280 cv, câmbio sequencial de sete marchas e peso de apenas 960 kg; dois anos mais tarde o Maxi Evo 2 vinha com nada menos que 308 cv a 11.000 rpm. Uma versão conceitual do 306, a HDI Break de Chasse (perua de caça em francês, o mesmo que o inglês shooting brake), era revelada em 1999 com um desenho esportivo de perua com três portas, interior em tons de azul e marrom e motor turbodiesel.
O mercado brasileiro recebeu o modelo em 1994 em versões de três portas e 1,6 litro, cinco portas e 2,0 litros e conversível. O S16 vinha no ano seguinte e, em 1996, a opção de 1,8 litro. Ele passava a vir da Argentina um ano depois, trazendo-nos o sedã, enquanto a perua começava a chegar da Europa. Nessa fase foram usados o motor 1,8 de quatro válvulas e o 2,0 de 167 cv com caixa de seis marchas. O hatch tinha seu último ano em 2001, quando o 307 estreava com proposta diferente — bem mais alto, buscando interessados em minivans, e por isso menos esportivo. Sedã, perua e conversível ficaram mais um ano no mercado. Toda a linha somada, o 306 vendeu muito bem: chegou perto de três milhões de unidades mundo afora, produzidas na França, Inglaterra, Argentina, no Chile e no Uruguai.
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