O Santana chegava ao Brasil como resposta ao crescimento do segmento de luxo; na última foto, junto ao Gol GT e diante dos modelos Voyage, Passat, Kombi, Fusca e Parati
Investir em um carro mais luxuoso era justificado pelo perfil do mercado naquele período de longa crise para a economia brasileira: de 1980 a 1983, a participação do chamado segmento C havia crescido de 1,6% para 7,9%. A continuidade desse processo levaria o Monza a ser o carro nacional mais vendido por três anos entre 1984 e 1986. O projeto da versão brasileira do Santana, denominado BEA 112 e iniciado em 1977, custou 50 milhões de dólares. Ele incluía a inédita opção de duas portas, para atender à incompreensível preferência nacional da época.
Outras diferenças eram o tanque de combustível ampliado de 60 para 75 litros, em função da menor autonomia do álcool, predominante na época; a taxa de compressão do motor (mais alta com álcool e mais baixa que a do europeu com gasolina, pela menor octanagem da nossa) e os faróis sempre na posição tradicional, sem unidades auxiliares junto à grade. A versão de topo recebia aqui uma moldura estriada sob as lanternas traseiras, de gosto discutível, e o revestimento do teto não era pré-moldado.
Havia três versões de acabamento, em ordem ascendente: CS (Comfort Silver), CG (Comfort Golden) e CD (Comfort Diamond), todas disponíveis com duas e quatro portas. A CD vinha com rodas de alumínio, lavadores de farol e oferecia opções de direção assistida, transmissão automática — de três marchas apenas e sem controle eletrônico, que o Del Rey já possuía —, ar-condicionado e rádio/toca-fitas digital Bosch Rio de Janeiro, que seria muito visado pelos ladrões por não apresentar proteção contra furto.
O desenho era o mesmo do alemão, mas a Volkswagen desenvolveu no Brasil a versão de duas portas, que atendia a uma estranha preferência nacional na época
O interior do Santana era amplo, bem-acabado e confortável, em especial o CD. O banco traseiro vinha com cintos de três pontos — primazia no Brasil — e encostos de cabeça para dois ocupantes, além de apoio de braço central. Havia ajuste de altura do banco do motorista e controle elétrico dos vidros, tampa do porta-malas, bocal do tanque e antena. A trava central das portas, eletropneumática de início, passava a ser elétrica anos depois.
O desempenho era adequado, com aceleração de 0 a 100 km/h em 11,9 segundos, mas havia um problema: o nível de aspereza do motor em alta rotação
No quadro de instrumentos, leds de longa durabilidade substituíam as tradicionais lâmpadas-piloto e havia uma luz indicativa para mudança ascendente de marcha, conjugada com um indicador de consumo instantâneo em quinta. Só que a luz atuava sempre no mesmo padrão, sem distinguir uma condução com mais entusiasmo de outra visando a economia.
Motor “amansado” do GT
Todo Santana trazia o mesmo motor, um novo 1,8-litro com carburador de corpo duplo, que produzia potência de 85 cv e torque de 14,6 m.kgf (versão a gasolina) ou 92 cv e 14,9 m.kgf (a álcool). Ele aparecera na linha Volkswagen no mês anterior no Gol GT, mas foi “amansado” para obter potência e torque em regimes mais baixos. Novidade na marca era a caixa de transmissão manual de cinco marchas, com a última bem longa (sobremarcha) para reduzir consumo e ruído no uso rodoviário. Nas versões CS e CG a caixa de série era de quatro marchas, que compartilhava as relações de primeira à quarta marcha com a de cinco.
Motor de 1,8 litro e buchas com deformação programada eram inéditos na marca; o interior do CD vinha bem-equipado e havia cintos de três pontos também atrás
O desempenho era adequado, com aceleração de 0 a 100 km/h em 11,9 segundos e velocidade máxima de 171 km/h na versão a álcool, mas havia um problema: o nível de aspereza do motor em alta rotação, que destoava de sua imagem refinada. O problema estava nas bielas mais curtas que no projeto original alemão (136 mm em vez de 144 mm), que resultavam em relação r/l desfavorável. Novidade da suspensão traseira eram buchas silenciosas “inteligentes”, com deformação calculada de maneira a evitar divergência da roda externa nas curvas e assim favorecer a estabilidade.
O Santana CD causou boa impressão à revista Motor 3: “É muito bonito, classudo mesmo, por dentro e por fora. É um carro para quatro pessoas em grande conforto. O nível de ruído é compatível com a classe do carro (quase imperceptível); a suspensão é macia mas muito controlada; o conforto é extraordinário; o acabamento, ótimo. Na subida, porém, deixa um pouco a desejar. O Santana não é um Ford Landau, mas parece ser a melhor e mais adequada opção de substituição”.
A Quatro Rodas comparou-o ao Monza SL/E 1,8, ao Diplomata 2,5 e ao Del Rey 1,6: “Pelo que demonstrou nesse teste, o Santana deve se colocar num bom patamar de vendas. Foi o mais econômico dos quatro e oferece a melhor relação entre desempenho e consumo. Monza e Santana são os mais estáveis. Os ocupantes dos bancos da frente levam vantagem no espaço e no banco que segura melhor o corpo”.
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Os conceitos
Pelo menos três versões conceituais do Passat de segunda geração e do Santana foram apresentadas pela Volkswagen. A primeira foi logo em 1980 na Europa: o IRVW II (Integrated Research VW ou pesquisa integrada VW), estudo sobre o modelo de cinco portas com itens de segurança e medidas para maior eficiência.
Entre elas estavam roda-livre, que desacoplava a embreagem assim que o motorista deixasse de acelerar; indicador no painel para troca de marcha e frente mais aerodinâmica, que ajudava a reduzir o Cx de 0,38 para 0,33. O motor de 1,3 litro a gasolina tinha altíssima taxa de compressão (13:1), mas com sensor de detonação. Ele fazia notáveis 18,8 km/l a 90 km/h. Para-choques e lanternas traseiras sugeriam as formas que o Passat adotaria em 1985. Outros dois estudos levaram a designação IRVW: o primeiro sobre o Golf a diesel, o terceiro sobre o Jetta.
Dois conceitos do Santana foram desenvolvidos no Brasil. O primeiro era o Tecno II no Salão de São Paulo de 1984. Um sedã duas-portas recebeu alta tecnologia em termos brasileiros, a começar pelo motor 1,8 do Golf GTI alemão, com 16 válvulas, injeção eletrônica e potência de 139 cv. Usava tração integral permanente, suspensão traseira independente e freios a disco nas quatro rodas com sistema antitravamento (ABS).
Frente e traseira eram mais “lisas” e futuristas, com faróis e lanternas cobertos por lentes escuras. O interior, revestido em couro vermelho, trazia ajuste elétrico dos bancos dianteiros, painel digital com computador de bordo, indicador de período de troca de óleo e controlador de velocidade. Um sistema de verificação e controle emitia alertas por voz em caso de anormalidades. No console central havia computador, televisor e uma calculadora HP para uso dos passageiros de trás.
No Salão de 1992 foi mostrado um Santana Executivo (versão já extinta à época) alongado em 108 mm e com equipamentos dignos de um escritório móvel: computador, telefone, fax, copiadora, televisor, videocassete e minibar, tudo num interior sofisticado e revestido em couro claro. A maior distância entre eixos, que foi adotada pelo modelo chinês (leia quadro na página 4), teria sido oportuna se aplicada à produção brasileira.